Herança garantida

Regularização de direito sucessório evita ações

Autor

  • Telma Hirata

    é advogada com inscrição tanto na Ordem dos Advogados do Brasil como na de Portugal integrante da Brazilian Desk da Abreu Advogados.

15 de outubro de 2010, 8h00

Muitos portugueses partiram para o estrangeiro, principalmente para o Brasil, deixando na terra natal seus pais, parentes e até mesmo bens. Muitos não regressaram e, por consequência, nunca regularizaram a situação de eventuais heranças em que tinham interesses e/ou direitos, ficando os bens aos cuidados de outros parentes próximos.

Com o decorrer do tempo, esses parentes próximos que cuidavam dos bens deixados em Portugal foram sucedidos pelos seus filhos, que nunca viram o parente português, os quais, não raramente, acabam por tentar se apropriar desses bens, invocando usucapião para efeitos de registro da propriedade em seus nomes.

A situação se agrava ainda mais quando falece o cidadão português que emigrou para o Brasil, deixando bens em Portugal, e nada se faz para representar os herdeiros em Portugal, pois, por força do disposto no artigo 62º do Código Civil Português, a sucessão dos bens de cidadão português com a respectiva transmissão aos herdeiros deve se dar na conformidade com a lei pessoal do autor da sucessão que corresponde à da nacionalidade do indivíduo.

Há, portanto, como primeiro passo e em relação aos bens situados em Portugal, que se registrar o óbito em Portugal e, na sequência, declará-lo às autoridades portuguesas, inclusive fiscal, com a apresentação da relação de bens. O prazo para a apresentação dessa declaração à entidade fiscal portuguesa termina no último dia do terceiro mês seguinte ao do óbito. No que diz respeito à partilha dos bens localizados em território português, no caso de existir concordância entre todos os herdeiros, é possível efetivá-la perante o Notário, mediante lavratura de escritura pública de partilha (Lei 29/2010). Todavia, em alguns casos específicos, obrigatoriamente, deverá ser instaurado um processo de inventário nos Tribunais.

Paralelamente a estes procedimentos, deverá ser também instaurado o processo de inventário no Brasil, caso o cidadão português tenha deixado bens no território brasileiro, na medida em que o artigo 89 do Código de Processo Civil brasileiro prevê, de forma expressa, a competência exclusiva da autoridade brasileira para proceder a inventários e partilhas de bens situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja estrangeiro e tenha residido fora do território brasileiro. O não atendimento a esta formalidade impede a transferência da titularidade do patrimônio situado no Brasil, mesmo que seja apresentado, perante a autoridade brasileira, título judicial ou extrajudicial de partilha, emanado por autoridade portuguesa, dispondo acerca desse patrimônio.

Haverá, rigorosamente, nesses casos em que o autor da herança deixou bens no Brasil como em Portugal, a necessidade de instauração de dois procedimentos de inventário judiciais – um em Portugal e outro no Brasil – para viabilizar a concretização integral da sucessão do patrimônio do falecido.

Findo o processo de inventário dos bens localizados no Brasil, perante as respectivas instâncias judiciárias, com o trânsito em julgado da sentença que homologar a partilha, esta estará apta para ser objeto de revisão e reconhecimento de sua validade pelo Poder Judiciário português, necessários ao prosseguimento do processo de inventário instaurado em Portugal e efetiva liquidação da herança.

Sem a menor sombra de dúvida que um número elevado de problemas surge desses fatos acima mencionados, nomeadamente, aqueles decorrentes do Direito Sucessório e Internacional Privado. Todavia, aconselha-se que os cidadãos portugueses residentes no estrangeiro e luso-descendentes que tenham direitos hereditários em Portugal regularizem as respectivas situações, evitando futuros transtornos irreversíveis e de elevado custo.

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