LIVRO ABERTO

A biblioteca básica do advogado Lourival J. Santos

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27 de janeiro de 2010, 7h50

Lourival J. Santos - SpaccaSpacca" data-GUID="lourival_santos.jpeg">Os livros começaram a fazer parte cedo da vida do advogado Lourival J. Santos, que mantém um escritório especializado em Direito Empresarial e casos de imprensa. O primeiro contato com a literatura veio do trabalho de sua mãe. Morando na fazenda, ela dava aulas de alfabetização e lia clássicos aos trabalhadores e vizinhos dos arredores. Tanto Lourival, quanto os cavaleiros que passavam, ouviam atentamente clássicos como O Conde de Monte Cristo, de Alexandre Dumas ou O Tronco do Ipê, de José de Alencar.

Formado pela Universidade São Francisco, aluno de Goffredo da Silva Telles Júnior e de Teófilo Cavalcante, se viu ainda mais interessado pelos livros quando foi decretado o AI-5, que proibia o acesso à informação. “Era uma contradição. Tínhamos aula sobre os grandes clássicos do Direito e, na prática, não tinha aplicação em seu próprio país”, lembra o advogado.

Lourival mantém seu escritório há 12 anos, depois de ter exercido o cargo de diretor jurídico na Editora Abril, quando despertou nele o interesse por discussões envolvendo a imprensa. Hoje, é também diretor jurídico da Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner), filiada a Fèdèration Internationale de la Presse Pèriodique (FIPP), é conselheiro da Associação Nacional de Editores de Publicações (Anatec) e conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp).

Primeiro livro

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Jucapirama - Reprodução

Pela sorte de ter a mãe professora e dedicada à literatura, Lourival diz ter um gosto natural pela leitura. “Ela era bastante culta para a época e para uma professora. Desde cedo, tive muito contato com livros. Ela alfabetizava adultos e empregados de outras fazendas e havia um dia da semana para leitura de romances”, conta.

Sua primeira lembrança é da coleção de Monteiro Lobato e outros clássicos da poesia e prosa brasileira, como Castro Alves, Álvares de Azevedo, Fagundes Varela e Gonçalves Dias. “Eu sabia de cor Juca Pirama, de Dias”. Gibis como Cavaleiro Negro, Fantasma, Pato Donald, entre outros heróis, fizeram parte da infância de Lourival. Ele confessa, ainda, ter acesso às revistinhas eróticas “do então proibidíssimo Carlos Zéfiro, que circulavam, misteriosamente, entre a molecada”.

Literatura
Desde que começou a ler, Lourival tentou devorar os romances que passavam na sua frente. “No ginásio, eu já tinha lido bastante”. Ele destaca a aventura Um certo capitão Rodrigo, de Érico Veríssimo, e Primeiras Estórias, de Guimarães Rosa, publicada logo após a morte do autor.

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Um Certo Capitão Rodrigo - Reprodução

A lista de autores preferidos passa por Eça de Queiroz, Machado de Assis — em todas as suas fases — a poesia de Fernando Pessoa e Carlos Drummond de Andrade. Ele também cita entre os preferidos James Joyce, Graciliano Ramos e Clarice Lispector. Na literatura internacional, Dostoweski e Kafka.

Vida jurídica
Na faculdade de Direito, no Largo de São Francisco, Lourival conta que teve a sorte de estudar no final de 68, com os professores Goffredo da Silva Telles Jr, Teófilo Cavalcante e Basileu Garcia. “Foi quando entrou em vigor o AI-5, que tolheu toda a liberdade que tínhamos. Um dos atos mais insanos promulgado no país”, afirma. Para o advogado, o fato só aguçou a curiosidade de todos os estudantes para ler e saber mais.

Além das próprias obras publicadas por Goffredo e Miguel Reale, na lista dos clássicos está A Luta pelo Direito, do alemão Rudolf Von Ihering. “É uma monografia que fala sobre a finalidade do Direito e que a paz e o caminho é a luta pelo direito”. Segundo Lourival, nele, o direito não é considerado como pura teoria, mas como uma força viva, que deverá ser exercida em busca do equilíbrio e da paz. “A paz é o fim que o direito tem em vista, a luta é o meio de que se serve para o conseguir”, cita um trecho do livro.

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a luta pelo direito 2 - Reprodução

Quando soube que Rui Barbosa contestou uma tese francesa mundialmente conhecida, Lourival correu para ler Cartas da Inglaterra. O livro não considerado uma obra jurídica traz a coletânea de artigos escritos pelo autor, durante o tempo em que esteve exilado na Inglaterra. O texto mais importante para Lourival é o artigo redigido em defesa do Capitão Dreyfus, condenado injustamente pela Justiça francesa. “O importante é que a defesa de Rui antecedeu a mundialmente conhecida ‘J’accuse’ de Émile Zola, sobre o mesmo tema”, conta Lourival. “Rui critica a fragilidade das instituições francesas em comparação com as inglesas".

Outra obra considerada primorosa por Lourival é a A Hermenêutica e Aplicação do Direito, de Carlos Maximiliano. “Ele dá uma perspectiva de como o direito deve ser estudado, interpretado de uma forma sensata e equilibrada. Vemos aplicações de forma errônea, em razão de “pseudas contradições”, encontradas por quem não interpreta corretamente”.

Li e recomendo
Se a mãe o apresentou aos clássicos, hoje quem lhe traz novidades é o seu filho, formado em Literatura. Um deles é o Mayombe, do escritor angolano Artur Pestana, conhecido por Pepetela. Nas obras, Pepetela, militante do movimento pela libertação de Angola, retrata sua vida guerrilheira nos anos 70. “Ele fala muito da revolução, do sentimento do povo angolano, dá uma demonstração muito clara de como o povo angolano sentiu e sofreu durante todos os anos de Guerra Civil”.

Lourival mantém à cabeceira as obras de Miguel Reale e lembra de outras obras preferidas que indica aos leitores. Angústia, de Graciliamos Ramos, é um clássico para o advogado. “É um livro sobre angústia no seu caráter mais profundo. O que ela pode levar o ser humano. O desequilíbrio que esse sentimento pode levar”. E também, Sagarana, de Guimaraes Rosa, “pela minha ascendência caipira”. Lourival é de Brotas, interior de São Paulo.

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Berlin - Alexander Platz - Reprodução

Ele destaca também Berlin Alexanderplatz, de Alfred Doblin, alemão de origem judaica. “A obra de 1929 mostra a Alemanha fragilizada pela primeira guerra, fala sobre o povo alemão e o problema político e social da época. Dá para entender o porquê da instalação de regimes populistas”.

Música
Lourival gosta de música. Desde bossa-nova, jazz, samba e rock (antigo) até música clássica e moda de viola, legitimamente brasileira, Chico Buarque e Caetano. “Sou metido a tocador de violão e procurava imitar os sambas do Chico na época da faculdade”. Para citar uma música, prefere O quereres, de Caetano, cantado por Maria Bethânia. “Gosto muito da Bethania como cantora. Acho que é uma voz fantástica”.

Mas, seu número 1 mesmo é Tom Jobim. Sobre o músico, Lourival tem uma história marcante, quando conheceu sua mulher, em Tatui (SP). Ela, advogada de São Paulo, viajou para o interior para cantar em um coral. Depois da apresentação, ele foi passar a tarde na fazenda do desembargador Manuel Augusto Vieira Neto, hoje aposentado. Lourival perdeu no jogo de poker e ganhou como consolação o livro Primeiras Estórias, de Guimarães Rosa, que tinha como prefácio um poema falando da morte do autor “um chamado João”, que era um dos preferidos de Jobim.

Filme
“Os filmes marcam dependendo do tempo em que você os assiste”, afirma Lourival. Na sua adolescência, era os westerns que o marcavam. Nos tempos de hoje, o último que mais lhe impressiona é o Fale com Ela, do espanhol Pedro Almodovar. “Houve uma a prova da comunicação pela energia, pela sensibilidade. Uma mulher sem nenhum movimento em uma história de amor”.

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Fale com ela - Reprodução

Outro de sua preferência é a trilogia do Poderoso Chefão. Os filmes narram a saga de uma família mafiosa. “A trilogia demonstra com muita técnica um problema social. A meu ver, em realidade, retratam a filosofia da sociedade político-capitalista, na qual a luta pelo poder tende a justificar os meios delituosos percorridos, tantas vezes, para atingi-lo”.

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