Consequência da mudança

Competência absoluta de Juizado pode não resolver

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24 de janeiro de 2010, 7h55

Recentemente, o presidente do Senado Federal emitiu o ato número 379/2009 que criou uma comissão de juristas com a função de elaborar o anteprojeto do Novo Código de Processo Civil. Tal iniciativa foi um reflexo da assinatura do II Pacto Republicano em que restou firmada a meta de uma Justiça mais acessível, ágil e efetiva.

Esta comissão possui como seu presidente o ilustre ministro do Superior Tribunal de Justiça Luiz Fux e como sua relatora a brilhante jurista Teresa Arruda Alvim Wambier, dentre outros nomes de grande respeito na doutrina processualista pátria.

Depois de algumas reuniões, esta comissão já elencou uma série de proposições sobre os principais temas, e as alterações que devem ser observadas antes que seja elaborada a primeira redação dos dispositivos.

Chamou-nos a atenção, dentre outros tópicos a alínea “f”, item 3 , onde restou firmado o seguinte verbete:

f) Estabelecer a competência absoluta dos Juizados Especiais.

Independentemente do fato de não existir ainda o dispositivo que venha regulamentar tal tema, se tratando apenas de suposições sobre esta redação, ainda sim é extremamente importante fazer algumas reflexões sobre as conseqüências deste novo posicionamento a ser adotado já no anteprojeto.

Basta uma simples análise para perceber que hoje em dia os Juizados Especiais já não suportam mais as demandas que lhes são confiadas, chegando ao absurdo de um processo tramitar mais rápido em uma vara comum do que em um juizado.

Consignar a competência absoluta é declarar morte a um sistema que está prestes a falência, pela falta de estrutura, ausência de material de expediente e pessoal qualificado para as demandas que crescem em progressão geométrica.

Diante da descentralização dos juizados pelas cidades, cada magistrado titular dos mesmos se julga competente o necessário para estabelecer as suas próprias regras processuais, cerceando desde prerrogativas dos advogados, quanto o direito dos jurisdicionados, criando “entendimentos” que estão fora de qualquer diploma legal.

Como exemplo claro disso temos a atermação dos Juizados, local onde o funcionário da Justiça colhe informações dos tutelados que não estão assistidos por advogados para que assim possa se redigir uma inicial. Atualmente, este local se tornou em ponto de triagem de processos, onde por orientações do próprio magistrado (com o único fim de diminuir as demandas a serem julgadas, buscando melhores estatísticas a serem apresentadas) o funcionário já define se aquela causa é plausível ou não, “sentenciando” o caso antes mesmo da apreciação do juiz, e negando expressamente o acesso à Justiça.

Neste diapasão refletimos sobre a imensa quantidade de sentenças reformadas pelas turmas julgadoras, o que nos leva a crer que tais “sentenças de atermação” podem não ser as mais sensatas, podendo assim ter prejudicado inúmeras pessoas.

Instituir competência absoluta significa retirar do tutelado a possibilidade de discutir seu problema com uma gama maior de instrumentos, até mesmo porque sabemos das dificuldades e fragilidade do sistema recursal nos Juizados Especiais.

Outro ponto que merece uma discussão mais profunda com a participação da OAB será sobre os reflexos desta competência absoluta, que acarretarão na total desnecessidade de assistência de advogado para pleitear todo e qualquer tipo de causas abaixo de 20 salários mínimos.

A Lei 9.099/95 trouxe essa possibilidade aos tutelados pelo fato de definir que seriam causas de menor complexidade, mas agora a competência será absoluta. Teremos pessoas com causas complexas, que não extrapolam os 20 salários mínimos, e que terão a possibilidade de buscar a tutela jurisdicional sem advogado. Torna-se clara aqui mais uma vez a mitigação da função constitucional do advogado.

As mudanças no diploma processual civil são realmente necessárias a fim de possuirmos uma Justiça ágil. Mas isso não significa que devemos sacrificar princípios e os direitos configurados no próprio direito material.

Infelizmente, observamos a tendência do Judiciário brasileiro em apresentar números, estatísticas, como sendo a forma mais “fácil” de provar certa produtividade para sociedade, o que todos os operadores do Direito sabem que não é a melhor saída para este sistema que está a beira de um caos.

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