RETROSPECTIVA 2010

O ano foi de fortalecimento da arbitragem no Brasil

Autores

  • Eleonora Coelho

    é sócia do Castro Barros Sobral Gomes Advogados graduada pela Faculdade de Direito da USP mestre em Arbitragem Contencioso e Modos Alternativos de Solução de Controvérsias pela Universidade Paris II e Vice-Presidente do Comitê Brasileiro de Arbitragem (Cbar).

  • Marina Chierighini

    é advogada do Castro Barros Sobral Gomes Advogados e graduada pela Faculdade de Direito da USP.

15 de dezembro de 2010, 13h40

Este texto sobre Arbitragem faz parte da Retrospectiva 2010, série de artigos sobre os principais fatos nas diferentes áreas do Direito e esferas da Justiça ocorridos no ano que termina.

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Dra Marina Chierighini - Spacca - Spacca

O ano de 2010 consagra-se como de notável importância na consolidação da arbitragem no país, revelando não apenas um crescente fomento da atividade acadêmica e do número de procedimentos arbitrais em curso, como uma louvável cooperação do Poder Judiciário, que demonstra, progressivamente, o seu respaldo ao instituto.

De fato, o Brasil tem despertado o interesse de renomadas instituições acadêmicas, câmaras arbitrais, profissionais e escritórios de advocacia estrangeiros dedicados à prática arbitral, assim como de empresas dos variados ramos da economia, que passam a vislumbrar no país cada dia mais um campo fértil para o desenvolvimento da arbitragem, bem como um ambiente seguro e confiável para conduzir procedimentos arbitrais.

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Eleonora Pitombo - Spacca - Spacca

Exemplo recente de rica produção acadêmica em matéria de arbitragem no Brasil é a pesquisa acerca da relação entre a Arbitragem e o Poder Judiciário realizada em parceria pelo Comitê Brasileiro de Arbitragem – Cbar e a Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas – FGV, cujos dois primeiros relatórios foram publicados em maio deste ano. A pesquisa é uma enorme contribuição acadêmica para o instituto, uma vez que contemplou amplo exame de decisões proferidas pelos principais tribunais brasileiros entre 1996 e 2008, abordando temas como os de (i) existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem, (ii) ações de execução específica da cláusula compromissória, (iii) execuções e cumprimento da sentença arbitral, (iv) homologação de sentenças arbitrais estrangeiras e (v) medidas de urgência.

No aspecto qualitativo, tais decisões, atualmente, sinalizam uma perspectiva positiva, tendo em vista, principalmente, o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça que, em face de convenção válida e eficaz, determina a extinção da ação judicial, sem julgamento do mérito.

Outra importante conclusão da primeira publicação da pesquisa é a de que a maior parte das arbitragens brasileiras tem transcorrido sem grandes obstáculos, sendo as sentenças voluntariamente cumpridas pelas partes. Do reduzido número de sentenças arbitrais que chegam a ser objeto de ações anulatórias, poucas têm o mérito apreciado pelo Judiciário. Ainda mais raras são as efetivas anulações de sentenças arbitrais, que, quando ocorrem, são feitas, em geral, de forma técnica, respeitando a competência dos árbitros para resolução da controvérsia, bem como os limites impostos pela Lei de Arbitragem e pela cláusula compromissória.

Assim, em que pesem algumas divergências ainda existentes entre os diversos órgãos judiciais do país, bem como a predominância de decisões nos tribunais de São Paulo e do Rio de Janeiro — o que denuncia a concentração do emprego da arbitragem nesses estados —; o trabalho desenvolvido em conjunto pelo Cbar e a FGV revela claramente o acolhimento da Lei de Arbitragem pelo Poder Judiciário brasileiro, que, como um todo, vem evoluindo em sua interpretação e aplicação e, progressivamente, se familiarizando com os conceitos inerentes ao instituto da arbitragem.

Corroboram tais conclusões algumas decisões paradigmáticas proferidas recentemente, dentre as quais cita-se como exemplo o acórdão exarado pelo Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, em processo envolvendo empresas partícipes de contratos relativos à mesma operação econômica, que continham cláusulas compromissórias conflitantes, indicando duas câmaras arbitrais diversas. Referida decisão reconheceu a competência exclusiva do Juízo Arbitral para a deliberação acerca de qual seria a cláusula compromissória aplicável no caso em questão, o que revela o respeito ao Princípio Competência-Competência tão importante para independência e autonomia da arbitragem.

Não obstante as mencionadas decisões favoráveis ao desenvolvimento da arbitragem no país, também merece atenção um percalço enfrentado pelo instituto no início de junho de 2010, qual seja: decisão judicial que acatou Mandado de Segurança impetrado contra ato de tribunal arbitral consistente na negativa de produção de prova pericial. A decisão gerou grande polêmica e foi largamente criticada pela comunidade arbitral nacional e internacional, eis que patente a violação à autonomia das partes na escolha do Juízo Arbitral, em exclusão ao Judiciário, e para o decorrente “efeito negativo da cláusula compromissória”.

No dia 22 de julho deste ano, os efeitos da aludida decisão foram suspensos pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. No atual estágio, aguarda-se o pronunciamento definitivo sobre a questão, confiando, a comunidade arbitral, na reforma da decisão apontada, sob pena de sério risco à efetividade da Lei de Arbitragem brasileira, conquistada arduamente ao longo dos últimos 14 anos.

Conquanto algumas decisões negativas ao instituto, o saldo da jurisprudência atual em matéria de arbitragem é extremamente positivo, além de muito promissor. Isso porque, a escolha pelo foro arbitral vem registrando vertiginoso crescimento, o que se confirma pelo aumento substancial de procedimentos arbitrais em curso perante as principais câmaras brasileiras, nos últimos dois anos.

Um marco da crescente importância do Brasil no âmbito da Arbitragem Internacional em 2010 foi a realização do maior evento mundial sobre o assunto, o Congresso do ICCA – International Council for Commercial Arbitration, na cidade do Rio de Janeiro, entre os dias 24 e 26 de maio. O congresso contou com número recorde de inscritos (aproximadamente 900 pessoas), em sua maioria estrangeiros. Na oportunidade, foram discutidos os temas mais modernos relativos à prática internacional da arbitragem, proporcionando intenso intercâmbio de conhecimento e experiências no ramo, entre juristas brasileiros e de inúmeras outras nacionalidades.

A conferência foi ainda seguida de uma visita dos membros do ICCA e do Cbar ao Superior Tribunal de Justiça, simbolizando a integração, cada vez maior, entre o Poder Judiciário e as instituições de arbitragem internacional e inaugurando uma nova fase no fortalecimento de tais meios de resoluções de conflitos, no Brasil.

Os citados eventos contribuíram, ainda, para confirmar a posição de destaque já ocupada pelo Brasil na América Latina. Desde 2006, o país é líder latino em número de procedimentos arbitrais em curso perante a Câmara de Arbitragem da Corte Internacional de Comércio de Paris (CCI). A CCI informou, ainda, que, em 2009, a cidade de São Paulo foi a sede escolhida em 18% de todos os procedimentos administrados pela câmara, porcentagem essa que ultrapassa inclusive a atingida por cidades como Paris, Nova York e Londres.

Assim, as empresas brasileiras passam cada vez mais a dispor de recursos para negociar, não só a estipulação da sede de procedimentos arbitrais no Brasil, como a aplicação da lei brasileira em contratos celebrados com partes estrangeiras.

Conclui-se, por todo o exposto, que o fomento acadêmico, a colaboração do Poder Judiciário, o aumento quantitativo de procedimentos arbitrais e a realização no país do mais importante congresso mundial sobre arbitragem, entre outros fatores, fizeram de 2010 um marco no fortalecimento do instituto no Brasil.

Eleonora Coelho – sócia do Castro, Barros, Sobral, Gomes Advogados, graduada pela Faculdade de Direito da USP, mestre em Arbitragem, Contencioso e Modos Alternativos de Solução de Controvérsias pela Universidade Paris II e Vice-Presidente do Comitê Brasileiro de Arbitragem (Cbar).

Marina Chierighini – advogada do Castro, Barros, Sobral, Gomes Advogados e graduada pela Faculdade de Direito da USP.

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  • é sócia do Castro, Barros, Sobral, Gomes Advogados, graduada pela Faculdade de Direito da USP, mestre em Arbitragem, Contencioso e Modos Alternativos de Solução de Controvérsias pela Universidade Paris II e Vice-Presidente do Comitê Brasileiro de Arbitragem (Cbar).

  • é advogada do Castro, Barros, Sobral, Gomes Advogados e graduada pela Faculdade de Direito da USP.

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