Falha de S.Paulo

Liminar retira do ar site que satirizava a Folha

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4 de outubro de 2010, 17h17

Na última sexta-feira (1º/10), o designer Mario Bocchini recebeu uma visita inesperada. O oficial de Justiça trazia uma liminar pedindo a retirada do ar do blog Falha de S.Paulo, paródia do jornal Folha de S.Paulo. O não cumprimento da determinação judicial acarretaria em multa diária de R$ 1 mil.

Falha de S.Paulo nasceu há 20 dias. Os irmãos Lino e Mario Bocchini faziam de três a cinco postagens diárias, usando a diagramação e as fontes gráficas da publicação impressa, com títulos como "Só a Folha pode definir o que é democracia".

"A gente fazia uma crítica bem-humorada ao jornal, por considerá-lo partidarizado. Tinha fotomontagem, piadinhas, balões de fala nas fotos", conta o jornalista Lino. "O que surpreendeu a gente é que a liminar fala em folhas 80 e 81 do processo. Ou seja, a Folha abriu um processo de mais de 80 páginas contra um blog independente".

Na manhã desta segunda-feira (4/10), os irmãos receberam um e-mail do departamento de assessoria jurídica do Registro.Br, empresa responsável pela administração dos registros de domínio de internet no Brasil. Segundo o comunicado, o domínio falhadespaulo.com.br permanecerá congelado para atender à decisão do juiz de Direito da 29ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de São Paulo, Nuncio Teophilo Neto.

A decisão diz que a liminar não visa impedir a sátira em si, mas sim zelar pela marca do jornal. Segundo a advogada da publicação, Taís Gasparian, “a Folha, como qualquer outra empresa, deve preservar a sua marca”. Sobre a multa definida pelo juiz, ela diz ser baixa. “Geralmente, nesses casos, o juiz aplica uma multa de R$ 100 mil”.

Lino não concorda com a advogada. Para ele, o valor é excessivo, ainda mais se tratando de um blog independente, que não possui publicidade ou banners. “Pra mim, o que a Folha fez foi uma manobra jurídica pra encobrir a censura. Ao mudar a esfera da ação da liberdade de expressão para o uso indevido da marca, o jornal deu uma desculpa esfarrapada.”

Antes da liminar, o Falha de S.Paulo possuía cerca de 1 mil acessos diários. No sábado, quando os blogueiros publicaram a liminar e tiraram todo o conteúdo do ar, o número de visitas subiu para 40 mil. A dupla mantém ainda um perfil no Twitter.

No post de despedida, Lino e Mario escreveram ser “impressionante a hipocrisia da Folha”. No dia 26 de setembro, o jornal publicou um editorial na primeira página defendendo a irrestrita liberdade de expressão — como conta Lino, “mesmo quando incomodarem pessoas poderosas”. Além disso, o periódico criticou a tentativa de impedir o uso de humor nas campanhas eleitorais deste ano.

Processo: 583.00.2010.184534-2

Leia o texto postado pelos jornalistas depois da decisão.

Há duas semanas resolvemos fazer um site de humor destinado à crítica da cobertura jornalística, o Falha de S.Paulo (www.falhadespaulo.com.br), uma sátira ao jornal “Folha de S.Paulo”. É um site com críticas? Sim, claro. Tão duras quanto as feitas pelo CQC, Casseta & Planeta ou José Simão, por exemplo. Hoje recebemos uma decisão liminar (antecipação de tutela, concedida pela 29ª Vara Cível de SP) que nos obriga a tirar o site do ar, sob pena de multa diária de R$ 1.000. A desculpa utilizada pelo jornal para mover a ação foi o "uso indevido da marca" (tucanaram a censura).

É chocante a hipocrisia da Folha. Se isso não é censura e um atentado inaceitável à liberdade de expressão, juro que não sabemos o que é. Chega a ser cômico: o mesmo jornal que faz dezenas de editoriais acusando o governo de censura e bradando indignado por “liberdade de expressão” comete esse ato violento de censura. Ato este, aliás, bastante covarde: o maior jornal do país movimentou um enorme escritório de advocacia e o Poder Judiciário contra um pequeno site independente. É muita falta de humor, de esportividade, de respeito à democracia.

Senhores proprietários e advogados da Folha, podem ficar tranquilos. Todos ainda poderão ser satirizados, menos vocês. Todos merecem liberdade de imprensa, menos quem não é da sua turma. E, como ao contrário de vocês, respeitamos as instituições e a democracia, vamos cumprir a ordem judicial.

Parabéns, Folha! A censura imposta por vocês será cumprida.

Lino Ito Bocchini e Mario Ito Bocchini

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