Jusnaturalismo x Positivismo

Tese positivista pode levar a uma realidade injusta

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8 de setembro de 2010, 16h00

É inegável a importância do Poder Constituinte Originário responsável pelo primeiro e mais importante diploma legal do ordenamento, a Constituição, que é o fundamento de validade para todos os atos normativos. O objetivo do presente é estudar se há ou não limites à atuação do Poder Constituinte Originário, ante o seu caráter inicial, ou seja, se ele é ou não soberano. Impende salientar que trataremos apenas dos limites de direito[1], não dos limites de fato, que dizem respeito à eficácia do ato constituinte[2].

Para buscar a resposta utilizaremos as lições da doutrina, primeiramente conceituando o Poder Constituinte Originário, depois estudaremos o jusnaturalismo e o positivismo, expondo ao final nosso entendimento, sem pretensão de dar a última palavra sobre o tema, que comporta inúmeras discussões.

Poder Constituinte Originário
Não há sociedade sem direito. Fala-se em sociedade, fala-se em Direito. Daí surge uma questão, quem tem o poder de estruturar, dar corpo, constituir a sociedade? É o Poder Constituinte. A expressão vem do poder de constituir, este é quem constitui a sociedade.

Abade Sieyès foi o precursor da doutrina do Poder Constituinte, na obra Que é o terceiro Estado [3]?: “A concepção de Sieyès prende ao Estado a idéia de que ao mesmo é indispensável uma Constituição e que esta é obra de um poder anterior a ela própria – o Poder Constituinte”[4].

Leciona Michel Temer que o Poder Constituinte “é a manifestação soberana da vontade de um ou alguns indivíduos capaz de fazer nascer um núcleo social” [5]: “O Poder Constituinte, como o próprio nome indica, visa constituir, criar, positivar, normas jurídicas de valor constitucional”[6]. Tais normas servem como fundamento de validade de todas as outras normas.

Paulo Bonavides assevera:

“Cumpre todavia não confundir o poder constituinte com a sua teoria. Poder constituinte sempre houve em toda sociedade política. Uma teorização desse poder para legitimá-lo, numa de suas formas ou variantes, só veio a existir desde o século XVIII, por obra da sua reflexão iluminista, da filosofia do contrato social, do pensamento mecanicista anti-historicista e anti-autoritário do racionalismo francês, com sua concepção de sociedade”[7].

Trata-se do poder de elaborar a Lei Fundamental de um país, que vinculará todas as demais, dando-lhes fundamento de validade e constituirá o marco inicial do ordenamento jurídico. Resta saber se tal atividade encontra limites jurídicos, para tanto abordaremos as teorias positivista e jusnaturalista.

Positivismo
Para o positivismo jurídico, todo o direito se resume no direito positivo, ou seja, direito posto pelo Estado, na forma da lei, independentemente de seu conteúdo. Os positivistas têm a Constituição como fundamento de validade das leis. Válida é uma lei compatível com a Constituição. Esta encontra fundamento de validade na norma hipotética fundamental, que pode ser reduzida na frase “a Constituição deve ser obedecida”[8], seja ela justa ou injusta.

Dentro da perspectiva positivista, o Poder Constituinte é juridicamente ilimitado, por uma razão óbvia, já que para a doutrina positivista não há direito que possa ser invocado contra o Poder Constituinte, ele é “um poder onipotente, incondicionado: o poder constituinte não está subordinado a qualquer regra de forma ou de fundo”, conforme ressalta Canotilho[9].

Defendem os positivistas que o Poder Constituinte é o poder de criar normas que pertencem à hierarquia máxima dentro do direito positivo. Ele cria um novo Estado, um novo Direito, e não se pode falar de uma limitação do órgão do Poder Constituinte numa legalidade que nunca existiu ou que foi substituída.

Para os positivistas, como não há nenhuma espécie de regra de direito limitando a atuação do Poder Constituinte, o direito surge com a Constituição, que constitui o ponto de partida da ordem jurídica positiva. É dizer, o Poder Constituinte, segundo os positivistas, nunca estará sujeito a uma regra jurídica, já que elabora o fundamento de validade de todas as regras jurídicas.

Não há inconstitucionalidade dos atos praticados pelo Poder Constituinte Originário, já que não há limite algum a restringir a sua atividade. Seus atos não são passíveis de controle de compatibilidade com qualquer diploma ou regra.

A teoria positivista foi adotada pelo Supremo Tribunal Federal, que não admite a tese da inconstitucionalidade das normas constitucionais elaboradas pelo Poder Constituinte Originário, salientando: “A tese de que há hierarquia entre normas constitucionais originárias dando azo à declaração de inconstitucionalidade de umas em face de outras é incompossível com o sistema de Constituição rígida”[10].

Diante a alegação de desrespeito à cláusula pétrea por norma elaborada pelo Poder Constituinte Originário, O Supremo Tribunal Federal decidiu:

“(…) as cláusulas pétreas não podem ser invocadas para sustentação da tese da inconstitucionalidade de normas constitucionais inferiores em face de normas constitucionais superiores, porquanto a Constituição as prevê apenas como limites ao Poder Constituinte derivado ao rever ou ao emendar a Constituição elaborada pelo Poder Constituinte originário, e não como abarcando normas cuja observância se impôs ao próprio Poder Constituinte originário com relação às outras que não sejam consideradas como cláusulas pétreas, e, portanto, possam ser emendadas. Ação não conhecida, por impossibilidade jurídica do pedido." (RTJ 163/872-873, Rel. Min. MOREIRA ALVES, Pleno – grifei)

Vale assinalar, ainda, a propósito do tema, que esse entendimento – impossibilidade jurídica de controle abstrato de constitucionalidade de normas constitucionais originárias – reflete-se, por igual, no magistério da doutrina (GILMAR FERREIRA MENDES, "Jurisdição Constitucional", p. 178, item n. 2, 4ª ed., 2004, Saraiva; ALEXANDRE DE MORAES, "Constituição do Brasil Interpretada", p. 2.333/2.334, item n. 1.8, 2ª ed., 2003, Atlas; OLAVO ALVES FERREIRA, "Controle de Constitucionalidade e seus Efeitos", p. 42, item n. 1.3.2.1, 2003, Editora Método; GUILHERME PEÑA DE MORAES, "Direito Constitucional – Teoria da Constituição", p. 192, item n. 3.1, 2003, Lumen Juris; PAULO BONAVIDES, "Inconstitucionalidade de Preceito Constitucional", "in" "Revista Trimestral de Direito Público", vol. 7/58-81, Malheiros; JORGE MIRANDA, "Manual de Direito Constitucional", tomo II/287-288 e 290-291, item n. 72, 2ª ed., 1988, Coimbra Editora)”[11].

Verifica-se que o Pretório Excelso não adotou a teoria alemã das normas constitucionais inconstitucionais (verfassungswidrige Verfassungsnormem) que possibilita a declaração de inconstitucionalidade de normas constitucionais positivadas por incompatíveis com princípios constitucionais não escritos e os postulados de justiça (Grundentscheidungen). Vale dizer, segundo os positivistas não há nenhuma norma hierarquicamente superior à Constituição Federal, elaborada pelo Poder Constituinte Originário, que vinculará sua atividade, que é ilimitada, incondicionada, soberana.

Acrescenta o ministro Moreira Alves:

“Na atual Carta Magna ‘compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição’ (artigo 102, caput), o que implica dizer que essa jurisdição lhe é atribuída para impedir que se desrespeite a Constituição como um todo, e não para, com relação a ela, exercer o papel de fiscal do Poder Constituinte originário, a fim de verificar se este teria, ou não, violado os princípios do direito suprapositivo”[12].

Em síntese os positivistas defendem a tese que os atos do Poder Constituinte são ilimitados, pois não encontram qualquer obstáculo previsto em qualquer norma de direito positivo. Sua atuação é plenamente livre para instaurar uma nova ordem jurídica. Impende transcrever as precisas lições de Manoel Gonçalves Ferreira Filho: “Dentro de uma perspectiva positivista, o Poder Constituinte é juridicamente ilimitado, por uma razão óbvia, porque, para a doutrina positivista, não há direito antes da manifestação do Poder Constituinte, portanto, não há direito que possa ser invocado contra o Poder Constituinte”[13].

Para o positivismo jurídico, é a Constituição, norma-origem, que importa ao jurista; não existe nenhuma limitação anterior que restrinja a atuação do Poder Constituinte Originário.

Jusnaturalismo
Para o jusnaturalismo, o direito não se resume ao direito positivo, porque existe um direito resultante da própria natureza humana e que o antecede. “Esse direito é, grosso modo, o que resulta da natureza humana. É o chamado direito natural”[14].

A caracterização do direito natural varia conforme a escola jusnaturalista, conforme os ensinamentos de Manoel Gonçalves Ferreira Filho[15]. Abordaremos a Escola Tomista e a Escola do Direito Natural e das Gentes.

A Escola Tomista tem raiz no pensamento de Santo Tomás de Aquino, segundo o qual devemos distinguir um “direito eterno, a Lei Eterna, que é a própria Razão Divina, é a própria razão de Deus. Dessa Lei Eterna, o homem conhece uma parcela, através da Revelação ou da Igreja. Mas, por uma inclinação de sua razão, o homem tem acesso a uma outra parcela da Lei Eterna, e que é exatamente a Lei Natural”[16]. Não se nega a existência da lei positiva, estabelecida pelo homem, mas somente a lei positiva é válida quando se conforma à Lei Natural, à Lei Divina, que são as maneiras pelas quais os homens tem acesso à Lei Eterna.

Viamonte sintetiza o pensamento de São Tomás de Aquino, conforme salienta Maurício Antonio Ribeiro Lopes: “Diz ser inerente à natureza humana o espírito social, sendo natural, pois, que viva em sociedade e, para isso, deve fazer tudo o quanto se mostrar necessário para seu governo, mas sempre inspirado no princípio máximo de que todo poder emana de Deus”[17].

Assim, para a Escola Tomista, de Santo Tomás de Aquino, o Direito Natural é, em última análise, fundado na Lei de Deus, o que não corresponde ao que prega a Escola do Direito Natural e das Gentes, liderada por Hugo Grócio.

A Escola do Direito Natural e das Gentes teve como figura que se ressaltou Hugo Grócio, e funda o Direito Natural na razão humana e na inclinação social do homem. Esta difere da Escola Tomista, já que não funda o Direito Natural na Lei de Deus. A escola de Grócio influiu diretamente na doutrina do “Contrato social e, portanto, no pensamento iluminista que, no século XVIII, prevaleceu e se refletiu nas revoluções desse século” [18].

Segundo a tese Jusnaturalista, a liberdade, Direito Natural, é o fundamento do Poder Constituinte. Para os adeptos do Direito Natural[19], o Poder Constituinte não é uma mera força social, mas sim um poder que decorre diretamente de uma ordem jurídica natural onde a liberdade do ser humano de estabelecer novas idéias de Direito paira proeminente. O Poder Constituinte consiste num poder de direito emergente do direito de revolução que reside na nação. O direito não se resume ao conjunto de regras postas pelo Estado, mas resulta da natureza humana.

Segundo Georges Vedel, os direitos do homem, as liberdades e os direitos fundamentais, qualquer que seja o nome pelo qual sejam chamados, provêm originariamente do Direito Natural[20].

Tratam-se de direitos que antecedem o Estado, instituídos em razão da própria natureza humana, e que tem o condão[21] de restringir a atividade do Poder Constituinte Originário, em benefício do ser humano.

Manoel Gonçalves Ferreira Filho esclarece:

“O Direito não se resume ao Direito Positivo. Há um Direito Natural, anterior ao Direito do Estado e superior a este. Deste Direito Natural decorre a liberdade de o homem estabelecer as instituições por que há de ser governado. Destarte, o poder que organiza o Estado, estabelecendo a Constituição, é um poder de direito”[22].

Concluindo o precitado autor que há uma limitação do Poder Constituinte pelo direito natural, ou se preferir pelos direitos humanos fundamentais universalmente reconhecidos[23].

Na doutrina defendem que o direito natural constitui limitação ao Poder Constituinte Originário: Sieyès, Maurício Antonio Ribeiro Lopes [24], Leomar Barros Amorim de Souza[25], dentre outros.

Maurício Antonio Ribeiro Lopes acrescenta: “Para os que se filiam a posições jusnaturalistas, que admitem a existência de certos direitos inalienáveis e imprescritíveis, intuídos da própria natureza humana e que precedem a existência do Estado, não resta nenhuma dificuldade na aceitação dos limites ao Poder Constituinte”[26].

Entende Otto Bachof que existem direitos supralegais positivados na Constituição Federal e não positivados. Segundo o precitado autor a positivação do direito supralegal possui mero caráter declaratório de seu reconhecimento, incluindo-se o direito supralegal no conceito de constituição material, independentemente de positivação. Assim, não apenas as infrações aos preceitos textualmente escritos no documento constitucional, mas também as infrações às normas não-escritas da Constituição material, contrárias ao direito natural, podem aparecer “necessária e simultaneamente como violação do conteúdo fundamental da Constituição” [27].

Dessa forma, os jusnaturalistas concebem o Poder Constituinte Originário como um poder inicial, contudo limitado a normas de uma ordem jurídica natural, que tem dimensão supra e extraestatal, situando-se antes e acima da própria normatividade positiva do Estado.

Assim, o positivismo se satisfaz com a observância de requisitos ou pressupostos formais positivados, que não existem para a elaboração da Constituição. Como eles não existem, a atividade do Poder Constituinte Originário é ilimitada, incondicionada, soberana.

O jusnaturalismo defende que há limites a serem observados pelo Poder Constituinte, quais sejam os direitos naturais.

O Poder Constituinte Originário ao elaborar a Constituição está sujeito a limites jurídicos, especificamente aos direitos naturais. A liberdade, Direito Natural, é o fundamento do Poder Constituinte, que não pode divorciar-se de valores fundamentais como o direito à vida, a liberdade, à intimidade, aos valores sociais, dentre outros.

Os Direitos Naturais não podem ser suprimidos em uma nova ou na primeira Constituição, independentemente de inexistir limitação expressa prevista em norma positivada no ordenamento jurídico.

Adotar a tese positivista pode nos levar a uma situação totalmente injusta. Gustav Radbruch, em sua obra Introdução à Filosofia do Direito, nos traz o lúgubre exemplo ocorrido neste século:

“O positivismo, que poderíamos resumir na fórmula lapidar de a lei é a lei, deixou a jurisprudência e o Poder Judiciário alemães inermes contra todas as crueldades e arbitrariedades que, por maiores que tenham sido, foram plasmadas pelas autoridades daquela época sob a forma de lei. Além disso, a mentalidade positivista superveniente cria dificuldades quando se pretende destacar as conseqüências daqueles desmandos legais.

A derrubada do Estado nazista, que se baseava na negação do Direito, coloca continuamente a judicatura alemã diante de perguntas que o caduco mas ainda vivo positivismo jamais poderá responder. Eis algumas: devem considerar-se válidas as medidas adotadas em cumprimento às leis raciais de Nüremberg? Deve ser considerado juridicamente válido ainda hoje o confisco de propriedades dos judeus realizados à época sob o amparo do Direito vigente no Estado nazista? Deve ser considerada juridicamente válida a sentença prolatada pelos Tribunais nazistas, em conformidade com a legislação então vigente, que condenava à morte por delito de alta traição o simples fato de escutar emissora de rádio inimiga? Devemos considerar legítima a denúncia que deu início a um processo penal e culminou nesta sentença? Continua com valor de lei para nós a decisão informal com que Hitler, no mais absoluto sigilo, desencadeou o assassinato em massa nos cárceres? Estamos obrigados, ainda hoje a manter impune um ato punível, apenas porque foi protegido por uma anistia, através da qual o Partido instalado no poder declarou subtraídos à ação penal os crimes por ele mesmo perpetrados? Merece ser chamado Estado, no sentido jurídico da palavra, um Estado que não é senão o domínio de um Partido único, que condena ao desaparecimento todos os demais e que representa a própria negação do Direito?

O positivismo, herdado do passado, para responder todas ou qualquer uma dessas perguntas, deveria remeter-se ao conteúdo da lei. E certamente parte dos problemas levantados por elas foi resolvida pelas leis da zona de ocupação americana, relativamente à reparação de prejuízos causados pelos nazistas e ao castigo pelos atos ilícitos por eles praticados, e outra parte teve resposta no Estatuto de Nüremberg e na Lei sobre o Conselho de Controle. Mas isso não é aceito pela mentalidade positivista, porque a tais leis foi atribuído efeito retroativo. Para contestar essa objeção, basta dizer que, senão as leis mesmas, pelo menos seu conteúdo se achava já em vigor ao ocorrerem aquelas situações, ao serem cometidos aqueles ilícitos; dizendo em outras palavras, essas leis correspondem, por seu conteúdo, a um Direito superior à lei, supra-legal, qualquer que seja a concepção que tenhamos desse Direito – ainda que o concebamos como um Direito divino, um Direito da natureza ou um Direito da razão.

Assim, após um século de positivismo jurídico, ressuscita a idéia de um Direito superior à lei, supra-legal, um parâmetro que permite medir as próprias leis positivas e considerá-las contrárias ao Direito, verdadeiros ilícitos sob a forma de lei. Até que ponto se deve atender à Justiça quando esta exija a nulidade de normas jurídicas que a contrariam e em que medida deve-se preferir o postulado da segurança jurídica se ele impõe o reconhecimento do Direito estatuído ao preço de uma injustiça, são problemas que examinamos e procuramos resolver nas páginas anteriores. O caminho para se chegar à solução desses problemas está implícito no nome que a Filosofia do Direito ostentava nas antigas Universidades e que, após muitos anos em desuso, ressurge hoje; no nome e no conceito de Direito Natural”[28].

Destaque-se que mesmo juristas que antes eram contrários a qualquer forma de Direito Natural buscam, após o nazismo, defendê-lo. Gustav Radbruch é um dos que se opunham ao Direito Natural, e passou a entender que o “Direito só é válido quando respeitar princípios básicos de justiça, que uns chamam de ‘direito natural’, e outros de ‘direito racional’”[29].

Ressalta o Professor Jacy de Souza Mendonça que “durante os cinco anos do curso de bacharelado jurídico, o Direito é estudado como sendo a lei, embora não haja sinonímia, não haja equação entre ambos. A lei expressa o Direito, em forma inadequada e pobre, a riqueza da realidade jurídica, mas as dimensões totais do Direito não se encerram apenas nela, expressão limitada, pobre e fugaz de uma realidade rica, permanente e fecunda”[30].

Não se pode olvidar que “Direito injusto não é Direito. Poderá ser convenção humana, vontade de uma assembléia ou imposição de um ditador, mas, apesar dessa forma jurídica, apesar de ser elaborado segundo a técnica jurídica, ter todas as características formais da norma jurídica, se não tiver conteúdo justo, não é Direito”[31]. “O Direito é a própria coisa justa, já tinham visto os romanos”[32].

Discordamos de Paulo Bonavides quando afirma que o Poder Constituinte “é o poder que tudo pode”[33]. Não se pode admitir nos tempos atuais que o Poder Constituinte Originário institua a escravidão[34], a tortura, ou até o direito de pernada[35], verdadeiras práticas arcaicas, incompatíveis com a dignidade da pessoa humana, injustas, e que violam direitos naturais.

A criação do Estado é uma maneira que os homens usam para terem garantidos e respeitados os seus direitos, que foram conquistados no curso da evolução histórica da humanidade e estão incorporados no patrimônio da humanidade, não podendo ser abolidos por ato do Poder Constituinte Originário.

Bibliografia
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VIEIRA, Oscar Vilhena. A Constituição e sua reserva de justiça – um ensaio sobre os limites materiais ao poder de reforma, São Paulo: Malheiros, 1999.


[1]. Não abordaremos as limitações impostas pelos Tratados e Convenções Internacionais que não versam sobre os direitos humanos

[2]. As Constituições que ficaram letra morta são as que Lassale chamava de Constituição da folha de papel.

[3]. Escrito no original: Qu’est-ce que le tiers État.?. Tal obra consiste no verdadeiro manifesto da Revolução Francesa, ode expõe as reivindicações da burguesia, definindo-a como a nação e, conseqüentemente, titular do Poder Constituinte. Hoje predomina na doutrina o entendimento que o povo é titular do Poder Constituinte, neste sentido: Manoel Gonçalves Ferreira Filho, O poder constituinte, p. 158; Michel Temer, Elementos de Direito Constitucional, p. 32; Aricê Moacyr Amaral, O poder constituinte, p. 16 apud Alexandre de Moraes, Direito Constitucional, p. 51.

[4]. Maurício Antonio Ribeiro Lopes, Poder Constituinte Reformador: limites e possibilidades da revisão constitucional brasileira, p. 46

[5]. Elementos de Direito Constitucional, p. 29.

[6]. Maurício Antonio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 24.

[7]. Curso de Direito Constitucional, p. 120.

[8]. Paloma Santana Modesto, Poder Constituinte Originário, p. 101. Manoel Gonçalves Ferreira Filho leciona que a norma hipotética fundamental tem o seguinte enunciado: “devemos conduzir-nos como a Constituição prescreve”, op. cit., p. 51.

[9]. Direito Constitucional, p. 94.

[10]. STF – Pleno – Adin nº 815-3, Rel. Min. Moreira Alves, Diário da Justiça, Seção I, 10 de maio de 1996, p. 15.131. No mesmo sentido na doutrina é a lição de Francisco Campos, Direito Constitucional, p. 392.

[11] STF – Pleno – ADI 3300 MC, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, julgado em 03/02/2006, publicado em DJ 09/02/2006 PP-00006 RTJ VOL-00200-01 PP-00271 RDDP n. 37, 2006, p. 174-176 RCJ v. 20, n. 128, 2006, p. 53-60 RSJADV jul., 2007, p. 44-46.

[12]. A Inconstitucionalidade de Normas Constitucionais Originárias – Sua Impossibilidade em Nosso Sistema Constitucional, artigo retirado da internet.

[13]. Manoel Gonçalves Ferreira Filho, O Poder Constituinte, p. 70.

[14]. Manoel Gonçalves Ferreira Filho, O Poder Constituinte, p. 51.

[15]. Op. cit., p. 52.

[16]. Ibidem, p. 52.

[17]. Op. cit., p. 34.

[18]. Manoel Gonçalves Ferreira Filho, op. cit., p. 52.

[19]. Adotamos a lição de Tércio Sampaio Ferraz no sentido de que há quem diga que os direitos humanos formam um corpo jurídico dito de Direito Natural, ínsito à natureza humana, e que portanto está acima da Constituição que é obra política, feita pelos homens, apud Maurício Antonio Ribeiro Lopes, op. cit., p. 106.

[20]. Neste sentido: George Vedel, La constitution comme garantie des droits: le droit naturel, p. 205-215, apud Direitos do Homem, Direitos Fundamentais e Liberdades Públicas, Alberto Nogueira, página jurídica do Conselho da Justiça Federal, “internet”.

[21]. Logicamente segundo a teoria jusnaturalista.

[22]. Curso de Direito Constitucional, p. 20.

[23]. Ibidem, p. 71.

[24]. Op.cit., p. 107.

[25]. “Os direitos humanos como limitação ao poder constituinte”, Revista de Informação Legislativa, 110/84.

[26]. Op. cit., p. 107.

[27] “Normas constitucionais inconstitucionais?”.Trad. José Manuel M. Cardoso da Costa. Coimbra: Almedina, 1994, p. 63.

[28]. tradução do final do livro, feita pelo Professor Jacy de Souza Mendonça. Texto disponibilizado pelo tradutor, que leciona Filosofia do Direito I, no Curso de Mestrado da PUC-SP.

[29]. Oscar Vilhena Vieira, A Constituição e sua reserva de justiça, p. 110.

[30]. O Curso de Filosofia do Direito do Professora Armando Câmara, p. 23.

[31]. Jacy de Souza Mendonça, op. cit., p. 127.

[32]. Ibidem.

[33]. Curso de Direito Constitucional, p. 127.

[34]. Discordamos de Kelsen, citado por Paulo Bonavides, ao afirmar que a “introdução da escravidão como instituto jurídico se acha inteiramente no âmbito da possibilidade de uma ordem jurídica”, Direito Constitucional, p. 151, por ferir o Direito Natural à liberdade, fundamento do Poder Constituinte, segundo o jusnaturalismo.

[35]. ou jus primae noctis, que consistia no “direito dos senhores de manterem relação sexual com as jovens aldeãs de seu feudo na noite em que elas se casassem”, José Damião Lima Trindade, Anotações sobre a história social dos direitos humanos, in Direitos Humanos: Construção da Liberdade e da Igualdade, p. 26, nota de rodapé n. 40.

Autores

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    é procurador do estado de São Paulo, professor de Direito Constitucional e Direitos Humanos da União dos Cursos Superiores COC, do Curso LFG, e de cursos de pós-graduação (PUC-COGEAE, UFBA, Escola Superior do Ministério Público, JUSPODIVM e FAAP), doutor e mestre em Direito do Estado pela PUC-SP, coordenador do grupo de pesquisa do Curso de Direito das Faculdades COC: “Observatório do Supremo Tribunal Federal”.

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    é advogada licenciada e bolsista pela Pró-Reitoria da UNESP, membro do grupo de pesquisa do Curso de Direito das Faculdades COC: “Observatório do Supremo Tribunal Federal”.

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