Novo modelo

TJ de São Paulo estuda forma de pagar precatórios

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15 de fevereiro de 2010, 7h20

Em São Paulo, se tudo der certo, o novo modelo de pagamento de precatórios só vai se tornar realidade daqui a seis meses. Até lá, fica difícil responder quem são os idosos e pessoas com doenças graves que devem receber primeiro os créditos alimentares ou quais os critérios para o credor participar de um leilão ou de um encontro de conciliação, como prevê desde dezembro a Emenda Constitucional 62. Sem essa lista, os devedores podem até depositar o dinheiro, mas o Tribunal de Justiça — que se tornou o centralizador dos pagamentos — não saberá para quem distribuir.

Há uma necessidade urgente de se unificar e padronizar o sistema de dados, ao menos em nível estadual, para que a emenda seja cumprida. Hoje, as informações estão espalhadas pelos diferentes sistemas de cada um dos municípios, autarquias e INSS. Reunir os valores devidos e os credores em uma só lista é imprescindível, mas também complicado. Outra dificuldade será o cálculo do valor de cada precatório. A partir de dezembro de 2009, a correção deve ser feita pelo índice da poupança mais juros simples. Antes dessa data, a correção, no entendimento do TJ paulista, será nos termos fixados na sentença.

Advogados compartilham desse posicionamento do TJ, de acordo com o advogado Flávio Brando, presidente da Comissão de Precatórios da OAB-SP. Se o Supremo Tribunal Federal considerar constitucional a Emenda 62, na Ação Direta de Inconstitucionalidade apresentada pelo Conselho Federal da Ordem, essa seria uma forma justa de pagamento, ressalta Brando.

Informatização e recálculo
Como implementar a mudança é uma pergunta que está tirando o sono do desembargador Venício Salles, que além de ser diretor da Diretoria de Execução de Precatórios do tribunal (Depre), continua julgando os seus processos na 12ª Câmara de Direito Público. Dentro de uma semana ele pretende receber o programa usado pela Procuradoria do Estado, que é compatível com o do TJ, para unificar e padronizar todas as informações recebidas. É a partir daí que o trabalho, de fato, começa. O desembargador já se reuniu com a OAB, com a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e com a Procuradoria do Estado para discutir a questão.

Ele explica uma das dificuldades: antes da Emenda 62, o controle do pagamento e dos precatórios em aberto era feito anualmente. Com a emenda, terá de ser mensal e o Judiciário passa a centralizar os pagamentos. “Imagine o tamanho do desafio!”, diz.

A Emenda 62 prevê que, fora o dinheiro destinado aos idosos e pessoas com graves enfermidades, 50% do orçamento mensal serão destinados para o pagamento da lista de credores organizada por ordem cronológica. Os outros 50% serão negociados em leilões ou câmaras de conciliação ou usados para pagamento por ordem de valor, do menor para o maior. Cada um dos estados e dos municípios do país terá de decidir, individualmente, qual a forma que prefere pagar e editar um decreto para isso. Os Tribunais de Justiça, ao refazer o cálculo feito pelos entes devedores, terão de levar em conta essas diferenças, o que pode atrasar ainda mais o pagamento.

Outro problema enfrentado em São Paulo é o tamanho da equipe que vai compor a Depre. A diretoria chegou a ter 300 contadores. Hoje, só tem 150 para cuidar do pagamento de todos os precatórios no estado. O desembargador Venício Sales, diretor da Depre, conta que esse problema deve ser solucionado em breve, mas não sabe ainda se com a convocação de funcionários de outros setores, com a abertura de um concurso ou com terceirização. Segundo ele, a Secretaria da Fazenda de São Paulo tem um setor terceirizado com o mesmo objetivo.

Controle judicial
“Essa é uma questão muito importante para o Judiciário. O nosso descrédito passa pela questão de julgar e não fazer concretizar as nossas decisões”, analisa Salles. A situação caótica encontrada, depois de duas moratórias inclusive, passa pela desvalorização das sanções, segundo o desembargador.

Venício Salles conta que pretende acabar com as discussões judiciais depois do pagamento do precatório. Antes da emenda, eram os próprios devedores que faziam os cálculos do débito e depositavam o valor para o credor. Com isso, novos conflitos judiciais são gerados para contestar o valor e pedir o pagamento da diferença. A partir da Emenda 62, o devedor continua fazendo o cálculo, mas o Tribunal de Justiça vai conferir os valores e só depois determinar a quitação do débito. Essa medida pretende acabar de vez com o processo.

CNJ
As alterações no sistema de pagamento dos precatórios, alvo de polêmicas e protestos no país, chamaram a atenção do Conselho Nacional de Justiça. O Conselho decidiu regular a gestão dos precatórios no âmbito do Poder Judiciário e instituiu o Sistema de Gestão de Precatórios. Em entrevista à equipe do Anuário da Justiça 2010, o ministro do Tribunal Superior do Trabalho Ives Gandra Filho, que coordena esse trabalho no CNJ, disse que a intenção é fazer o mapeamento dos precatórios no país. “Com isso, poderemos ter um controle no pagamento dos precatórios e ajudar para que os pagamentos sejam feitos”, explicou.

O sistema está sendo implantado com informações sobre o tribunal, o número do processo, o trânsito em julgado das decisões, o valor do precatório, data de atualização do cálculo e a entidade pública devedora. O CNJ fará um mapa anual sobre a situação dos precatórios com divulgação pela internet. Os tribunais poderão instituir juízo auxiliar de conciliação de precatórios para buscar acordo entre as partes.

Constitucionalidade
O Supremo Tribunal Federal ainda precisa julgar a Emenda Constitucional 30, de 2000, que parcelou em 10 vezes o pagamento dos créditos não alimentares. Falta o voto do ministro Celso de Mello para que a corte decida sobre o pedido de suspensão da regra. A decisão pode ser um indicativo de como os ministros vão votar ao analisar a ADI que contesta a EC 62, que parcela em até 15 vezes o pagamento, além de acabar com o critério único, que era o cronológico. Leilões, conciliação e pequenos valores são novas formas de o Estado quitar a sua dívida.

Os ministros estão divididos no caso, que envolve um pedido de cautelar em ADI (ADIs 2.356 e 2.362). Uma parte entende que a EC 30 interfere na coisa julgada ao reformular a forma de pagamento prevista em sentença. O outro grupo de ministros diz que o periculum in mora, usado como argumento para a concessão da cautelar, já perdeu o objeto uma vez que o pedido foi feito em 2002. O ministro Dias Toffoli, por exemplo, na sessão que aconteceu na última terça-feira (10/2), discordou da afirmação de que a emenda interferiu na coisa julgada. Para ele, trata-se de uma questão administrativa.

Na ADI em que o Conselho Federal questiona a Emenda 62, o relator, ministro Carlos Britto, determinou que todos os Tribunais de Justiça do país informem os valores pagos em precatórios (alimentares e não alimentares) e requisições de pequeno valor (RPVs) pelos estados e capitais nos últimos 10 anos. A determinação, do dia 5 de janeiro, se estende a todos os Tribunais Regionais do Trabalho. O ministro pediu, ainda, informações sobre o montante da dívida pendente de pagamento inscrita em precatórios.

O Tribunal de Justiça de São Paulo já enviou comunicado a todas as prefeituras, autarquias, INSS e demais devedores pedindo esses dados. O prazo é de 30 dias, contados a partir de 1º de fevereiro.

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