Conduta atípica

Médico alega ética para tratar de traficante

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16 de novembro de 2010, 13h51

O médico que, mediante pagamento, retira entorpecente introduzido no corpo de uma mulher para fins de tráfico, concorre para o crime de tráfico de droga ou sua conduta é atípica e carrega a excludente de antijuridicidade (ato feito no exercício regular do Direito)?

A questão atormenta o Tribunal de Justiça de São Paulo. A corte paulista foi provocada a julgar Habeas Corpus que pede o trancamento da Ação Penal contra o médico por falta de justa causa. O caso está sendo apreciado pela 16ª Câmara Criminal e a defesa do profissional é feita pelo advogado Alberto Zacharias Toron.

O médico foi preso em flagrante e denunciado pelo Ministério Público por coautoria, ajuda ou participação no crime de tráfico de entorpecentes. Diz a acusação, que o médico A.G. cobrou R$ 7,8 mil para retirar 139,2 gramas de maconha da vagina de M.J.A. A mulher fazia o papel de “mula” e iria receber R$ 250 para conduzir a droga introduzida em seu corpo, de São Paulo até Assis. A mulher grávida, vez a viagem de ônibus. Ao chegar à cidade, não conseguiu retirar a droga do esconderijo. 

Um dos comparsas entrou em contato com o médico para recuperar a droga. O médico, que trabalha como obstetra, cobrou R$ 7,8 mil pelo procedimento cirúrgico. De acordo com a denúncia, o médico removeu o entorpecente, entregando a droga à mulher. A maconha teria sido embalada em papel e colocada em luvas cirúrgicas. 

Quando saía do hospital a mulher M.J.A. foi presa em flagrante por policiais, alertados por meio de notícia anônima. Também foram presos dois de seus comparsas, que estavam na posse de R$ 7,8 mil. O médico foi preso em casa e, ao ser abordado pelos policiais, admitiu o contato com a mulher, mas negou a remoção da droga. Segundo sua versão, teria submetido M.J.A. a exames de rotina. O médico foi solto em seguida por meio de Habeas Corpus concedido pelo ministro Nilson Naves, do STJ. O benefício foi estendido aos demais réus, que respondem ao processo em liberdade. 

Agora, a defesa do médico pretende o trancamento da Ação Penal. A tese manejada é a da ausência de justa causa porque, de acordo com seu advogado, o acusado agiu sob a excludente de antijuridicidade do estrito cumprimento do de dever legal. Ainda de acordo com a defesa, não poderia ser outra a conduta do acusado, porque a ética médica exige dele o pronto atendimento e a ação de medidas que preservem a vida e a saúde dos pacientes. 

A defesa segue seu raciocínio afirmando que se seu cliente não fizesse a intervenção obstétrica ou não devolvesse à mulher a droga retirada da vagina, ou ainda, se delatasse o fato à autoridade policial estaria ocorrendo em outro delito. 

O relator do caso entendeu que a tese criada pela defesa não deve prosperar. Para o relator, a gravidade reside no fato de que a conduta do médico se deu mediante prévio ajuste e conluio com os demais réus. A denúncia vai além indicando que o médico agiu mediante a promessa de pagamento financeiro, sozinho, desacompanhado de outros integrantes da equipe médica e do corpo hospitalar e, ainda, preservando a droga e a entregando à mulher.

 

O relator defendeu que havia indícios de autoria, prova da materialidade e presença aceitável de elemento subjetivo capaz de imputar a prática de tráfico de drogas, mediante coautoria ou participação.

Em resumo, a tese do relator segue no sentido de que o ato médico foi realizado mediante ajuste criminoso e sob a promessa de pagamento para a retirada da droga e depois fornecimento a terceiros.“Incabível o trancamento da ação penal porque presente justa causa, ausente absoluta e flagrante prova da atipicidade ou da excludente de ilicitude ou de antijuricidade”, entendeu o relator. O revisor pediu vistas do processos e adiou a conclusão do julgamento.

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