Publicidade de refrigerantes

Limites impostos pela Anvisa despertam oposições

Autor

  • Uarian Ferreira

    é advogado titular do escritório Uarian Ferreira Advogados Associados SS pesquisador e estudioso da utilização de títulos antigos.

15 de julho de 2010, 15h52

Em 22 de abril a Associação Nacional para Defesa da Cidadania, Meio Ambiente e Democracia (Amarbrasil) protocolizou na Justiça Federal em Brasília Ação Civil Coletiva contra a União e Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) pedindo a concessão de medida liminar para que no prazo de noventa dias apresentassem proposta ou plano para impor às indústrias, distribuidores e vendedores de refrigerantes e similares a obrigação de advertir o consumidor — especialmente o consumidor infantil e adolescente — para os riscos quanto ao consumo excessivo do produto, tanto nos rótulos e embalagens dos produtos quanto no material publicitário veiculado em rádio, televisão e impressos.

Em sentença definitiva foi pedida a fiscalização e controle sobre a publicidade e oferta de refrigerantes ao consumidor brasileiro: a) de inserir nos rótulos de seus produtos e em suas peças publicitárias, virtuais, televisivas, radiofônicas a advertência ao consumidor com os seguintes textos: — “o consumo excessivo deste produto pode causar obesidade, câncer de pâncreas, osteoporose e problemas dentários” — “Não substitua o consumo diário de água por este produto”; b) de indicar nos vasilhames, em letras legíveis e destacadas, a quantidade diária máxima de consumo recomendada do produto, conforme a faixa de idade do consumidor; c) de oferta de refrigerantes em vasilhames que restrinjam o consumo excessivo, limitando a 1,5 Litro — ou seja, um litro e meio — a quantidade máxima de refrigerante oferecido por vasilhame ao consumidor brasileiro.

A juíza Maria Cecília de Marco Rocha, da 6ª Vara, recebeu a Ação (autos 19645-79.2010.4.01.3400) e mandou intimar a União e Anvisa para no prazo de 72 horas manifestarem-se sobre o pedido liminar. Intimada, a resposta chegou rápido. Em 15 de junho a Diretoria Colegiada da Anvisa decidiu e o presidente, Dirceu Raposo de Melo, assinou a Resolução 24, cujo artigo 6º é uma literal resposta ao pedido — não só da liminar, mas de quase todo o mérito.

A Resolução foi publicada no Diário Oficial no último dia 29 de junho. No dia 7 de julho a Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e Bebidas Não Alcoólicas (ABIR), Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação (ABIA) e mais outras nove associações e federações de publicidade, anunciantes, outdoor, e TV por assinatura fizeram publicar em todos os jornais do país uma declaração intitulada Em Defesa Do Estado Democrático, condenando a Resolução.

O argumento é de que a Resolução ofende o artigo 22, XXIX da Constituição, “que compete à lei federal dispor sobre propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde.”

“Não seria exagero dizer que o jurista quanto mais se aproxima do fenômeno publicitário, quanto mais imagina conhecê-lo e dominá-lo, mais longe está de compreender a sua real dimensão e, mais do que tudo, os riscos variados que traz para o consumidor, como o agente econômico (o bolso), mas, principalmente, como ser humano (a dignidade).” A observação é do ministro Antônio Herman V. Benjamin, ainda procurador de justiça de São Paulo, na apresentação da 1ª edição de um livro que deveria ser de cabeceira de todos quantos lidam com publicidade: A Publicidade Ilícita e a Responsabilidade Civil das Celebridades que dela Participam, do professor e mestre em Direitos Difusos, Paulo Jorge Scartezzini Guimarães.

Com todo e máximo respeito pelas entidades signatárias do referido manifesto, na citada Resolução o Conselho Diretor da Anvisa e o seu Diretor-Presidente nada mais fizeram do que dar uma resposta a uma ação judicial, eximindo-se das responsabilidades, como gestores de saúde pública, de ações que poderiam lhes recair no futuro.

O consumo excessivo de refrigerantes — especialmente pelo consumidor infantil e adolescente — se revela nocivo à saúde da população em geral, com elevação dos gastos do Poder Público com serviços de saúde, representando uma ameaça silenciosa à saúde de todos os consumidores e às gerações futuras. É fato que a todos aflige.

Foi com base no artigo 102 do Código de Defesa do Consumidor e nos artigos 6º, 196, 197 e 200, VI da Constituição da República, pelos quais a saúde é direito de todos e dever do Estado, a mesma invocada pelas associações de publicidade na intitulada declaração Em Defesa do Estado Democrático, que a Amarbrasil buscou junto ao Poder Judiciário a providência tomada na Resolução 24/2010 pela Anvisa, que nunca foi e nem pode ser da competência do Conselho de Autorregulamentação Publicitária (Conar).

A ação formulada pela Amarbrasil — que não aceita doações públicas e é uma entidade de representação eminetemente civil — não tem o intuito de reprimir ações publicitárias ou coibir o consumo de refrigerantes, tampouco “ditar” o que deve ou não o cidadão fazer. Ela busca a proteção dos consumidores para que o Poder Público tome medidas que possam informar o cidadão sobre aquilo que consome, seus riscos e a quantidade segura de consumo para uma vida saudável.

Mais ainda, a ação visa reduzir para o Estado Brasileiro e para o Serviço Público de Saúde os gastos advindos dos tratamentos relacionados à obesidade, osteoporose, pressão arterial, cárie dentária, etc. Garantir gerações de brasileiros saudáveis.

A declaração, uma inequívoca demonstração de poder que o consumidor jamais terá de forma tão organizada, no entanto, teve seu lado positivo: a identificação de litisconsortes, que desde o início da ação imaginavam-se necessários.

Diante do público e identificado interesse das signatárias contra a Resolução 24/2010, admissível a inserção de todas como necessárias litisconsortes no polo passivo da Ação Civil Coletiva, juntamente com Anvisa e União. Aliás, de dizer, que o processo é o mais adequado e o mais democrático dos ambientes para o conhecimento dos interesses, exercício dos contraditórios e do amplo direito de defesa.

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