Crônica forense

A Justiça é composta também por dramas e histórias

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13 de junho de 2010, 6h05

A advogada Alexandra Lebelson Szafir lançou dia 31 de maio seu livro “Descasos – Uma advogada às voltas com o direito dos excluídos”. Escrito com o nariz, por causa da ELA, uma doença que como explica Alexandra Szafir “começou afetando minhas pernas, depois as mãos, os braços, as costas e, finalmente, a deglutição e a fala”, o livro é uma coletânea de histórias vividas durante quase duas décadas do exercício abnegado da profissão de advogada de defesa.

A obra possui dois méritos: o primeiro é o de escancarar as mazelas do nosso sistema penal e o segundo é o de ressuscitar um gênero esquecido na nossa literatura, a crônica forense. Neste último aspecto Alexandra Szafir ganhou lugar cativo na estante onde estão “Beca Surrada”, de Alfredo Tranjan, “Defesas que fiz no Júri”, de Dante Delmanto, “Reminiscências de um Rábula Criminalista”, do insuperável Evaristo de Moraes, sem falar dos obrigatórios “A defesa tem a palavra” e “Salão dos Passos Perdidos” do Ministro Evandro Lins e Silva e ainda o mais recente deles, “Nada mais foi dito nem perguntado”, do advogado Luis Francisco Carvalho Filho (se você lembrou também do John Grisham pedimos licença para parafrasear Veríssimo e implorar que pare imediatamente de ler este artigo).

A crônica forense deveria albergar mais prestígio do que vem recebendo ultimamente. É curioso como chegando à maturidade, os advogados preferem contar o que viveram em vez de fazer tratados sobre teses jurídicas. É porque sabem que as teses são indispensáveis ferramentas de trabalho, mas não é delas que é feita a justiça; a justiça é feita de seus homens e suas mulheres, sua gente, seus dramas e suas histórias, muito bem percebidas também em outras artes, como por Honoré Daumier na série “Les Gens de Justice”.

O esquecimento do cronista forense está de alguma forma relacionado com o descrédito atual da nossa Justiça. É como se a nossa Justiça, a cada dia mais técnica e professoral, tivesse perdido seu único elo com a sociedade, o seu interlocutor mais legítimo, o seu porta voz. Tradutor das simbologias e dos pormenores judiciais, coisa que Alexandra Szafir faz com maestria no livro “Descasos”, o cronista forense desmistifica a Justiça e seus protagonistas, percebendo a realidade que de fato importa por detrás dos complicadíssimos protocolos.

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