Cooperação entre poderes

Só com Judiciário, Terceiro Pacto fica capenga

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3 de abril de 2011, 9h49

Os debates sobre o Terceiro Pacto Republicano estão em evidência no meio jurídico. O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Cesar Peluso, iniciou o ano Judiciário, em cerimônia ocorrida no dia 1º de fevereiro de 2011, conclamando os Três Poderes a discutirem propostas para o aprimoramento do Poder Judiciário.

Aproveitando a abertura dos debates sobre o tema, o Presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Gabriel Wedy, encaminhou algumas sugestões ao ministro Cesar Peluso, em que ressalta a necessidade de ampliação da Justiça Federal no segundo grau, de criação de quatro novos Tribunais Regionais Federais e de criação de 225 cargos de juízes para as Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais, além de uma consistente e transparente política remuneratória.

O discurso protagonizado pelos magistrados tem contribuído para uma preeminência do Judiciário em relação aos Poderes Executivo e legislativo. Vivemos um momento em que o Poder Judiciário interfere em quase todas as políticas públicas executadas (fenômeno conhecido como “ativismo judicial”), legisla (vide o exemplo das decisões do Tribunal Superior Eleitoral em diversas matérias: número de vereadores, (in)fidelidade partidária, entre outras), e, obviamente, presta a tutela jurisdicional, que deveria ser sua única função.

Esse fenômeno é relatado por Luiz Werneck Vianna, em seu livro Judicialização da Política e das Relações Sociais no Brasil, como resultado da judicialização da política nacional. Outrossim, para que haja um Pacto Republicano de verdade é necessário o restabelecimento do equilíbrio entre os Poderes.

Montesquieu, ao descrever sua teoria sobre a tripartição dos poderes, já alertava sobre a possibilidade de, em determinada época, haver prevalência de um Poder em relação aos demais. Os freios e contrapesos seriam a forma de manter o equilíbrio.

O Poder Constituinte Originário, atento às lições de Montesquieu, positivou no artigo 2º, da Constituição Federal de 1988, entre os princípios fundamentais da República Federativa do Brasil, a Separação entre os Poderes, que é cláusula pétrea, ante ao que preceitua o artigo 60, parágrafo 4º, inciso III, da Constituição Federal de 1988.

No cenário político nacional, esse equilíbrio somente será concretizado através do tratamento isonômico entre as funções essenciais à Justiça. Nesse contexto, o fortalecimento da Advocacia Geral da União, representante judicial e extrajudicial da União, consubstanciada pela personificação do Poder Executivo Federal, é relevante para a implementação desse objetivo.

A intenção do legislador constituinte ao incluir expressamente a AGU entre as funções essenciais à Justiça (Capítulo IV, seção II, da Carta Magna), foi criar um órgão técnico, capaz de prestar auxílio ao Presidente da República, e ao mesmo tempo resguardar os interesses sociais. Com isso, contribui-se para a consolidação de uma advocacia de Estado e de uma Justiça mais eficiente e equânime, na medida em que o papel do Advogado Público Federal transcenderá à defesa míope do governo de plantão.

A prestação jurisdicional, resguardando os direitos e garantias fundamentais, somente será célere e universal se os atores do processo judicial possuírem igualdade de prerrogativas e estrutura. Contudo, a Advocacia-Geral da União não possui estrutura nem prerrogativas similares ao Poder Judiciário.

Considerando a tendência moderna de “judicialização da política”, não podemos pensar em um aumento do número de juízes sem que haja aumento dos membros da AGU, com a correspondente estrutura, uma vez que os representantes judiciais da União figuram como parte em quase 70% dos processos na Justiça Federal.

Não se pode conceber que haja um aumento do número de juízes, servidores, varas federais e tribunais sem que a defesa da União esteja devidamente estruturada e preparada para o enfrentamento desse cenário. Qualquer plano estratégico que envolva a reunião de esforços, visando conferir efetividade à prestação jurisdicional, deve levar em conta as partes na relação processual.

Se a União é parte em grande quantitativo de processos afetos à competência da Justiça Federal, deverá, naturalmente, preparar-se para absorver um número maior de demandas, no caso de implementação das propostas apresentadas.

Logo, para a consolidação de um Pacto Republicano decente, é necessário observar a prestação jurisdicional de uma forma sistêmica, e não pleitos meramente corporativos. Uma proposta justa abrangerá, além do aumento do número de juízes, servidores e tribunais, a correspondente estruturação da AGU, órgão que defende a União, com ampliação do número de seus procuradores, servidores e instalações.

Alerta-se, contudo, para a possibilidade de fortalecimento de apenas uma parte dessa relação, Poder Judiciário, o que, acaso concretizado, consolidará um “pacto capenga”. E, para que isso não ocorra, os Poderes Executivo e Legislativo devem estar atentos a essa realidade.

Referências bibliográficas
BRASIL. Constituição Federal, de 05 de outubro de 1988. Disponível em:

BRÍGIDO. Carolina. O Globo Online. "Poderes debatem pacto para modernizar Justiça e agilizar julgamentos". Disponível em:

JUSCLIP. Clipping de Notícias Jurídicas. Presidente da Ajufe sugere iniciativas para o terceiro Pacto Republicano. Disponível em: Acesso em: 08.02.2011.

OLIVEIRA, André Pinto de Souza. A teoria da tripartição dos poderes no âmbito dos controles difuso e concentrado de constitucionalidade das leis e atos normativos pátrios. Jus Navigandi, Teresina, ano 12, n. 1522, 1 set. 2007. Disponível em:

WERNECK VIANNA, Luiz; CARVALHO, Maria Alice Rezende; MELO, Manuel Palácios Cunha & BURGOS, Marcelo Baummam. A Judicialização da Política e das Relações Sociais no Brasil. Rio de Janeiro: Revan, 1999.

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