Cresce o número de decisões que aplicam bagatela
30 de agosto de 2011, 12h01
Mesmo sem previsão legal, o princípio da insignificância vem se tornando instrumento importante na consolidação da aplicação do direito penal no Supremo Tribunal Federal. Enquanto em 2004 o único pedido de insignificância pelo réu foi negado pela corte, em 2009 o número de solicitações saltou para 38 e o de concessões ficou em 22.
O maior crescimento do número de pedidos se deu a partir de 2008. O número pulou de 6, em 2007, para 24, no ano seguinte — dos quais 8 foram rejeitados e 16 reconhecidos. Os dados mostram que, à medida que houve aumento na quantidade de casos de insignificância que chegaram ao Supremo, também ocorreu aumento na quantidade de pedidos aceitos pelos ministros.As informações são de levantamento feito por pesquisadores do Departamento de Direito Penal da Faculdade de Direito da USP. O estudo foi divulgado nesta terça-feira (30/8). A pesquisa analisou todos os pedidos de insignificância feitos de 1º de janeiro de 2005 e 31 de dezembro de 2009, sempre de acordo com os acórdãos publicados na íntegra no site do STF. O objetivo do trabalho é mostrar como novas interpretações para crimes contra o patrimônio e contra a administração pública pavimentaram mudanças no entendimento do STF para crimes penais de pouco valor.
Os autores apontam a Lei 11.033/04, que alterou o artigo 20 da Lei 10.522/02, a Lei de Execuções Fiscais. Desde dezembro de 2004, está determinado que o Fisco ignore atos de execução fiscal inferiores a R$ 10 mil. Assim, o STF passou a entender que certas faixas de valor não precisam ser levadas a julgamento, muito menos à prisão ou execução penal.
Exemplo disso é que, em 2007, 54,5% dos pedidos de insignificância foram concedidos no mérito. Já em 2009, um terço dos pedidos foi concedido em liminar e no mérito, o que mostra um reconhecimento do princípio já no curso do julgamento pelo Supremo.
Como explica o professor de direito penal da USP, Pierpaolo Bottini, coordenador do estudo, o relatório aponta para o entendimento do Judiciário de que às vezes o direito penal é desproporcional e sua aplicação exagerada. “Se você começa a identificar que sonegação de menos de R$ 10 mil é insignificante, começa a ficar estranho punir alguém que rouba um xampu”, afirma.
Isso porque, nos crimes patrimoniais comuns, ao que mais é aplicado o princípio da insignificância, é o de dinheiro que responde por um quarto dos casos. Em segundo lugar vêm os casos de objetos eletrônicos (18%) e roupas (18%). (Clique aqui para ver o ranking completo)
Habeas Corpus
Bottini também ressalta a importância do Habeas Corpus no princípio da insignificância. Dos 75 casos de insignificância apurados nos cinco anos abarcados pela pesquisa, 65 foram feitos por meio de HC, dos quais 43 foram aceitos. Os outros dez ficaram distribuídos entre Agravo Regimental, Recurso Extraordinário e Recurso em Habeas C
Para o professor, isso só reforça a importância do HC para levar o princípio da insignificância ao Supremo. “A ideia é mostrar como o Habeas Corpus corrige algumas injustiças não só em relação a quem está preso”, diz o professor, citando críticas a este recurso, que só seria aplicável a pessoas presas. O caso paradigmático citado na apresentação do trabalho, aliás, é um HC, de relatoria do ministro Celso de Mello (Habeas Corpus 84.412, DJ. 19.11.2004).
Política criminal
Outro objetivo do estudo, talvez o principal, seja o de mostrar uma possibilidade de desenvolvimento da política criminal brasileira. “É limitar o direito penal ao que é indispensável; tirar da prisão pessoas que não são socialmente perigosas e reservar [a prisão] para situações inevitáveis. Na verdade, é o direito penal que está descrito na Constituição Federal”, explica Pierpaolo Bottini.
Como protagonista desse movimento, o professor da USP aponta a atuação da Defensoria Pública, que tem sido a grande responsável por levar tantos pedidos de insignificância ao Supremo e evitar que tantas pessoas sejam presas sem necessidade. Outro destaque do relatório, segundo o coordenador do estudo, é mostrar como é preciso regulamentar melhor crimes patrimoniais comuns, como furto ou roubo comum. “Seria uma questão de rever a legislação mesmo”, diz Bottini.
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