Consulta pública

Novo CPC precisa de mais debates, dizem entidades

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9 de abril de 2011, 8h08

O debate em torno da reforma do Código de Processo Civil volta à pauta do dia com a consulta pública promovida pelo Ministério da Justiça, nesta terça-feira (12/4). O objetivo da reforma é dar celeridade ao andamento dos processos na Justiça sem prejuízos dos direitos. A nova consulta foi aberta depois que entidaddes da advocacia reivindicaram um debate mais amplo e uma tramitação menos célere no Congresso Nacional.

Em outubro de 2009, o presidente do Senado, José Sarney criou uma comissão de juristas para elaborar o anteprojeto de lei de um novo Código de Processo Civil. A comissão foi presidida pelo ministro Luiz Fux, na época, do Superior Tribunal de Justiça. Outros 11 nomes de peso foram chamados para compor o grupo. A relatoria da proposta ficou por conta da professora Teresa Arruda Alvim Wambier. Audiências públicas em várias capitais brasileiras foram feitas com a finalidade de recolher subsídios para as mudanças.

Menos de um ano depois, o trabalho da comissão resultou no anteprojeto de número PLS 166/10. Com o anteprojeto em mãos, José Sarney instaurou a Comissão de Reforma do Código de Processo Civil presidida pelo senador Demóstenes Torres (DEM-GO), com Antonio Carlos Valadares (PSB-SE) na vice-presidência e Valter Pereira (PMDB-MS) na relatoria. No final de 2010, o plenário do Senado aprovou o novo código. Ele, agora, tramita na Câmara dos Deputados.

Para o advogado e professor da USP Antonio Carlos Marcato, do escritório Marcato Advogados, o código já é uma realidade. “Inicialmente houve resistência na elaboração de um novo Código de Processo Civil, mas o projeto que tramita na Câmara tem um texto melhor do que a redação original. Agora é preciso contribuir para que o texto final atenda às expectativas de processo mais célere e adequado sem prejuízo de direitos”, explica Marcato.

O professor afirma que recorrer de uma decisão é inerente à natureza humana. Ainda mais, quando a primeira decisão é desfavorável. Para sanar a demora no processo, o legislador retirou formalidades e alguns recursos, o que inicialmente provocou resistência entre advogados. Porém, Marcato diz que alguns dos recursos que foram excluídos têm substitutos e não impedem o exercício da defesa, como se acreditou que aconteceria.

Os Embargos Infringentes foram retirados, mas mantidos em alguns casos. Outro exemplo foi a retirada do Agravo retido, aquele que é interposto, mas não é julgado de imediato para evitar que a discussão sobre um determinado ponto do processo se encerre. Diferente do Agravo de Instrumento que é o mesmo recurso interposto no tribunal em casos de urgência. Porém, o modelo não preclusivo será adotado.

“Na Justiça do Trabalho e nos Juizados Especiais já funciona dessa forma”, compara o professor. Quando um juiz dá uma decisão e cabe recurso de apelação, ele tem um efeito suspensivo, ou seja, a execução não acontece. Com as mudanças, o efeito suspensivo valerá apenas para alguns casos, como Alimentos.

Segundo Marcato, o processo tem um tempo de maturação e demora previsto legalmente com espaço para as alegações da defesa e o contato com as partes. Mas, a lentidão atual não é a do processo normal, mas a do período em que a ação fica parada. “A demora patológica é quando o processo fica paralisado sem nenhum ato nas prateleiras dos tribunais aguardando momento de julgamento. Isso aponta para deficiências na estrutura do Judiciário, que não são resolvidas com uma mudança na lei, mas com melhores condições para Justiça trabalhar.”

“A expectativa é um processo mais célere com menos formalismos desnecessários”, afirma o advogado. Outro aspecto polêmico do projeto é o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas: quando houver várias ações com o mesmo pedido, um caso será escolhido para ser julgado e essa decisão servirá para outros casos iguais. Marcato ressalta que apenas ações que peçam questões de Direito podem sofrer o julgamento coletivo.

O novo CPC prevê ainda outras providências para desestimular o litigante que usa a Justiça apenas para ganhar tempo e não cumprir uma decisão judicial. “Aumentaram a carga de sanções para quem perde o processo”, diz. Porém, o professor afirma que isso poderá ser fonte de injustiça. “Existe o argumento de que quem é pobre não paga, mas o problema não é esse. Uma grande empresa tem condições econômicas e financeiras”.

Outra modificação foi o prazo de recursos. Pelo projeto todos serão de 15 dias, exceto Embargos de Declaração que continua com 5 dias. Segundo o professor a mudança é positiva e evita dúvidas. Outro aspecto positivo para Marcato é o fim da reconvenção, medida em que o réu além de se defender passa ao ataque. "No mesmo processo os litigantes se defendem e pedem o que entendem ser direito. Mas sem a necessidade de um processo dentro de outro. É a mesma coisa, mas sem formalidades”, completa.

Entidades mobilizadas
A aprovação do projeto de reforma para o CPC aconteceu de maneira precoce e sem a devida participação da comunidade jurídica. Esta é a posição de três entidades representativas que começam a se mobilizar contra a aprovação do texto pela Câmara dos Deputados: a Advocacia-Geral da União (AGU), a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a seccional da Ordem dos Advogados do Brasil do Distrito Federal. Representantes de cada uma delas se reuniram no seminário “Visões Institucionais do Projeto de Reforma do Código de Processo Civil”, promovido na terça-feira (5/4) pela OAB-DF. 

Para o presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais da OAB-DF, Igor Carneiro de Matos, a ampla discussão do tema é da mais alta relevância para a Casa e, por isso, deve ser debatido e, consequentemente, aperfeiçoado. “É de tempo que a sociedade precisa para exaurir o novo estatuto. Não podemos admitir que tramite de maneira célere na Câmara dos Deputados. O CPC deve ser prático e moderno. O que desejamos é que essa polêmica invada o Congresso Nacional, onde as matérias devem ser melhor examinadas”.

Depois de apresentar as providências tomadas pela seccional durante a elaboração da proposta do novo código, o presidente da Comissão de Acompanhamento do Novo CPC da OAB-DF, Caio Leonardo Bessa Rodrigues, criticou a acelerada aprovação da matéria no Senado. “É preciso ouvir vozes divergentes, sem fechar qualquer porta. Vamos buscar um consenso do que deve ser esse Código”.

Já Manoel de Souza Mendes Júnior, da AGU, identificou e abordou as preocupações da entidade como um todo. Segundo ele, a Advocacia-Geral da União nunca se posicionou contra a elaboração do projeto, porém, acompanha cuidadosamente o debate por meio de um grupo de trabalho. “As preocupações da AGU não são exclusivas. O nosso questionamento é se esse é o momento mais oportuno para a mudança”.

O projeto também é tema prioritário para a CNI, conforme afirmou a conselheira Cristina Aires Corrêa Lima. A instituição defende o conhecimento prévio das regras, que intervém diretamente na atividade empresarial. “Uma decisão direta em benefício de alguns poucos influi no papel social que as empresas desempenham, com geração de emprego e renda. Não é com uma visão unitária que vamos chegar a uma efetividade da decisão”, defendeu.

De acordo com Cristina, a CNI é a favor de mini-reformas do Código de Processo Civil, oportunidade na qual os gargalos são devidamente evidenciados e corrigidos. “A lei deve se adequar à realidade e às características da sociedade. Entendemos que esse projeto não trará benefícios aos cidadãos”.

Considerar o novo código um movimento e entender as perspectiva do fenômeno inteiro é um primeiro passo, de acordo com o professor José Ignácio Botelho de Mesquita. O acadêmico defende que o debate traga a tona os problemas da proposta para que sejam avaliadas possíveis alterações. “A realidade atual é que o juiz passa a ter mais autoridade e, em paralelo, reduziram-se as garantias fundamentais do processo. Com a falta de recursos humanos e materiais e um sistema defasado, não conseguiremos dar vazão à demanda do Judiciário.”

Serviço
Consulta Pública novo Código de Processo Civil
Data: 12 de abril de 2011
Horário: às 9h
Local: no Salão Negro do Ministério da Justiça, Brasília.

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