Ideias do milênio

"A vitória é sempre de quem tem a melhor história"

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6 de dezembro de 2010, 14h47

Reprodução/GloboNews
Frank Rich e Jorge Pontual - Reprodução/GloboNews"As pessoas gostam de uma boa história, não importa se é verdadeira ou não. Muitas vezes, a melhor história vence, mesmo que são seja a melhor para o país." Quem diz isso é ex-crítico de arte e atual colunista político do The New York Times, em entrevista ao jornalista Jorge Pontual para o programa Milênio, da Globo News. Com a frase, Rich explica a atual tendência dos americanos, e que é também dos brasileiros, de transformar a atividade política e social em espetáculo do showbusiness. Explica também o sucesso de Barack Obama na campanha eleitoral e a sensação de decepção que provocou no desempenho da presidência. "Ninguém teve história melhor do que Barack Obama. Agora, que ele está no governo e ela não pode se contada, a história ficou mais confusa e o prejudicou."

O Milênio é um programa de ideias e de inteligência, no qual jornalistas da Globo News entrevistam pensadores do mundo inteiro, sobre os mais diversos assuntos. O programa é exibido às 23h30 de segunda-feira, com reapresentação às terças (3h30; 11h30 e 17h30), quartas (5h30) e domingos (7h05).

Leia abaixo a transcrição da entrevista com Frank Rich, feita por Jorge Pontual, transmitida originalmente pelo Milênio, no dia 25 de outubro:

Jorge Pontual: Frank Rich, já foi crítico de TV, cinema e de artes cênicas. Hoje é um dos comentaristas políticos mais influentes nos EUA. Sua coluna semanal no The New York Times  é lida por mais de cinco milhões de pessoas (nas versões impressa e digital).

O correspondente Jorge Pontual foi até a redação do NYTimes para conversar com Rich sobre a importância das eleições legislativas nos EUA (que aconteceram no dia 2 de novembro e deram uma esmagadora vitória ao Partido Republicano) e um fenômeno em particular: o fortalecimento da extrema direita conservadora, representada pelo Tea Party (que ganhou esse nome por causa de um movimento de protesto em fins do século XVIII)  e o que esse movimento pode vir a representar para o futuro imediato pós-eleitoral nos EUA. Rich foi um dos primeiros analistas políticos a chamar a atenção para o fenômeno de ascenção dessa nova direita conservadora dentro do Partido Republicano. "Ninguém teve história melhor do que Barack Obama. Agora, que ele está no governo, a história ficou mais confusa e o prejudicou."

Frank Rich também analisou o delicado momento político pelo qual passa o presidente Obama e comenta como os políticos nos EUA estão agindo cada vez como atores canastrões de TV. E fazem sucesso assim!

Jorge Pontual — É ótimo o senhor ter começado como crítico de teatro e ter se tornado crítico de política. Os dois têm muito a ver. Teatro e democracia política surgiram em Atenas.
Frank Rich
— Sempre houve relação entre teatro e política. No passado, a era eletrônica teve início com o crescimento do rádio, há quase um século, e chegou a um ponto em que hoje em dia, parece não haver qualquer barreira entre o showbiz em geral e os políticos. Principalmente nos EUA, onde o showbiz é a religião nacional não-oficial.

Jorge Pontual — O senhor citou uma das leis da democracia política: a melhor história vence.
Frank Rich —
As pessoas gostam de uma boa história, não importa se é verdade ou não. Muitas vezes, não necessariamente para o bem do país, a melhor história vence. Às vezes, quando a história não se sustenta, você se encrenca. Ninguém teve história melhor do que Barack Obama. Foi uma das melhores e mais inspiradoras histórias americanas. Agora, que ele está no governo e ela não pode se contada, a história ficou mais confusa e o prejudicou. 

Jorge Pontual — Precisamos falar das eleições nos Estados Unidos. É difícil para um correspondente estrangeiro, como eu, explicar aos meus espectadores a política americana. Por exemplo, o Tea Party. É como a festa do chá de Lewis Carroll? Não. Não envolve chás, nem festinhas, envolve chapeleiros malucos e loucos de ódio. Quem são essas pessoas? Por que têm tanta raiva?
Frank Rich —
É difícil explicar o movimento Tea Party, porque há muitos elementos e eles não necessariamente combinam entre si. O movimento começou quando um comentarista de um canal de TV paga, Rick Santelli, um mês após a posse de Obama, estava berrando no ar sobre a ajuda financeira do governo com as hipotecas de proprietários de imóveis. Não os bancos. 

Jorge Pontual — Um repórter, ao vivo.
Frank Rich — Ao vivo, de Chicago. Ninguém o conhecia. As pessoas começaram a se unir ao redor dos protestos furiosos dele. Um grupo formado sobretudo por homens brancos e mais velhos. Acabou se tornando uma frase de impacto, no início, para o ódio contra Obama. Em parte, era racial, em parte, era ódio da direita porque um político liberal tinha chegado à presidência e encerrado a era Bush, pelo menos no momento. Com o tempo, foi criando uma metástase ainda mais estranha. Por um lado, ainda existia o extremismo clássico que vemos no mundo todo, o aspecto intolerante da direita. Por outro lado, também havia pessoas apenas com raiva. Em certos casos, com razão, mas sem saber contra o que direcionar a raiva. Era raiva do alto desemprego, do fato de recuperação econômica não parece real nos EUA, exceto em Wall Street. Não sabiam de quem ter raiva. Seria do Obama? Não queriam ter raiva do governo Bush, mesmo que ele tenha resgatado os bancos. Deveriam ter raiva de Wall Street? Era muita raiva não-direcionada e, às vezes, desinformada. É espantoso, nos encontros do Tea Party, as pessoas dizem que o governo é grande demais e deveria tirar as mãos do Seguro Social e do Medicare, que é o programa de assistência médica e previdenciária do governo. De fora, a maneira certa de se ver é: há raiva nos EUA. Em parte, devido à eleição de Obama. Boa parte tem a ver com a sensação de declínio econômico e pânico, pessoas perdendo casas e empregos e nenhuma solução em vista. Historicamente, nos EUA, mas não apenas nos EUA, com esse tipo de angústia econômica, geralmente vemos pessoas buscando bodes expiatórios e voltando-se contra o governo para atacá-lo.

Outro aspecto político esquisito é que o Partido Republicano é um partido amplamente branco e conservador. No entanto, parte do Tea Party está à direita dos republicanos. O mais chocante para quem acompanha a política americana foi que, durante as eleições primárias, quando os republicando estavam escolhendo candidatos para o Senado e os governos estaduais, o candidato republicano do sistema que já é muito conservador, muitas vezes perdeu até para pessoas loucas, como alguém que lida com bruxaria, alguém que quer fazer um retrocesso no Seguro Social, na Lei dos Direitos Civis, que deu direitos aos afro-americanos na década de 1960. Querem mudar a Constituição. É um movimento muito diversificado e conservador.

Outro fator muito interessante foi que ele começou como um movimento populista. As pessoas que reagiram a Rick Santelli [comentarista do canal de televisão pago CNBC, especializado em economia e negócios, que em 2009 iniciou campanha contra medidas de caráter social do governo de Barack Obama] e começaram a fazer reuniões chamadas de Tea Party, referindo-se à Tea Party em Boston, da Revolução Americana, que não tinha nada a ver com isso, talvez apenas os impostos. Começou como uma organização popular, mas, como quase tudo nos EUA, logo atraiu dinheiro. Uma das maiores revelações se deu nos últimos meses. Alguns dos maiores bilionários americanos do petróleo… 

Jorge Pontual — Como os irmãos Koch.
Frank Rich —
Exatamente. Os irmãos Koch e outros estão financiando o movimento. Estão pagando, fazendo contribuições. Seus interesses econômicos não são necessariamente os mesmos das pessoas que berram nas ruas. 

Jorge Pontual — No Brasil, acabamos de eleger deputado um palhaço profissional de TV com 1,4 milhão de votos, um recorde na história brasileira. Mas aqui também há figuras semelhantes. Um deles, que não é candidato, é Glenn Beck, uma figura televisiva importante, de grande influencia no Tea Party. Por que esse interesse por personagens cômicos?
Frank Rich —
Glenn Beck é interessante. Por um lado, ele é cômico, por outro lado, chora muito na TV, é muito emotivo. Pode ser fingimento, mas ele faz isso. É quase uma personalidade de commedia dell’arte em seus vários humores. Nos EUA, há um histórico de artistas que entram para a política. O mais famoso foi Ronald Reagan. Reagan não era palhaço, mas era ator, cuja personalidade foi construída em cima dos papéis que teve em Hollywood. O papel desempenhado por Glenn Beck, uma personalidade do rádio e da TV, é uma tradição americana. Na década de 1930, havia um pastor de rádio, o padre [da Igreja Católica] Charles Coughlin, que começou apoiando Roosevelt, mas se tornou um populista antissemita de direita. Bem antes de Rush Limbaugh [apresentador de programa de rádio popular e ultraconservador], quando eu era garoto, havia pessoas já esquecidas hoje, como Joe Pyne, uma grande personalidade de direita de rádio. É um tema recorrente na política americana. Outro ponto interessante é que, na época áurea da louca organização de direita chamada John Birch Society, nos anos 60, que produziu Barry Goldwater [(1909-1989), senador republicano ultra-conservador pelo Arizona com mandatos de 1953 a 1987] , também havia personalidade famosas de rádio, principalmente no Sul, no Texas, promovendo essa ideologia cômica porém amedrontadora. 

Jorge Pontual — O eleitorado do Tea Party são homens brancos com raiva. Frank Rich — Exato.

Jorge Pontual — Mas a maioria dos candidatos, ou muitos daqueles que estão em evidência, são mulheres. Sarah Palin [governadora do Alasca de 2006 a 2009, e candidata vice-presidente na chapa republicana encabaçada por John McCain e derrotada por Barack Obama em 2008]é a rainha delas. Quem são essas mulheres que têm tanta raiva e poder? 

Frank Rich — Lembre-se de que o Partido Republicano, institucionalmente, foi contra o feminismo, foi contra a Emenda da Igualdade de Direitos, ainda é contra o direito da mulher ao aborto… Portanto, não atraiu muitas lideranças femininas. Havia algumas, sempre houve. Agora, são muitas e não há nada de errado nisso. Elas são uma novidade no partido. Talvez esse partido um dia também inclua negros! Ainda não chegaram lá. Mas é uma novidade. Também é novidade para a mídia. O sucesso de alguém como Sarah Palin  é complicado. Ela não era muito popular nas pesquisas eleitorais. O índice de popularidade dela era baixíssimo, mesmo comparado ao de outros republicanos que pudessem disputar a indicação com ela. Mas ela é divertida, se sai bem na TV e saiu do nada, o que os EUA adoram. É como American Idol [programa de calouros de grande sucesso na televisão americana]. Adoramos reality shows, concursos de talentos, estrelas instantâneas do cinema ou da política. Ela ainda é uma novidade. O país não a conhecia quando ela entrou na chapa com John McCain. Não faz muito tempo, foi há dois anos. Aina a estamos conhecendo, e ela foi muito astuta ao se autopromover.

Jorge Pontual — Ela tem uma história boa.
Frank Rich — Muito boa. Descobrimos que parte dela não é verdade, mas isso é normal. Ela parece uma pessoa da classe operária que subiu na vida graças ao próprio esforço. Na verdade, ela vem da classe média. Os pais eram professores. A história conta que ela disse “não” ao governo do Alasca, porque não aceitaria verba federal para um projeto maluco que desperdiçaria o dinheiro do contribuinte. Mas pegou todo dólar que pôde para o Alasca, quando foi governadora e prefeita lá. Boa parte da história continua sendo ficção. Mas histórias fictícias podem funcionar. Ronald Reagan, por exemplo, acreditava piamente que havia servido na 2ª Guerra Mundial, mas ele ficou nos EUA fazendo filmes para os militares, o que não é bem o mesmo que estar lá no Dia D. 

Jorge Pontual — Ele acreditava que tinha ido à guerra.
Frank Rich — Ele acreditava e… Uma coisa interessante nos EUA, boa ou ruim, é que o povo se apaixona pelas lendas. Há uma frase famosa no filme O homem que Matou o Facínora, de John Ford: “Já sabe a verdade. Publique a lenda.” É o que acontece aqui toda hora. 

Jorge Pontual — Vamos falar de Obama. Como você disse, ele tinha uma ótima história. O que saiu errado com ele?
Frank Rich — Primeiro, não está definitivamente errado. Ele fez conquistas importantes. Ele aprovou a lei de estímulo econômico. Provavelmente salvou milhões de empregos, mas é difícil provar isso, quando há tantos desempregados. Ele também continuou o que teve início com Bush, uma ajuda aos bancos para estabilizar Wall Street e, talvez, impedir uma imensa depressão. E ele aprovou a reforma da Saúde com alguns pontos bons e outros nem tanto. Pelos padrões de presidentes americanos recentes, são imensas conquistas legislativas. Mas a maioria das pessoas não se deixa levar por isso.
O fascinante é que um presidente que contou uma história tão boa na campanha, que arrebatou os americanos, não tornou-se um comunicador tão bem-sucedido enquanto presidente. Esse não é o único problema. O foco mudou. Ele deveria ter dado mais ênfase aos empregos, ter falado mais de empregos e menos de bancos, enquanto tentava a recuperação. Ele cometeu alguns erros. Mas, lembre-se, ele ainda é, de longe, mesmo que o índice de aprovação esteja mais baixo do que nunca, o político mais popular nos EUA. Mesmo com um índice de aprovação é de 45% ou 46%. Os democratas, os republicanos no Congresso, todos os republicanos, incluindo Sarah Palin, Mitt Romney [pré-candidato a presidente pelo Partido Republicano em 2008 e possível pré-candidato nas próximas eleições em 2012] , são todos menos populares que Obama. A única pessoa mais popular que ele é Michelle Obama.

Jorge Pontual — Quando Obama foi eleito, compararam ele a Roosevelt, os cem primeiros dias e toda a ambição dele… Mas o que ele não fez tão corretamente quanto Roosevelt?
Frank Rich — Por incrível que pareça, acho que Roosevelt, que era membro de carteirinha da aristocracia americana, não tinha medo de enfrentar seu próprio grupo econômico. Ele disse que recebia bem o ódio dos bancos, recebia bem o ódio daqueles em Wall Street que se opusessem à reforma. Roosevelt não era radical. Ele era da aristocracia, não pretendia transformar os EUA em nação socialista, mas queria implementar reformas que, mas tarde, salvaram o país.
Com Obama, é algo com a personalidade. É uma ótima personalidade para se ter na vida, mas não como presidente. Ele quer sinceramente ser conciliador. Ele quer reconciliar as pessoas, não gosta de confrontos e não gosta de raiva, apesar de ser capaz de senti-la. Ele pode ser razoável demais às vezes, e disposto demais a conciliar as diferenças. Um exemplo clássico é o plano de ação no Afeganistão. Ele não fez nada que não tenha dito que faria. Ele disse que intensificaria a guerra, mas, ao tentar encontrar um meio-termo entre generais que queriam intensificar demais e pessoas do governo dele, incluindo [o vice-presidente] Joe Biden, que queriam começar a retirada, ele criou um plano anfíbio que não está funcionando. É um compromisso entre os dois lados, mas, na questão prática da guerra e da retirada, talvez não funcione, pois é apenas um plano. Mas ele é um homem muito inteligente. Só tem dois anos no governo ou nem isso. Não deveria ser subestimado. Esperamos que, depois das eleições legislativas [de 2 de novembro último], ele faça algumas correções, seja qual for o resultado.

Jorge Pontual — O senhor escreveu que, não importa quem vença, todos perderão nos EUA.
Frank Rich — Sim, porque o que acontece agora é que há tamanha polarização, uma atmosfera política tão venenosa, que as pessoas não estão pensando com clareza em nenhum partido, sobretudo no republicano. O Partido Republicano não propôs solução para nada do que aflige os americanos. Eles só dizem: “Obama é terrível, os democratas são terríveis e vamos cortar impostos”. Não é cortando impostos que se recuperam empregos, quando toda a economia está mudando, pois há mudanças estruturais nos empregos em todos os setores da economia. A manufatura não vai existir mais. E o que os republicanos fazem? Atacam Obama por ajudar a indústria automotiva, o que de fato foi uma coisa boa, pois era um dos últimos pontos que poderiam gerar muitos empregos no setor industrial. Agora, temos uma atmosfera em que nada é feito. A disputa vai ficar bem acirrada no Congresso. Mesmo que os democratas se sustentem, o que não deve acontecer, será muito próximo. Todo mundo vai brigar. As pessoas se zangam com todo o sistema, mesmo no Partido Republicano. Algo interessante no Tea Party é que eles formaram uma nova estrutura econômica para financiar campanhas, porque não confiam no Comitê Republicano Nacional, o Partido Republicano oficial. Há grandes divisões no Partido Democrata, os partidos estão se atacando. Enquanto isso, temos um país que caminha mal. Também temos muita agressividade, fala-se muito em violência e há repetidos relatos de levantes do tipo dos movimentos de milícia armada contra o governo que precederam o atentado a bomba em Oklahoma, nos anos 1990. Nesse sentido também, os EUA estão perdidos. Isso precisa ser reprimido por quem estiver no comando.

 Jorge Pontual — Obama também foi comparado ao ex-presidente Carter, que tinha o discurso sobre a indisposição americana. Os EUA estão de novo passando por essa indisposição? Isso explica a situação? Como o senhor vê o que as pessoas chamam de declínio do império americano? O declínio do país.
Frank Rich — Primeiro, acho que a comparação com Carter é uma piada. As comparações entre Obama e Carter são simplistas. Carter fez mesmo um discurso dizendo que os EUA iam de mal a pior, o discurso da indisposição. Obama teve a consciência de não adotar essa tática. Existe na imprensa e, entre especialistas, pessoas que escrevem, como eu, a sensação de que os EUA estão em declínio, há o medo da China… Mas há muita gente boa nos EUA, que acha que está dando certo. Mas o desemprego, que afeta todo mundo, principalmente a classe média… Há um grupo cada vez maior entrando na pobreza. Eles nem estão no radar dessas eleições. Foram esquecidos por ambos os partidos, porque não votam, e isso é uma tragédia. Também há pessoas da classe média, incluindo na minha área, a dos jornais, que perderam o emprego. Todo mundo perdeu o emprego. Isso atrai tanto a atenção que é difícil pensar na grande promessa dos EUA quando sua preocupação é não ter acesso a serviço de saúde, não poder pagar sua hipoteca e manter a casa. Essa é a situação. É uma grande nuvem, a nuvem da depressão. É recessão, não depressão. Um dos erros de Obama tem sido não dar voz aos que sofrem. Ele fez isso esporadicamente, mas gastou tempo demais no primeiro ano de presidência, quando não estava melhorando. Estava melhorando para os bancos. Mas, se não melhorasse para os empregos, ele mandava Larry Summers [secretário do Tesouro no governo de Bill Clinton e um dos principais conselheiros econômicos de Obama] ou Tim Geithner [secretário do Tesouro], que diziam: “Sem exagerar, houve melhora.” Emprego é um indicador variável. Não significa nada para o povo. Bill Clinton não teria ficado satisfeito com isso. Bill Clinton tinha pontos fortes e fracos. Roosevelt também. Esse tipo de empatia… Obama era um organizador comunitário, ele obviamente sente isso. A mãe dele dependia das agências de bem-estar social. Então, ele entende isso. Por que ele não conseguiu, consistentemente, passar essa mensagem de empatia aos americanos? Fico abismado. Não sei a resposta. 

Jorge Pontual — Por falar na recessão e nos jornais, o que está havendo com jornais como o New York Times, o de maior sucesso online? Não estão dando lucro?
Frank Rich — A grande questão dos jornais de qualquer lugar é descobrir como lucrar se as pessoas leem online. Cada vez mais, as pessoas leem online. O que aconteceu com o jornal impresso nos Estados Unidos foram duas tempestades, sem relação entre si, que ocorreram simultaneamente. A que citamos, o aumento da digitalização. A percepção de que as gerações futuras e os jovens de hoje, provavelmente, não lerão jornais impressos. Eles ainda querem o que um ótimo jornal tem, mas de forma diferente. Como se paga por isso? Todos estão empenhados em descobrir. O New York Times, ano que vem, vai começar a cobrar pelo conteúdo do site. Veremos. Por coincidência, a crise econômica aconteceu simultaneamente. É um fato à parte. No momento em que jornais como o NY Times, o Wall Street Journal, o Washington Post, ou revistas jornalísticas, como a New Yorker, revistas caras, pensavam em como lidar com o problema digital, como dar esse passo, eles perderam anúncios, porque as pessoas pararam de comprar roupas e jóias na Saks Fifth Avenue, na Tiffany ou na Chanel, ou carros da Mercedes-Benz. Por questões não relacionadas ao fator digital, perderam toda essa publicidade. Perderam anúncios de imóveis e de empregos. Estou um pouco menos pessimista do que antes, mas acho que tão importante quanto descobrir como ganhar dinheiro com digitalização, será a recuperação econômica do país como um todo. Precisamos das duas coisas. Ninguém sabe. Cobrar por um jornal digital é mais fácil do que descobrir o que aconteceu com a economia americana. Todas as previsões estavam erradas, inclusive a da gestão Obama, que disse que o desemprego seria no máximo de 8,5%. Tudo estava errado em ambos os lados. Vamos esperar para ver. 

Jorge Pontual — O Senhor é crítico e analista. Para estudantes de jornalismo interessados nisso, em vez de apenas passar uma notícia, como se faz uma análise?
Frank Rich — Cada um faz de uma maneira, só posso falar da minha. O que sempre digo aos jovens, a jovens jornalistas ou a quem quer ser jornalista é: “sua opinião é o aspecto menos importante”. Qualquer pessoa pode amar ou odiar Obama, amar ou odiar Bush. O importante é você usar a reportagem, usar as fontes, usar a pesquisa para encontrar uma explicação para o que está acontecendo. Contar uma história. É o que você faz. É importante abrir uma discussão, mas o que eu gosto de fazer, que pode ter vindo da minha experiência em teatro, é me distanciar e perguntar: “Qual é a trama?” Não com relação aos políticos, mas ao país. Por que existe esse clima agora? Por que a população vota nessa pessoa? Por que ninguém aqui liga para a guerra no Afeganistão? Não está nem nas pesquisas. Mais americanos são mortos agora do que antes. Mas não vira notícia. Por quê? A resposta nunca é “sim” ou “não”. É fácil ter opinião sobre algo. Mas deve-se analisar a cultura. Acredito em analisar a cultura e a notícia, a política, tentando achar um movimento na história. Para mim, essa é a graça. Eu escrevo uma coluna de 1.500 palavras, adoro escrever uma narrativa. Não seria divertido apenas dizer: “Obama é ótimo” ou “Obama é terrível”, fazer uma lista do que gosto ou não. Gosto de entender como tudo funciona.

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