Política pública

Prejuízo ambiental não costuma ser levado em conta

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11 de novembro de 2010, 18h30

O poder econômico e político prevalecem no momento em que o governo define políticas públicas, em detrimento do prejuízo ambiental. Foi o que afirmou procurador substituto da União no Pará, Denis Moreira, nesta quinta-feira (11/11), em Belém do Pará, durante o IV Encontro Nacional dos Advogados Públicos Federais. Para ele, o advogado público federal precisa internalizar a preocupação com o meio ambiente e colocá-lo como prioridade na pauta dos trabalhos, porque este será o principal tema nos próximos anos no mundo inteiro.

Segundo Moreira, a maior dificuldade quando se trata de questões ambientais é mudar a mentalidade das pessoas. “É natural acharmos que a ciência irá resolver todos os problemas ambientais em um passe de mágica, ou que o progresso justifica o dano”, explica. O advogado público também estaria contaminado com esse pensamento, afirma.

Em sua palestra, o procurador defendeu também um deslocamento da atuação dos advogados públicos, que em vez de apenas solucionar conflitos que vão para o Judiciário devido a alguma irregularidade, deveriam participar ativamente como consultores para evitar inconstitucionalidades em projetos do governo. Este seria um momento de transição para a carreira, que começa a se preocupar com uma função mais preventiva.

O procurador é o coordenador do grupo Amazônia Legal no qual integram o Ministério do Desenvolvimento Agrário, Ministério de Planejamento, Ibama, Instituto Chico Mendes (ICMBio), a Procuradoria-Geral da União e a Procuradoria-Geral Federal. O grupo tem por objetivo combater a grilagem de terras, os conflitos agrários e o avanço do desmatamento na Amazônia.

Uma das maiores vitórias do grupo foi a decisão do Conselho Nacional de Justiça de mandar o Tribunal de Justiça do Pará cancelar mais de seis mil títulos fundiários irregulares, aponta Moreira. O TJ não aceitava cancelar administrativamente os títulos, apesar de haver uma previsão legal para o procedimento.

Além dessa, outras iniciativas estão sendo desenvolvida, como o Terra Legal que visa regularizar os imóveis da União ocupados. Se a pessoa que ocupou o local tiver direito, o governo doará o patrimônio juntamente com a documentação necessária para comprovar. A ideia é dificultar a ação daqueles que se dizem donos das terras, conhecidos como grileiros, e obrigam os moradores a pagar para ficar nelas.

O termo grilagem surgiu da forma como os grileiros falsificavam os documentos para registrar em cartórios títulos que nunca existira. Eles colocavam o novo título em uma caixa com grilos, os insetos soltavam uma secreção que amarelava o papel e o deixava com aspecto envelhecido. Munidos desse suposto título registrado em cartório, conseguiam destacar o patrimônio da União, e com isso registrar no nome do novo proprietário.

Moreira afirma que atualmente os grilos perderam sua função, porque quando precisam registrar um documento que nunca existiram os criminosos utilizam a força e a pressão. “Não só criminosos compram terras griladas, mas pessoas de boa-fé não têm como desconfiar se um documento registrado em cartórios é ilegal”, ressalta.

Ambientalistas, indígenas, latifundiários, grandes e pequenos empreendimentos, quilombolas, ribeirinhos, povos da floresta, são os maiores grupos de interesse nessas discussões. “É um esforço de tentar organizar os interesses. Hoje, o esforço é tentar trazer para a regularidade algumas dessas situações e entrar com uma ação judicial para cobrar a responsabilização ambiental em certos casos”, observa.

Diante de tantos pontos de vista, por vezes divergentes, o assunto se torna complexo. O procurador conta o caso em que os moradores de uma cidade se voltaram contra autoridades que pediam a reintegração de posse da área, de sua propriedade, ocupada por uma empresa que impulsionava a economia da cidade. Para Moreira, mesmo diante dessas situações, é necessário manter as terras regularizadas e a preocupação com o meio ambiente em primeiro lugar, para não sofrermos as consequências dessas escolhas imediatistas.

Barril de pólvora
Moreira criticou ainda a coragem de quem não conhece a realidade das regiões de conflito. Segundo ele, autoridades tomam decisões e dão declarações a distância, mas quando os advogados vão até a região encontram os ânimos acirrados.

O procurador acredita que atualmente há uma mudança na mentalidade do empresário,que enxerga na preocupação com o meio ambiente a longevidade da empresa. Porém, aquelas que contam com a morosidade do Judiciário como estratégia de sobrevivência ainda existem. Outra questão que dificulta o combate ao dano ambiental é o gigantismo da Amazônia e ausência da ocupação do Estado nas regiões.

Moreira destaca que o Judiciário está se atentando para as questões ambientais. Na Justiça Federal do Pará já existe uma vara especializada em questões ambientais. Entre os processos famosos, o da usina Belo Monte se destaca. “As últimas decisões são sensíveis ao meio ambiente e reforçando institutos jurídicos que facilitam a proteção ao meio ambiente”, aponta.

Para o procurador, é necessário começar a pensar em políticas públicas de médio e longo prazo, e não mais em medidas urgentes. "Como isso não é feito, quase tudo é urgente e é justamente o ponto frágil da discussão."

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