Acordo bilateral

Leia voto de Celso de Mello sobre a Lei de Anistia

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12 de maio de 2010, 7h11

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“O Congresso Nacional tinha, em 1979, a faculdade de estender o benefício da anistia às infrações penais de direito comum.” Com esse pensamento, o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, rejeitou, em seu voto no julgamento do pedido de revisão da Lei de Anistia, os argumentos da Ordem dos Advogados do Brasil. Segundo ele, as normas que proíbem o perdão de crimes como tortura e assassinato cometidos por agentes do Estado só começaram a vigorar no país depois da promulgação da Constituição Federal de 1988.

Para o ministro, a Lei 6.683/1979, que concedeu anistia a crimes políticos e conexos durante o período do regime militar então vigente, abrangeu “todos os delitos de qualquer natureza, desde que relacionados a crimes políticos ou cometidos com motivação política”. O argumento do Conselho Federal da OAB era de que crimes chamados “lesa-humanidade” não poderiam ser anistiados, com base em tratados internacionais a que o Brasil se submeteu. Se aceita, a tese da OAB permitiria que agentes públicos ainda fossem incriminados por torturas, sequestros, estupros e assassinatos cometidos contra militantes contrários à ditadura.

“A Lei de Anistia foi editada em momento que precedeu tanto a adoção, pela Assembleia Geral da ONU, da Convenção das Nações Unidas contra a tortura e outros tratamentos ou penas crueis, desumanos ou degradantes (1984), quanto a promulgação, pelo Congresso Nacional, em 1997, da Lei 9.455, que definiu e tipificou, entre nós, o crime de tortura”, diz o voto.

Celso de Mello não considera a norma uma auto-anistia do Estado, devido ao caráter bilateral da lei. Por ser uma espécie de acordo da sociedade civil com os militares, as alegações que se referiam a precedentes da Corte Interamericana de Direitos Humanos foram “inconsistentes”.

Segundo ele, não seria possível nem mesmo uma nova lei que revogasse a anistia concedida, “sob pena de a nova lei incidir na proibição constitucional que veda, de modo absoluto, a aplicação retroativa de leis gravosas”, afirma, referindo-se à proibição constitucional de que novas regras mais rígidas sejam aplicadas a crimes anteriores. A previsão está no artigo 5º, inciso XL, da Carta. “A nova Constituição do Brasil, promulgada em 1988, poderia (…) suprimir a eficácia jurídica que se irradiou da Lei de Anistia (…). No entanto, tal não se verificou.”

O ministro também rebateu o argumento de que os crimes não prescreveram. A OAB usou a Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes contra a Humanidade — a Convenção das Nações Unidas — para afirmar que as torturas nos porões da ditadura não poderiam prescrever. “Essa Convenção (…), adotada em 26/11/1968, muito embora aberta à adesão dos Estados componentes da sociedade internacional, jamais foi subscrita pelo Brasil”, afirmou Celso de Mello. Ele lembrou que só uma lei aprovada no Parlamento teria poder de alterar regras penais.

O voto, no entanto, lembra que a rejeição do pedido da OAB não impede “a busca da verdade e a preservação da memória histórica em torno dos fatos ocorridos no período em que o país foi dominado pelo regime militar”. No entanto, afirma que o direito “não depende da responsabilização criminal dos autores”.

Clique aqui para ler o voto.

ADPF 153

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