Dedo do acusador

Assistente de acusação não substitui o promotor

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10 de julho de 2010, 9h40

O assistente de acusação só poderá recorrer de uma decisão se o Ministério Público não tiver tomado nenhuma atitude. Entretanto, se o MP se manifestou em favor do réu, pedindo sua absolvição por falta de provas, não cabe ao assistente questionar o resultado. O entendimento é do desembargador Paulo Rangel da 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Com base nesse entendimento, o colegiado manteve a absolvição do policial militar Marcos Parreira do Carmo acusado pela morte do estudante Daniel Duque durante um tumulto em uma boate no Rio de Janeiro.

O réu foi pronunciado e levado a julgamento no Tribunal do Júri acusado de ter atirado no estudante. Por entender que os depoimentos das testemunhas não eram suficientes para condenar, o promotor Marcelo Rocha Monteiro pediu a absolvição do réu. Insatisfeita com o resultado, a mãe da vítima, a designer Daniela Duque, que atuou como assistente de acusação, apelou para anular o julgamento, alegando que o resultado do júri era manifestamente contrário às provas.

O pedido da assistente de acusação foi acolhido e feito um novo julgamento que teve um desenvolvimento e um desfecho semelhante: novamente o promotor pediu a absolvição do réu por insuficiência de provas, os jurados votaram pela absolvição e a assistente de acusação fez novo apelo. Alegou a suspeição do promotor, que segundo ela, é seu inimigo pessoal.

Atuação subsidiária
Para o relator Paulo Rangel, o assistente de acusação, como o próprio nome revela, deve ter uma atuação “supletiva, subsidiária, secundária, ou seja, surge sempre quando o MP não faz o que deveria fazer”. Dessa forma, ele não conheceu do recurso por falta de admissibilidade, “inércia do Ministério Público a justificar a atuação da assistente de acusação”.

O pedido de absolvição feito pelo MP no Júri, já demonstra que o órgão se manifestou, e assim, “não cabe recurso do assistente de acusação, porque a parte principal agiu, isto é, não ficou inerte”, diz o voto. De acordo com Rangel, “o assistente é parte acessória, e o MP é a parte principal”.

“Aqui aplica-se o brocardo Accessorium sequitur principale: o acessório segue a sorte do principal. Seria um contrassenso os jurados ouvirem o promotor (Estado-administração), parte principal, pedir a absolvição por ser medida de justiça, diante do caso concreto, e ouvir, logo após, o assistente (particular), parte acessória, pedir a condenação.”

Ao nomear a situação de “esdrúxula” o desembargador diz que a apelação mostra que os papéis foram invertidos. “Foi um caso típico em que o acessório agiu como principal. Daí não me surpreender com a decisão dos jurados”, comenta.

"O particular não pode (e não deve) ocupar o lugar do Ministério Público e este não pode (e não deve) abrir mão de suas funções, sob pena de perder espaço no cenário jurídico e repristinarmos o sistema acusatório privado romano.”

Conforme o artigo 598 do Código de Processo Penal, nos crimes de competência do Tribunal do Júri, ou do juiz singular, se da sentença não for interposta apelação pelo Ministério Público no prazo legal, o ofendido ou qualquer das pessoas enumeradas no artigo 31, ainda que não se tenha habilitado como assistente, poderá interpor apelação, que não terá, porém, efeito suspensivo.

Rangel ressalta em seu voto que não adota a tese de que o assistente de acusação não foi recepcionado pela Constituição, questão alvo de inúmeras polêmicas. “Não é essa a questão. O caso presente é de preencher os requisitos do artigo 598 do CPP, dentre eles a inércia ministerial”, endossa. Tanto existe essa possibilidade que é inclusive questão firmada na súmula 210 do Supremo Tribunal Federal.

O magistrado lembra também que o assistente de acusação é legítimo para abrir uma Ação Penal Pública no lugar do MP, de acordo com a Constituição, no artigo 5º, inciso LIX.

O desembargador aponta que a apelação é um erro na medida em que tenta uma reparação cível gera uma situação que prejudica a persecução penal. E que para isso, seria necessário percorrer a via da Justiça Cível. Por fim, Paulo Rangel rejeitou a apelação por ausência de um requisito de admissibilidade.

Histórico
Na noite do crime, Marcos Parreira do Carmo fazia a segurança de Pedro Velasco, filho da promotora Márcia Velasco. A saída da Boate Baronetti, dois grupos de rapazes se envolveram numa briga. O PM sacou da arma e deu três tiros. Daniel Duque foi atingido e morreu. O PM disse que agiu em legítima defesa e que Daniel teria tentado tirar a arma da sua mão, provocando o disparo.

Leia aqui o voto do desembargador Paulo Rangel.

Processo: 0166606-35.2008.8.19.0001

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