Garantia processual

Sociedade quer uma garantia processual independente

Autor

21 de agosto de 2010, 9h27

A obediência ao devido processo legal é uma máxima inafastável no sistema persecutório criminal. Ninguém poderá ser processado criminalmente, nem muito menos condenado com trânsito em julgado, ao arrepio das preciosas garantias constitucionais do contraditório, da ampla defesa e demais corolários do nosso modelo garantista. Indubitavelmente. Mas o excesso de direito, às vezes, torna pernicioso o próprio direito, que mal utilizado, pode dar vazão a uma ditadura do garantismo, bastante ruinosa considerando os beneficiários em potencial e os desfrutadores de plantão.

Ninguém quer o crime. Uns, mais severos e intransigentes, gritam abruptamente e sem vacilar o chavão cadeia neles! Há também os que dizem amar os criminosos e odiar apenas o crime, como no clichê “Deus ama o pecador e abomina o pecado” (no Brasil não é difícil se banalizar até o que é Sagrado). Mas tanto a turma do tolerância zero como alguns radicais pro reo devem se pautar num racionalismo garantista, sob o risco de serem vítimas de paranóia persecutória ou de sofrerem de garantismo esquizofrênico.

A sociedade e a comunidade jurídica, especialmente, não podem fazer “o papel do velho cão estúpido que morde a pedra que nele bate, em vez de procurar a mão que a arremessou” (Tobias Barreto). O respeito às garantias constitucionais deve vir com o emprego constante do intelecto, numa perspectiva mais responsável e melhor dimensionada do que a mera visão reducionista e individualista. E esquizofrênica. Sim. Se a paranóia persecutória leva aos excessos da repressão, da intolerância, como se todo acusado fosse criminoso e nascesse bandido de pai e mãe, a esquizofrenia garantista (patologia que parece se espalhar com um espirro em certos ambientes) enxerga inocência em todo banco de réu. Para a vítima de tal delírio, a vilania está sempre do lado da máquina do Estado, que tramaria diabolicamente para condenar inocentes ao inferno do cárcere. Um e outro vivem uma realidade psicótica, maníaca, talvez até romântica, mas totalmente irracional.

Quando a sociedade começa a bater continência a bandidos, há algo de errado. Chega com essa de voltar àquele neurótico lugar-comum de querer tratar o Estado como um ser sobrenatural, cheio de tentáculos e que quer engolir todo mundo. Ora, o retrato jurídico do Estado é a sua Constituição. Se há mal emprego dela, o problema aí já é da própria sociedade, das instituições formatadas paulatinamente no seio do mesmo agrupamento social. Quem impregna os serviços públicos é gente da sociedade. Os chamados agentes públicos (agente político, funcionário público…) nela têm sua origem. Juiz e Desembargador não são mandatários de Leviatã algum. Delegado fica doente, tem pai, mãe e, pasmem, filho de Promotor não nasce de beca, nem muito menos apontando para o nariz da enfermeira gritando: – prende, condena! Nada disso. São pessoas normais, que também sonham com um país melhor e mais justo.

Em velório de policial morto em atividade ninguém gosta de aparecer. No de bandido, morto na “contra-atividade”, dependendo do cacife, tem até que se distribuir senha e faixa branca com pedidos de paz não é rara. A mentira se sobrepõe à verdade por causa da vírgula esquecida no processo do Juiz ou por culpa das provas mal grampeadas nos autos pelo escrivão. Vivemos num Brasil onde certos instrumentos persecutórios soam como crueldade insana, enquanto em outros países desenvolvidos e muito mais avançados sobre o ponto de vista humanitário, tais instrumentos são facilmente empregados. Só sob o sol tupiniquim mesmo é que querem que se fique pedindo desculpas para bandido. Direito comparado parece que só serve para criminoso rico com bom advogado.

Garantismo processual, sim, sempre. Independente da origem social e econômica do processando. Mas deve se dizer “não” a uma realidade hipócrita, onde criminosos de colarinho branco e paletó azul marinho, mala preta e até de carro oficial, pousam, com cara de vira-lata abandonado, como vítimas de perseguição ou repressão criminal. E a esquizofrenia de certas correntes convencem. Enquanto isso, infelizmente, o crime vagueia, olha de soslaio para o erário público, cobiça a carteira dele e a castidade dela, sempre espreitando a próxima vítima; daí, ao menor respingo de risco de ser preso e punido, esperneia muito, com certas anotações constitucionais embaixo do braço. À mesma Constituição que ele desonra ao não respeitar o patrimônio alheio ou público, passa a exigir a obediência irrestrita. Então, o crime continua fazendo vítimas, mas sem culpados sociais e históricos declarados e, para alguns tipos de réus, sem julgamento e sem trânsito em julgado.

Parafraseando Manuel Bandeira:
O povo está farto do garantismo enviesado
Do garantismo mal comportado
Do garantismo esquizofrênico com cartilha para bandido expediente ao Supremo petição e manifestações de apreço ao Sr. Criminoso
O povo está farto do garantismo que para e vai averiguar nas entrelinhas do formulário um direito bonitinho para o réu rico
Abaixo a Justiça Penal que só prende desvalidos e solta, sob luz forte e sol reluzente de uma nova era que não existe, os “melhores” criminosos.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!