Controle de contas

Decisão de tribunal de contas sem MP é contestada

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25 de abril de 2011, 17h29

O Tribunal de Justiça da Bahia pode, no julgamento de um recurso, abrir o caminho para sepultar centenas de decisões de tribunais de contas de São Paulo, do Amapá e da Bahia. No final de março, a desembargadora Daisy Lago Ribeiro Coelho suspendeu os efeitos de um parecer que reprovava as contas da ex-prefeita de um município baiano. Um dos fundamentos: o Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia não têm procurador de contas, o que pode colocar sob suspeita a legitimidade de seus pareceres e decisões.

Se no julgamento do mérito do recurso a tese da prefeita vingar, decisões de outros três tribunais de contas devem ser colocadas em xeque com o mesmo argumento. Os tribunais de contas dos estados de São Paulo, do Amapá, e o Tribunal de Contas do Município de São Paulo também não contam com procuradores em seus quadros.

A liminar da desembargadora baiana colocou sob alerta a Associação Nacional do Ministério Público de Contas (Ampcom), que batalha há alguns anos para que estes tribunais façam os concursos necessários para o cargo de procurador. De acordo com a presidente da entidade, Evelyn Pareja, até 2007 os tribunais contavam com membros “emprestados” do Ministério Público estadual.

Em agosto de 2007, uma resolução do Conselho Nacional do Ministério Público proibiu esse empréstimo e criou a obrigação de os tribunais de contas estabelecerem, em até 18 meses, regras para instituir a carreira interna nas instituições, por meio de concursos. Segundo Evelyn, alguns se adequaram. Outros, não.

“Os tribunais de contas dos estados do Espírito Santo, de Alagoas e da Bahia, por exemplo, tomaram a iniciativa de enviar projetos de lei para o Executivo após a resolução”, conta a presidente da associação. Os projetos andaram. No TCE baiano, por exemplo, os novos procuradores de contas tomaram posse em fevereiro deste ano. Em Alagoas, houve posse dos novos membros há um mês.

A decisão do Tribunal de Justiça da Bahia pode se tornar o que se chama de leading case no jargão jurídico. O julgamento que fixa uma tese que, depois, é usada em discussões com o mesmo teor. É exatamente isso que fez a Ampcom colocar as barbas de molho.

Falta de legitimidade
A prefeita Maria Angélica Juvenal Maia, que comanda a cidade de Candeias, na região metropolitana de Salvador, foi à Justiça contra o parecer do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) da Bahia, que rejeitou as contas da prefeitura referentes ao ano de 2008. Em primeira instância, seu pedido de suspensão do parecer do tribunal de contas baiano foi negado.

Em segunda instância, o argumento do recurso foi acolhido liminarmente pela desembargadora Daisy Coelho. De acordo com a prefeita, o Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia ainda não adequou o seu funcionamento aos preceitos constitucionais estabelecidos em relação à sua composição e funcionamento, já que não existem membros do Ministério Público de Contas em atuação no tribunal.

A defesa da prefeita também ressaltou que as decisões tomadas por aquele tribunal apresentam vício de nulidade, “eis que ausente requisito constitucional indispensável para a necessária validação de seus atos”. No caso, não houve a atuação e os pareceres de integrantes do Ministério Público em todas as fases do processo.

A desembargadora considerou que o fato serve de “fundamento suficiente para cassar a decisão proferida, na medida em que é possível existir comprometimento da licitude do processo e até mesmo da sentença”. E lembrou que se o TJ baiano entender que há vícios no trâmite da ação, os efeitos da decisão atingirão todo o processo administrativo.

Na decisão, a desembargadora não se estende sobre o mérito da questão. Ou seja, não dá indícios se considera ou não a atuação do MP indispensável nos tribunais de contas. Apenas analisa a possibilidade de se causar dano irreparável à prefeita se for aplicado o parecer do Tribunal de Contas com a discussão ainda em aberto.

Correção da omissão
Mesmo os tribunais de contas que tomaram a iniciativa de preencher seus quadros com procuradores de carreira não estão livres de ter suas decisões contestadas. Isso porque muitas contas de órgãos públicos foram analisadas sem a presença do procurador, mesmo que agora exista sua atuação no tribunal.

O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, por exemplo, está fazendo concurso para corrigir a falha em sua composição. Mas, até agora, os cargos estavam vagos. O TCM da Bahia também está enfrentando a questão ao criar uma comissão para instituir o concurso permitido por lei sancionada recentemente.

A presidente da Ampcom acredita que os novos procuradores de contas poderão analisar e ratificar as decisões dos tribunais e, assim, conferir legitimidade a elas, mesmo que não tivessem atuado ao tempo certo. Uma verdadeira corrida atrás do tempo perdido.

Evelyn Pareja afirma que a associação tem alertado para o problema para não permitir que maus gestores fiquem impunes graças à omissão de alguns tribunais de contas em cumprir a Constituição, que criou a carreira de procurador de contas.

Dois tribunais preocupam mais a associação. O Tribunal de Contas do Município de São Paulo, que até agora não enviou qualquer projeto de lei ao Executivo paulistano, e o do estado do Amapá, cuja legalidade do concurso está sendo discutida na Justiça desde 2008. Para Evelyn, não há outra saída senão a criação dos cargos. “A Constituição Federal determina que junto aos tribunais de contas, tem de funcionar o Ministério Público de contas. É necessário corrigir distorções para evitar a perda de um trabalho minucioso destes tribunais e a consequente impunidade em muitos casos”.

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