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Decisões irrecorríveis não mudam com extinção de lei

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29 de março de 2010, 13h05

O reconhecimento da inconstitucionalidade da Lei de Imprensa pelo Supremo Tribunal Federal não tem qualquer reflexo sobre decisões judiciais já transitadas em julgado. O entendimento, manifestado pela Procuradoria-Geral da República em parecer entregue ao Supremo, se refere a uma ação em que a revista Veja questiona a necessidade de cumprir uma decisão dada antes da declaração de inconstitucionalidade da Lei de Imprensa. Para a revista, ao dar efeito ex tunc à decisão, o STF afirmou que a lei deixou de ter validade a partir da promulgação da Constituição Federal, período que inclui o momento em que a Veja foi condenada a publicar uma retratação ao ex-secretário-geral da Presidência da República do governo FHC, Eduardo Jorge Caldas Pereira.

Entregue nesta quinta-feira (25/3) ao relator do processo no Supremo, ministro Carlos Ayres Britto, o parecer, assinado pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, é favorável a Eduardo Jorge. O ex-secretário reclama, no Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que a Veja se recusa a cumprir uma decisão transitada em julgado. A Editora Abril, que publica a revista, foi condenada por ofensas publicadas entre 2000 e 2002, em que várias reportagens insinuaram a participação de Eduardo Jorge em um esquema de corrupção. Na época, ele estava sendo investigado pela Receita Federal sob a acusação de enriquecimento ilícito.

A revista acabou obrigada a pagar R$ 150 mil em indenização a Eduardo Jorge, e a publicar a sentença condenatória. A condenação aconteceu em 2005, e transitou em julgado em fevereiro do ano passado, antes da decisão do Supremo sobre a Lei 5.250/1967, em abril. No TJ-DF, o ex-secretário espera o desfecho do processo de cumprimento da sentença, a fase de execução da decisão principal. O tribunal já afirmou não ser necessário que os diretores de Veja sejam pessoalmente intimados a cumprir a decisão de publicar a sentença, já que o processo está na fase final de execução.

Desta decisão, a Abril ajuizou uma Reclamação no STF, alegando que a corte distrital desrespeitou a declaração de inconstitucionalidade da Lei de Imprensa dada pelos ministros. Segundo ela, a condenação se baseou na lei extinta, e mesmo tendo transitado em julgado, não poderia mais ser cumprida. Atendendo ao pedido, em novembro o ministro Carlos Ayres Britto concedeu a liminar, e suspendeu a execução, até o julgamento de mérito do caso. A liminar foi questionada em Agravo de Instrumento do ex-secretário, considerado procedente no parecer da PGR.

Está na obrigação de publicar a sentença o centro da discussão. Segundo os advogados Alexandre Fidalgo e Claudia Pinheiro, do escritório Lourival J. Santos Advogados, apenas a Lei 5.250 obrigava expressamente a publicação, pelos veículos, de decisões condenatórias, como forma de reparação aos personagens expostos indevidamente. Já para a advogada de Eduardo Jorge, Ana Luisa Rabelo Pereira, do escritório Caldas Pereira Advogados e Consultores Associados, a publicação de sentença é uma obrigação de fazer determinada pelo juiz, e não precisa estar expressa em qualquer lei. Segundo ela, a ação jamais mencionou a Lei de Imprensa, fazendo menção somente à Constituição Federal e ao Código de Processo Civil, que prevêm responsabilização em caso de ofensa à imagem.

De acordo com a PGR, a decisão que a Editora Abril levou ao Supremo nada tem a ver com a Lei de Imprensa. “O único tema ainda objeto de discussão era o da necessidade ou não de intimação pessoal da reclamante para o cumprimento da obrigação, já assentada de modo definitivo, de publicar na revista impressa o conteúdo do julgado condenatório”, diz o procurador. “Nenhuma ofensa pode haver cometido a decisão reclamada, assim, aos termos do decidido por essa Corte Suprema na ADPF 130.”

Roberto Gurgel ainda menciou a Súmula 734 da corte, segundo a qual “não cabe Reclamação quando já houver transitado em julgado o ato judicial que se alega tenha desrespeitado decisão do Supremo Tribunal Federal”.

Clique aqui para ler o parecer.

Reclamação 9.362

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