Guarda compartilhada

"Poder familiar não é alterado com o fim do casamento"

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19 de agosto de 2011, 10h27

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Guarda compartilhada. Esse foi  o tema abordado pelo desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, Francisco Eduardo Loureiro,  convidado do IV Congresso Paulista do Direito de Família, que acontece até o dia 20 de agosto, em São Paulo e é organizado pela IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família). O evento reuniu uma centena de advogados da área de família.

Para o desembargador Loureiro, a inserção dos artigos 1.583 e 1.584 do Código Civil, mudou os aspectos da questão da guarda no país. O advogado e diretor da IBDFAM-SP, Marcelo Truzzi, explica: No Código anterior, havia uma definição muito clara para a questão relativa à responsabilidade pelos filhos.  A guarda era unilateral. Cabia a um dos genitores a guarda e ao outro, era permitido o direito de visita. Segundo o palestrante, a inserção dos artigos gera confusão entre guarda compartilhada e alternada. 

O artigo 1.583 mudou o sistema de monista para dualista, com a responsabilidade pelo filho sendo dividida por pai e mãe ou excepcionalmente por terceiros. Com o artigo, as duas modalidades de guarda (compartilhada ou alternada), tornaram-se possíveis, tanto a unilateral, quanto a conjunta.

Dentro do regime monista, um tem a guarda e cabe ao outro a fiscalização. Acontece que, segundo o desembargador, muitas vezes, entende-se equivocadamente  por fiscalização a tentativa de administrar para onde vai o dinheiro destinado ao filho, no sentido de checar se este está sendo realmente endereçado ao bem estar dele e não em benefício da parte recebedora.

No entanto, a mãe ou pai deve prestar contas ao filho, e não ao ex-cônjuge, quanto ao destino do dinheiro. Ou seja, só o filho tem o direito de questionar esse quesito.

Loureiro também comentou que muitas vezes esse tipo de fiscalização é utilizada pelo pai como meio escuso para futura ação revisional, dando brecha para que o valor seja reduzido em juízo. A alegação é a de que o benefício está sendo empregado erroneamente.

Poder familiar
O palestrante frisa que o poder familiar não é alterado com o fim do casamento. Implica-se a este a necessidade de alimentar, educar e criar o filho, o que, independe dos pais estarem ou não casados. Loureiro ainda sublinha que se tivéssemos a exata noção desse poder, o dispositivo não precisaria ter sofrido alterações.

Ele que essa mudança se deu no intuito de reavivar a memória das funções paternas e derivou-se de uma cópia do direito italiano. Um dos artigos do Direito italiano tinha redação peculiar a esse respeito. O divórcio influenciava no poder familiar. Logo, quem tinha a guarda tinha mais poder. Observando esse equívoco, o artigo foi mudado e trouxe utilidade social — afirmando que o final do casamento não influencia nos deveres dos pais. Essa é a síntese da guarda compartilhada: obrigações igualitárias perante o filho.

Já a guarda alternada é temporal. Isto é, está relacionada a divisão de tempo (uma semana com cada), enquanto a compartilhada diz respeito a divisão de deveres ( comparecer a reunião da escola, levar no judô, ballet, etc…).

Critério prioritário
Consta do artigo 1.584 que se não houver acordo, será aplicada a guarda compartilhada. Este é o critério prioritário. Mas o juiz precisa levar em consideração o interesse da criança.

O desembargador salienta a necessidade do juiz averiguar caso a caso para checar se atende às peculiaridades. Lembra, ainda, que o direito civil do século 19 era estrutural, perfeito, mas injusto. Já o contemporâneo é mais inseguro e funcional. Leva em consideração os detalhes, as especificidades.

Essa funcionalidade se aplica quando o juiz constata que algum dos pais sofre de distúrbio de comportamento ou transtorno de personalidade, agressividade ou egoísmo exacerbado, o que geraria problemas nas decisões corriqueiras.

Há também os casos onde o pai ou mãe, não demonstram a menor vocação para desempenhar tal função. Em tese, o juiz pode obrigá-lo a acompanhar o filho, mas não é a conduta mais acertada, na visão do palestrante.

Consta do parágrafo 4º do artigo 1.584 que se o pai não cumprir o que prometeu está sujeito a sanções. Como sancionar esse descumprimento? O juiz pode reduzir o tempo de convivência, como pressuposto para corrigir o comportamento do pai. Mas, segundo o desembargador, alguns pais até torcem. Nessa hipótese, a melhor solução é a sanção pecuniária, tendo em vista o caráter fático e tormentoso da matéria.

Loureiro citou o caso de um menino, que treinava jiu-jitsu e se envolveu numa briga durante a balada. Errou o soco e acabou acertando o nariz de uma menina. Ela teve que fazer plástica e entrou com ação contra os pais para ressarcimento e danos morais.

O pai do menino alegou que era divorciado e o menino vivia com a mãe, portanto, esta deveria se responsabilizar pelo prejuízo. O desembargador entendeu, partindo do princípio da guarda compartilhada, que o pai também deveria pagar, sobretudo porque pagava a academia de jiu-jitsu do filho.

O palestrante citou decisão 1074037 da jurisprudência do STJ, a qual afirma o seguinte entendimento: mera separação não isenta o cônjuge das atividades de poder familiar exercidas conjuntamente.

Guarda compartilhada
A guarda compartilhada não se limita aos pais e pode ser concedida aos avós materno ou paterno. Quanto aos reflexos, na questão alimentar, depende se vem atrelada a guarda alternada, mas geralmente uma das partes contribui pecuniariamente.

Guarda nas uniões homoafetivas, no entendimento do desembargador, funciona como nos casos de relação heterosexual. Loureiro afirma tratar-se de uma nova entidade familiar.

O que acontece com a guarda compartilhada quando uma das partes vive no exterior e quer levar o filho? Nesses casos, deve-se levar em conta o bem estar da criança. Caso a recusa da viagem implique na perda do emprego da mãe, o que seguramente traria prejuízos ao filho, deve-se permitir que ele vá. Agora, se a viagem não tiver um bom motivo de fundo, não há como obter autorização legal.

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