Debate pluralizado

Amicus curiae não se limita à entrega de memoriais

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6 de abril de 2011, 7h19

O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, aceitou que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica, a União Federal e a Associação Brasileira de Supermercados atuem como amici curiae em processo que discute a proibição da construção de postos de gasolina nos estacionamentos de supermercados, hipermercados, teatros, cinemas, shopping centers, escolas e hospitais públicos no Distrito Federal. No mesmo despacho, Celso de Mello rejeitou pedido idêntico da Companhia Brasileira de Distribuição.

O processo em questão é o Recurso Extraordinário 597.165, contra decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que julgou improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada pelo Ministério Público do Distrito Federal questionando o artigo 2º da Lei Complementar Distrital 294/2000. A norma veda a edificação de postos de abastecimento, lavagem e lubrificação nos estacionamentos. Para o TJ, "a livre iniciativa não é absoluta" e sofre restrições impostas pelo interesse coletivo. "Não se pode instalar determinados ramos de negócio em todo e qualquer local, sob pena de causar danos à coletividade", afirma o acórdão.

No recurso encaminhado ao STF, as quatro entidades apresentaram pedidos de intervenção processual em que postulavam seu ingresso na condição de amici curiae. O relator observou, preliminarmente, que o STF tem admitido a possibilidade mesmo em se tratando de Recurso Extraordinário contra acórdão de tribunal local, proferido em processo de controle normativo abstrato, como no caso. Ressaltou, porém, que a intervenção do amicus curiae, para legitimar-se, "deve apoiar-se em razões que tornem desejável e útil a sua atuação processual na causa".

Embora a Lei 9.868/1999, que dispõe sobre as ações diretas de inconstitucionalidade, não admita, conforme seu artigo 8º, a intervenção de terceiros nesse tipo de processo, Celso de Mello observa que o parágrafo 2º do mesmo artigo "abrandou o sentido absoluto da vedação" e passou a permitir o ingresso de entidade dotada de representatividade adequada. A figura do amicus curiae tem por objetivo essencial, assinala o relator, "pluralizar o debate constitucional", fornecendo ao STF todas as informações possíveis e necessárias à resolução da controvérsia. A medida permitiria "superar a grave questão pertinente à legitimidade democrática" das decisões do STF no desempenho de seu poder de efetuar o controle concentrado de constitucionalidade.

"É por tais razões que entendo que a atuação processual do amicus curiae não deve se limitar à mera apresentação de memoriais ou à prestação eventual de informações que lhe venham a ser solicitadas", observa o ministro, que considera essa abordagem reducionista e contrária "aos altos objetivos políticos, sociais e jurídicos" do instituto.

Com esta fundamentação, o ministro admitiu o Cade, a União e a Abras, que atendem, no seu entendimento, as condições fixadas na Lei 9.868/99. No caso da Companhia Brasileira de Distribuição, o pedido foi indeferido. "Embora qualificando-se como entidade privada, não preenche a exigência concernente à representatividade adequada", explicou, acrescentando que o fato de a empresa ter sido parte em apelação cível que tratou de controvérsia idêntica não permite, só por isso, ser admitida nesta causa na condição de amicus curiae. "É que, tratando-se de controle normativo abstrato, como sucede na espécie, o processo reveste-se de pefil objetivo, em cujo âmbito não se discutem interesses individuais nem situações concretas", disse o ministro, com base em jurisprudência da corte.

Clique aqui para ler a decisão.

RE 597.165

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