Visão tributária

Projetos de lei exacerbam o poder do Fisco

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24 de março de 2010, 8h55

"Os agentes do Fisco poderão realizar constrições nos bens dos contribuintes, sem qualquer envolvimento do Poder Judiciário na lide, violando direitos constitucionais basilares, como o de garantia à proteção da propriedade e o acesso à Justiça". É o que avalia a presidente da Comissão Especial de Assuntos Tributários da OAB do Rio de Janeiro, Daniela Ribeiro de Gusmão, sócia do Leoni Siqueira Advogados, convidada para participar da comissão da OAB Federal contra as alterações do Código Tributário Nacional.

As mudanças estão previstas no PLP 469/09 (que propõe alteração complementar do Código Tributário Nacional) e os Projetos de Lei 5.080/09 (que trata da cobrança administrativa da dívida ativa da Fazenda Pública) e 5.982/09 (que versa sobre transação tributária). Se aprovadas, os procuradores da Receita Federal ganham novas atribuições para penhorar bens antes do ajuizamento da execução fiscal, sem necessidade de autorização judicial.

Daniela Gusmão explica que o arresto e a penhora de bens sem a interferência de um juiz, que é considerado um mediador, cerceiam o direito de defesa do contribuinte ao retirar da Justiça o seu dever de nortear a relação entre o cidadão e o Fisco. A patente redução das competências judiciais prevista nos projetos de lei é grave por dar acesso ao Fisco de todos os dados financeiros e patrimoniais dos contribuintes, sendo certo que os oficiais de Fazenda Pública terão poderes, inclusive, de arrombamento.

Ela avalia que a mudança pode trazer danos para o país ao entender quer o cerceamento de defesa aumenta a insegurança jurídica. A ausência de um Código Tributário que apresente regras claras pode se tornar uma barreira para atrair novos investimentos. “Hoje, o fomentador de riqueza e renda são os investidores”, endossa.

Com uma atuação intensa desde 2007, a comissão é também autora do Código de Defesa do Contribuinte que tramita na Câmara dos vereadores do Rio. Segundo a presidente, o conjunto de regras já obteve uma primeira aprovação, mas deve levar, em média, dois anos para entrar em vigor. O próximo passo é levar para âmbito estadual, e em seguida, federal. “O Código visa efetivar os direitos e deveres dos contribuinte e nortear a fiscalização”, explica.

“Os participantes da comissão são atuantes no mercado. Sabemos das dificuldades enfrentadas na prática pelos advogados e contribuintes”, observa. De acordo com Daniela Ribeiro, as regras e informações para um contribuinte que precisa fazer uma petição na Receita Federal são complexas e impossibilitam a defesa sem o auxilio de um especialista.

Um ponto de destaque foi a atuação da comissão contra a dificuldade enfrentada por advogados para retirar senhas na Receita Federal, o que só poderia ser feito pela internet. E ainda: o acesso do advogado aos autos. A Receita alegava, segundo a advogada, que a retirada de senhas e pedido de vista dependia de mais funcionários em seu quadro. “Se a Receita é competente para enviar 400 notificações, ela é obrigada a dar conta de 400 petições para defesa”, afirma.

A comissão encaminhou ofícios ao Secretário Estadual de Fazenda e ao Presidente do Conselho de Contribuintes do Estado com pedido de alteração do procedimento administrativo de acesso e obtenção de cópias de processo administrativo, por parte dos contribuintes e seus representantes, com vistas a dar efetividade aos artigos 5º, inciso LV, da Constituição Federal, e 25, da Constituição Estadual. Este ano, a comissão e representantes da Receita vão se reunir para solucionar as dificuldades.

Planos para o futuro
A presidente afirma que no mandato de 2010 pretende aprofundar a atuação da comissão ao apontar falhas nas rotinas e procedimentos pertinentes ao processo administrativo tributário. Disse também que está preparando outro projeto de Código de Defesa do Contribuinte, agora em âmbito estadual, que deverá implementar direitos e deveres já existentes em outros Estados e Municípios, mais céleres e pioneiros ao reconhecer e tornar eficazes os direitos da cidadania.

Para Daniela Ribeiro, se o Código for aprovado, o cidadão-contribuinte começa a ter uma relação de igualdade jurídica com o Fisco. “Afinal, o cidadão é contribuinte 24 horas de seu dia, 365 dias por ano. E a sociedade civil tem o direito de ver e sentir a ação estatal”, lembra. A Comissão vai ainda patrocinar a Representação de Inconstitucionalidade contra o protesto de Certidão de Dívida Ativa.

Alterada nesta quarta-feira (24/3) às 19h15 para correção de informações.

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