Santa Catarina

Funai não pode remover família para demarcar reserva

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6 de setembro de 2010, 7h01

Com base na estrutura social e no tempo de instalação das famílias que moram em uma área destinada para criação das reservas indígenas no norte catarinense, a Justiça Federal garantiu à Associação dos Proprietários, Possuidores e Interessados em Imóveis nos Municípios de Araquari e da Região Norte-Nordeste de Santa Catarina (Aspi) a permanência no local até o final do processo de demarcação.

Graças à liminar concedida à entidade, a Fundação Nacional do Índio (Funai) está impedida de tomar qualquer medida para remover os cerca de 200 proprietários de terras para a definição das reservas Piraí, Tarumã, Morro Alto e Pindoty, até trânsito em julgado.

Em sua decisão, o juiz Claudio Schiessl, da 1ª Vara Federal de Joinville, considerou as estruturas construídas pelos moradores da área de 9.366 hectares. “Os associados possuem há décadas toda a sua estrutura social, familiar e econômica assentada sobre as bases da propriedade destas terras. Por certo os prejuízos advindos do esbulho pretendido pela União dificilmente poderiam ser ressarcidos em sua plenitude, quer no aspecto material quer no aspecto psicológico”, afirma o juiz na decisão.

Vícios
A advogada da Aspi, Priscila Dalcomuni, aponta vícios no processo de demarcação. A Funai baseia seu pedido na questão das tradicionalidades das terras, no entanto, um estudo feito por antropóloga da fundação, no início do processo, concluiu que as terras de Santa Catarina são de passagem para acesso ao litoral paulista e que os índios presentes eram nômades até se iniciar o processo de assentamento.

Para que a tradicionalidade das terras seja declarada, como determina o artigo 231 da Constituição, é necessário que as áreas sejam habitadas por índios em caráter permanente; serem por eles utilizadas para suas atividades produtivas; serem imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar; e serem necessárias a sua reprodução física e cultural.

“Em um caso similar, o STF (Supremo Tribunal Federal) considerou que, para uma área ser considerada tradicionalmente indígena, os índios deveriam estar no local antes de 5 de outubro de 1988. Porém, um lado feito por um antropólogo contratado pela Aspi, em 2007, aponta que os indígenas chegaram depois”, afirmou a advogada. Segundo ela, os moradores estão no local desde a década de 1980 e possuem títulos de posse.

A defesa afirmou ainda que houve violação do princípio de ampla defesa e do contraditório, uma vez que os associados não foram intimados em todos os atos do processo, não acompanharam estudos, levantamentos e elaboração dos laudos. O laudo da Funai também é questionado pela Aspi porque as antropólogas participantes são dirigentes de uma ONG interessada na demarcação, e não poderiam estar envolvidas no estudo.

Recurso
A Funai já recorreu da decisão da 1ª Vara Federal de Joinville com um Agravo de Instrumento para o Tribunal de Justiça, que ainda não se manifestou. No recurso, a fundação apresenta um novo laudo, em que é apontada a tradicionalidade indígena das terras.

O processo para demarcação da área em Santa Catarina pela Funai começou em 1996, por conta da duplicação da BR-101. Para a advogada, o processo terá desdobramentos, desde a avaliação de um antropólogo isento para considerar a tradicionalidade ou não da área pretendida como reserva, até a decisão final, que deve chegar ao Supremo Tribunal Federal.

Ação Ordinária 2009.72.01.005799-5/SC

Clique aqui para ler a decisão.

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