Os livros da vida do advogado Pedro Serrano
21 de julho de 2010, 18h34
O direito está no sangue da família Serrano. Filho de promotor e advogada, Pedro Estevam Serrano, advogado especialista em Direito Administrativo e Constitucional, passou a herança para seus quatro filhos. Dois deles já são formados e atuam na área Jurídica e outros dois ainda estão em formação.
Serrano é leitor assíduo e também fã de filmes sobre vampiros. “Gosto dos clássicos. Esses filmes sobre vampiros da saga Crepúsculo é muito sem graça, sem cor, nem emoção”, reclama.
Sua mãe sempre incentivou a leitura. O primeiro livro que leu foi Meu Pé de Laranja Lima, de José Mauro de Vasconcelos, "é um livro bem legal", diz. A obra retrata a história de um menino de cinco anos chamado Zezé, que pertencia a uma família muito pobre e numerosa. Zezé tinha muitos irmãos, a sua mãe trabalhava numa fábrica, o pai estava desempregado, e como tal passavam por muitas dificuldades.
Durante sua adolescência fez teatro. "Nessa época ajudei a dirigir uma peça sobre a obra O Mito, de Lauro Cesar Muniz. Esta foi uma época interessante da minha vida, mas ficou pra trás. Tive que me dedicar ao Direito. Essa área é como uma esposa. Não dá sossego", brinca.
Na mesma época, o advogado lembra que leu e gostou muito do livro Dom Casmurro de Machado de Assis, "que é, para mim, o maior escritor da literatura brasileira".
Segundo ele, o livro é um romance psicológico. A história se passa no Rio de Janeiro e narra a trajetória de Bentinho e Capitu. "É uma obra boa de ler porque é o próprio personagem (Betinho) que conta a história. Machado de Assis, em toda sua genialidade, cria um narrador que manipula o leitor a julgar se a traição foi real."
Para ele, é comum que o leitor tenha tendências a seguir por esta análise uma vez que este encontra nos personagens algum tipo de identificação e, é mediante esta reação, que Machado comprova a patologia psicológica que está sujeita a todo ser-humano: o ciúme.
Além de Machado, Serrano conta que outro livro que leu, e, que segundo ele, deve ser lido por aqueles que querem entender a vida contemporânea, foi a obra de Gabriel García Márquez, Cem Ano de Solidão. "O livro relata que uma população inteira perde a memória. Mulheres que se trancam por décadas numa casa escura. Homens que arrastam atrás de si um cortejo de borboletas amarelas. A obra foi lançada em 1967 e é tido como uma das obras-primas da literatura latino-americana moderna", esclarece.
O livro é excepcional, diz, porque mesmo com todos os personagens com a paixão à flor da pele e o realismo mágico de García Márquez a história brutal e às vezes inacreditável dos países latino-americanos não é diluida. "Ao contrário: só a torna mais viva."
Além dos romances, o constitucionalista é apaixonado por poesia. "Pablo Neruda é um dos autores que mais leio. Adoro as poesias épicas dele. Um livro muito bom é o Canto Geral, que se tornou um clássico não só da literatura hispano-americana, mas também da poesia universal do século XX. É uma obra atípica e representa uma reviravolta na poética de Pablo Neruda. O livro foi escrito quando Neruda, por ser membro do Partido Comunista, sofria forte perseguição pela polícia do presidente chileno González Videla, sendo obrigado a transpor a Cordilheira dos Andes e refugiar-se no exterior", explica.
"Além disso, o livro é de caráter enciclopédico, reúne os mais variados temas, gêneros e técnicas, dividindo-se em 15 seções e 231 poemas. O livro nasceu marcado pelo sofrimento, tendo o poeta testemunhado, por intermédio dele, o seu grande amor tanto pelo Chile e por seu povo, quanto pelos povos oprimidos da América Latina. É uma obra que une o combate e a ternura", lembra o advogado.
Dentre outros títulos de Neruda, o advogado também destaca que gosta de ler os sonetos camonianos dele que podem ser encontrados no livro Cem Sonetos de Amor. "Na obra é possível encontrar um soneto que ele fez para sua esposa. É simplesmente lindo", afirma.
Além de literatura, filmes e poesia, o advogado tem dedicado sua leitura aos livros sobre Direito. "Nessa área são livros importantes para quem quer estudar e entender sobre o Direito contemporâneo os livros: Teoria Pura do Direito, de Hans Kelsen, e O Guardião da Constituição, de Carl Shimitt", recomenda.
Hoje, além da leitura, ele tem como hobby viajar. "Para falar a verdade, eu prefiro as viagens. Adoro pescar. Sempre que posso e que tenho tempo viajo o mundo para pescar", declara.
"Mas é importante que se saiba que toda leitura é essencial. Independente do gênero. É imprescindível que da leitura se tire o ‘sumo’, a essência, da obra e se aplique no dia a dia. O que interessa é manter-se informado. No meu caso é indispensável a leitura", diz.
Pedro Serrano é sócio do escritório Tojal, Teixeira Ferreira, Serrano & Renault Advogados Associados. É mestre e doutor em Direito do Estado pela PUC-SP, é professor de Direito Constitucional, Fundamentos de Direito Público e Prática Forense de Direito Público. Foi procurador do estado de São Paulo e consultor especial da Câmara Municipal de São Paulo.
Além de ler, o professor também escreveu os livros Região Metropolitana e seu regime constitucional, O Desvio de Poder na Função Legislativa e em co-autoria Dez anos de Constituição.
Primeiro Livro
Literatura
Canto Geral, de Pablo Neruda, foi publicado em 1959 com cem sonetos relacionados ao romantismo e amor, divididos em quatro partes: Manhã, Meio-dia, Tarde e Noite, nas quais expressa todo o conteúdo da palavra amor. "Esse livro é muito bom, é um texto épico, mas leve de ler e entender", relata.
No drama Entre quatro paredes Jean Paul Sartre faz um jogo que envolve o leitor. "Ele coloca o desejo e o medo do nu nos personagens. Mas não é o nu físico que ele atinge, é o nu racional. É a hora em que os personagens abrem seus livros da vida e compartilham todas as maldades que já fizeram, todas as angústias que os atormentam. E assim, portanto, se apresentam nus para os outros. Esse desnudamento acontece após a morte dos personagens, que ao todo são quatro, três principais e um personagem secundário", revela Serrano.
Garcin era um literato, Inês era uma funcionária dos correios e lésbica e Estelle tem um complexo de aceitação, usa seu corpo em grande parte das situações. Eles são levados até uma sala fechada e terão que permanecer para sempre ali, enclausurados, condenados a uma vida sem interrupção. Eles têm somente a companhia do outro. Sentados nos únicos canapés eles começam a convivência eterna, crucial.
Segundo o entrevistado, nesse drama quebra-se o estereótipo do demônio com chifres, com cauda, com garfo, atirando fogo. "Sartre coloca cada um dos personagens como carrasco do outro, buscando desnudá-los, buscando o que há por trás dos rostos. E acontece a prova de que o ser humano necessita da comunicação, mesmo sabendo que esta será seu inferno."
O estrangeiro, de Albert Camus, é a história de um argelino que trabalha num escritório em Paris e, em decorrência de circunstâncias absurdas, mata um árabe. No último momento de sua condenação desperta de uma espécie de torpor. "Acredito que o livro mais famoso de Camus, é um romance bem interessante", lembra.
Li e recomendo
Na filosofia, afirma Serrano, Zizek faz um apanhado teórico de seus livros anteriores, relacionando conceitos de Lacan, Hegel e Marx. No campo da ciência, o esloveno enfatiza questões levantadas pela neurologia e as ciências cognitivas, além de aprofundar suas reflexões sobre a estrutura do sujeito a partir de seus estudos de psicanálise. E em relação à política, Zizek desenvolve a ideia de que o reconhecimento de antagonismos na ordem social constitui tarefa maior de nossos tempos.
Livros Jurídicos
"Nessa obra, Kelsen não considera o conteúdo ou finalidade das normas jurídicas, separando a ciência jurídica (e não o Direito) da moral, justiça e demais ciências, como a sociologia. Essa separação e estabelecimento autônomo da ciência jurídica ante outras ciências é o princípio metodológico fundamental pelo qual a ciência jurídica, como uma teoria pura, irá única e exclusivamente conhecer seu objeto: a norma jurídica", explica.
Kelsen não reduz o Direito à ciência jurídica e, muito menos, à norma jurídica. "Isso fica claro com uma leitura atenta dos seus textos. Uma leitura atenta à primeira página de seu famoso livro Teoria Pura do Direito explicita claramente a distinção entre ciência jurídica e Direito."
"Em O Guardião da Constituição, Carl Schmitt não confere a um Tribunal Constitucional o exercício do controle de constitucionalidade, por transferir poderes de legislação para o Judiciário, politizando-o e desajustando o equilíbrio do sistema constitucional do Estado de Direito", diz.
É assim que, segundo Schmitt, a revisão dos atos legislativos por um tribunal independente é uma afronta clara à soberania. A partir deste livro é suscitada a controvérsia sobre a legitimidade e limites da jurisdição constitucional, bem como qual deve ser o papel das Cortes Constitucionais.
Albert Camus, Gabriel García Marques, Jean Paul Sartre e junto com eles Machado de Assis servem de norte para quem quer entender o mundo psicológico, poético e o capitalismo, de acordo com Pedro Serrano.
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