Guerra entre estados

Cobrar ICMS na entrada de mercadorias é absurdo

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8 de abril de 2011, 15h54

Não bastasse o emprego do mecanismo da substituição tributária “para frente”, em que os estados exigem o pagamento do ICMS no início da cadeia mercantil e, portanto, antes de praticados os atos de circulação de mercadorias, temos nos deparado com medidas que tomam como critério para recolhimento de tributo o ingresso do bem no território estadual. É o que acontece, por exemplo, no estado de Mato Grosso, em modalidade conhecida por “ICMS Garantido” (existente paralelamente à figura do “ICMS Garantido Integral”), operando-se a cobrança do imposto por ocasião da entrada, no território estadual, de mercadorias provenientes de outras unidades da Federação. Diversos outros entes, como Pará, Rio Grande do Sul e Minas Gerais, adotaram procedimentos semelhantes, instalando barreiras fiscais nas divisas entre os estados, para fins de fiscalização dos transportadores de bens e correspondente cobrança do ICMS.

O estado de São Paulo também adotou proposta semelhante. A Lei 13.918/2009 acrescentou à Lei 6.374/1989 o artigo 60-A, dispondo que “nas operações interestaduais destinadas a contribuinte paulista, beneficiadas ou incentivadas em desacordo com o disposto na alínea ‘g’ do inciso XII do parágrafo 2º do artigo 155 da Constituição Federal, o Poder Executivo poderá exigir o recolhimento, no momento da entrada da mercadoria em território paulista, do imposto correspondente ao valor do benefício ou incentivo”. Nesse caso, há a particularidade de que o ICMS exigido é aquele correspondente a valores que teriam deixado de ser recolhidos ao estado de origem em virtude de benefícios fiscais tidos por irregulares pelo ente paulista. Mas, independentemente desse elemento distintivo, o que se tem é, do mesmo modo, o pagamento antecipado de tributo como condição para que a mercadoria possa ingressar no território estadual.

Ora, sabemos que o princípio federativo veda que qualquer pessoa política institua providências desfavoráveis a operações praticadas no território de outro ente. Nessa esteira, o artigo 152 da Constituição da República é claro ao enunciar que é “vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer diferença tributária entre bens e serviços, de qualquer natureza, em razão de sua procedência ou destino”. Evidente, portanto, a impossibilidade de um estado impor o recolhimento de ICMS relativo a mercadorias advindas de outras unidades da Federação, por qualquer que seja o motivo. Tal atitude é discriminatória, violadora de preceitos constitucionais.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal foi instado a manifestar-se sobre o assunto nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.565, envolvendo a Lei 6.041/2010, do estado do Piauí. Esse diploma legal estabelece, no artigo 1º, que o ICMS incidirá sobre as entradas de mercadorias oriundas de outras unidades da Federação, em manifesta ofensa ao pacto federativo, tendo, por esse motivo, sido concedida liminar suspensiva da sua eficácia.

Essa decisão liminar, fundada especialmente no princípio federativo, que reconhece a impossibilidade de cobrança de ICMS pela simples entrada de mercadoria no território piauiense. Trata-se de importantíssimo precedente, conferindo maior força aos argumentos acerca da inconstitucionalidade das leis estaduais que impõem o recolhimento do ICMS antecipado para as entradas de mercadorias advindas de outros estados da Federação.


 

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  • Brave

    é advogada tributarista do Barros Carvalho Advogados Associados, mestre e doutora em Direito Tributário pela PUC/SP, professora nos cursos de Mestrado e de Especialização em Direito Tributário da PUC/SP e professora no curso de Especialização em Direito Tributário do IBET.

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