Relação socioafetiva

TJ gaúcho nega investigação de paternidade

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2 de agosto de 2011, 12h57

O estado de filho não pode ser desprezado de uma hora para outra em nome de uma verdade cromossômica, que se situa num patamar bastante inferior. O entendimento é da 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao negar pedido de investigação de paternidade a um homem que viveu há quase 60 anos com o sobrenome do pai registral. Na primeira instância, a ação investigatória contra o espólio do suposto pai biológico foi indeferida. A decisão é do dia 12 de maio e cabe recurso.

O autor da ação teve conhecimento do nome do pai biológico aos 30 anos de idade, informado pela mãe, mas nunca tentou esclarecer os fatos ou formalizar este vínculo. Aos 59 anos, depois de saber de sua morte, ele ingressou com uma ação de investigação de paternidade contra o espólio, também buscando a retificação de registro civil. A Justiça indeferiu o pedido. Ele apelou ao Tribunal de Justiça.

Em suas razões recursais, o autor sustentou que a decisão de improcedência se baseou unicamente na alegada relação socioafetiva havida com o pai registral. Garantiu, no entanto, não ter havido esta relação, pois ambos conviveram pelo período de apenas nove anos. Além disso, afirmou que não pode ser ignorado o exame de DNA conclusivo em relação ao falecido.

O relator da apelação, desembargador Luiz Felipe Brasil Santos, iniciou seu voto, pontuando que esta investigatória era dotada de um aspecto ‘singular’, pois a ação somente foi promovida após a morte do pai de registro e do biológico.

‘‘Assinale-se não haver nos autos informação acerca da existência de patrimônio tanto de um como de outro, mas chama a atenção essa circunstância, pois, ao menos teoricamente, o reconhecimento da paternidade na forma pretendida daria ensejo ao autor, já tendo participado como herdeiro na primeira herança, vir a recolher uma segunda’’, observou o relator.

Para embasar sua decisão sobre a improcedência da demanda investigatória, o relator citou um julgado do desembargador Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, da 7ª Câmara Cível do TJ-RS, colacionado pelo juízo de origem. A ementa diz: ‘‘O apelante pretende ver desconstituído um estado de filiação sobejamente consolidado ao longo de mais de 45 anos! Não se trata de restabelecer a verdade registral, fazendo adequar-se o registro aos dados cromossômicos, pois não menos verdadeira é a correspondência que há com a verdade sociológica, consolidada na posse de estado de filho.’’

De acordo com o relator, não importa verificar por quanto tempo de sua vida o autor conviveu efetivamente com seu pai registral, nem o grau de afeto entre eles. ‘‘O que se visa preservar, no caso, não é o vínculo meramente afetivo (circunstância absolutamente aleatória, porque subjetiva), mas a posse de estado de filho, dado sociológico da maior relevância, que não pode, de uma hora para outra, após toda uma vida desfrutando de determinado status familiar, ser desprezado, em nome de uma verdade cromossômica que, na escala axiológica, seguramente se situa em patamar bastante inferior.’’

Com isso, o relator confirmou a sentença e negou provimento à apelação. O voto foi seguido, por unanimidade, pelos desembargadores Alzir Felippe Schmitz e Ricardo Moreira Lins Pastl.

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