Operações ilegais

Relatório da PF indicia 42 cotistas do Opportunity

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18 de agosto de 2010, 16h10

O resultado do relatório da Polícia Federal sobre o inquérito da Operação Satiagraha, que investigou o fundo de investimento Opportunity Found, nas Ilhas Cayman, aponta que 42 cotistas usaram a carteira para fazer operações financeiras ilegais. A informação é do jornal Folha de S.Paulo.

O fundo investigado é ligado ao grupo Opportunity, que é comandado pelo banqueiro Daniel Dantas, réu acusado de ter cometido crimes financeiros apurados na operação da PF. O grupo de cotistas, formado majoritariamente por empresários, foi indiciado por evasão de divisas. Dois deles também foram acusados de lavagem de dinheiro.

A Assessoria de Imprensa do Opportunity informou, por meio de uma nota, que “não teve acesso ao inquérito sobre os cotistas do Opportunity Fund, embora tenha requisitado inúmeras vezes. Portanto, não teve a oportunidade de contestar ou contrapor as acusações ali formuladas”.

Um administrador do Opportunity Fund foi indiciado sob acusação de gestão fraudulenta, evasão de divisas e formação de quadrilha. O grupo Opportunity negou as acusações da PF, e Dantas contestou a ação criminal da Satiagraha.

A legislação não permite que investidores residentes no Brasil tenham recursos no fundo, pois os rendimentos das aplicações na carteira estavam isentas do pagamento de Imposto de Renda. Porém, de acordo com a PF, administradores do fundo ofereciam a residentes no Brasil a oportunidade de burlar o Fisco, investindo no Opportunity Fund. Parte dos cotistas confessou saber que as aplicações no fundo eram ilegais, segundo a PF.

Dentre os cotistas do Opportunity Fund, foram indiciados apenas aqueles que possuíam mais de US$ 100 mil depositados, uma vez que as regras do Banco Central brasileiro exigem a declaração ao órgão de depósitos no exterior somente a partir desse valor.

A PF diz que foi necessário buscar elementos de prova nas apurações do caso Banestado, que revelou na década passada a remessa ilegal de bilhões de dólares ao exterior por meio do banco. Doleiros envolvidos no caso Banestado afirmaram que enviaram recursos para o Opportunity Fund e seus cotistas, de acordo com a PF. Testemunhos de ex-funcionários do grupo Opportunity também revelaram as irregularidades, aponta o relatório final da PF.

O documento segue agora para o Ministério Público Federal. A instituição poderá denunciar os indiciados à Justiça e assim dar início à terceira ação penal resultante da Operação Satiagraha.

Leia a nota da Assessoria de Imprensa do Opportunity:
O Opportunity não teve acesso ao inquérito sobre os cotistas do Opportunity Fund, embora tenha requisitado inúmeras vezes. Portanto, não teve a oportunidade de contestar ou contrapor as acusações ali formuladas. A pressa na conclusão demonstra a vontade de condenar independentemente de novas informações que certamente esclareceriam os fatos.

O Opportunity Fund opera similarmente aos outros fundos dessa indústria, que são geridos por instituições como o Banco do Brasil, Itaú, Unibanco, Santander, Citibank DTVM, HSBC CTVM, Deutsche Bank, UBS Pactual, Credit Suisse DTVM, Banco Barclays, Credit Suisse Hedging-Griffo CV.

O Opportunity Fund só aceita aplicações de bancos provenientes de países que fazem parte do "Schedule 3 Countries" — aqueles que possuem legislação e procedimentos de combate à lavagem e dinheiro reconhecidos internacionalmente.

Não é verdade que o Opportunity oferecia a seus cotistas a "oportunidade de burlar o fisco", mesmo porque o Opportunity não faz captação de clientes. A captação dos clientes do Opportunity Fund, pessoas físicas e jurídicas, é feita por bancos estrangeiros.

E mais, o Opportunity não envia recursos de seus investidores para o exterior. O Opportunity é gestor de fundos nacionais e estrangeiros. As aplicações feitas por clientes no Brasil em fundos nacionais não são enviadas tampouco remetidas para o exterior. Os recursos são investidos em títulos e valores mobiliários negociados exclusivamente na Bovespa.

Decisão do Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN), que julgou o processo da CVM, sobre o Opportunity Fund, instaurado a partir da denúncia de Luís Roberto Demarco, ex-diretor do Opportunity, o arquivou em agosto de 2007.

A conselheira-revisora do CRSFN afirmou que as informações prestadas pelo denunciante continham "diversos fatos anômalos" e concluiu pela "ocorrência de contrafação". Em nota de rodapé contida no voto, a conselheira-revisora se referiu à avaliação da perita judiciária, que explicou se "contrafação" sinônimo, entre outros, para "imitação fraudulenta".

A conselheira também faz referência ao laudo judicial onde se destaca que a perícia não foi feita em documentos originais e sim em cópias, ou seja, Demarco não enviou à CVM as cópias originais.

O perito constata que as planilhas enviadas à CVM foram fraudadas: somam valores em moedas distintas, dólares e reais e tiveram informações inseridas manualmente, o que evidencia que não foram geradas em nenhum sistema do Opportunity.

Essas planilhas não apresentam qualquer critério de ordenação de aplicações quer seja por data quer seja por valor. E mais, o papel timbrado utilizado para a impressão dos e-mails era da empresa CVC/Opportunity Equity Partners, onde o Luís Roberto Demarco trabalhava, e que não possui qualquer relação com o Opportunity Fund.

Não há qualquer menção na investigação do Banestado sobre o Opportunity. Manchete da Folha de S.Paulo, em 7 de agosto de 2004, intitulada "CPI quebra o sigilo fiscal de 29 executivos e banqueiros" mostrava os alvos da ação. Daniel Dantas sequer é citado.

E mais, o procurador Luiz Francisco de Souza entrou com uma ação de improbidade administrativa combinada com ação civil contra o Opportunity, Daniel Dantas e outros em que citava matéria da Folha de

21 de agosto de 2004, intitulada "Dez giraram US$ 2,4 bi em 42 contas nos EUA", centrada na CPI do Banestado. "Um grupo de dez doleiros brasileiros movimentou pelo menos US$ 2,4 bilhões em 42 contas do MTB Bank de Nova York (EUA), entre janeiro de 1997 e 24 de novembro de 2003. O levantamento foi feito pela Folha com base nas operações registradas em um CD enviado pela Promotoria de Nova York (EUA) à CPI do Banestado".

A reportagem não citava o Opportunity e a ação do procurador foi feita no computador de Marcelo Elias, advogado e sócio de Luís Roberto Demarco, ex-diretor do Opportunity.

Mais uma vez se tenta ligar o Opportunity ao Banestado.

Opportunity: alvo perseguição política
Essa perseguição contou com duas operações policiais, a Chacal deflagrada em 2004 e, em sua esteira, a Satiagraha, quatro anos depois. Ambas foram marcadas por ilegalidades, provas forjadas, uso da imprensa, vazamento de informações e emprego da força policial em favor de interesses privados. Diversos inquéritos foram abertos na Justiça, vários deles baseados em matérias de jornais e revistas.

A ação do "caso Kroll" foi trancada em 27 de abril de 2010, por inépcia da denúncia e atipicidade da conduta. Trocando em miúdos: essa arbitrariedade — tão difundida pela imprensa — não tinha razão de ser nem deveria ter sido levada adiante.

Em abril de 2010, a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região trancou a maior parte do processo movido contra Daniel Dantas e os envolvidos no caso Kroll, estopim da Operação Chacal, deflagrada pela Polícia Federal em 2004. À época, Daniel Dantas e Carla Cico, executiva da Brasil Telecom, foram acusados de contratar a multinacional para "espionar executivos da Telecom Italia e o alto escalão do governo Lula" em razão da disputa pela Brasil Telecom. Essa denúncia encomendada pelos adversários do Opportunity fez com que a sede da empresa, os apartamentos de Dantas e Cico fossem invadidos pela polícia.

A acusação fabricada foi desmontada pelo Tribunal Regional Federal da 3ª região. Após seis anos, a decisão judicial restabelece a verdade.

Operação Mãos Limpas
Desde 2006, investigações da Procuradoria de Milão sobre a Telecom Italia mostram que a operadora italiana espionou o Opportunity e pagou propinas a autoridades, policiais, consultores e jornalistas em sua disputa pela Brasil Telecom.

Hoje se sabe que o responsável pela entrega do CD fraudado com a denúncia do caso Kroll, à Policia Federal foi Angelo Jannone, ex-carabinieri, e então chefe de Segurança da Telecom Italia para a América Latina.

No âmbito do processo ora em curso na Procuradoria de Milão, dezenas de pessoas foram presas. Muitas delas confessaram que a Telecom Italia pagou autoridades e prepostos no Brasil para prender Daniel Dantas e assim favorecer a operadora italiana na disputa pela Brasil Telecom.

Elas também admitiram que a Telecom Italia entregava malas de dinheiro para servidores públicos aliciados — inclusive agentes da Polícia Federal que faziam escutas ilegais contra juízes brasileiros.

Integrantes da cúpula da Polícia Federal e da Abin aparecem nos testemunhos de Milão como recebedores de dinheiro dos italianos para atuar contra o Opportunity.

Um dos contatos de Angelo Jannone e de Marco Bernardini, detetive particular contratado pela Telecom Italia, era Luís Roberto Demarco, ex-diretor do Opportunity. A desenvoltura de Demarco junto à Polícia Federal está documentada. No processo que corre em Milão foi anexado um e-mail de Demarco ao delegado Élzio Vicente da Silva, responsável pela Operação Chacal. O texto, encaminhado em dezembro de 2004, aconselhava que Daniel Dantas fosse indiciado por formação de quadrilha, concorrência desleal e corrupção ativa.

Meses depois, em março de 2005, Demarco, por e-mail, pediu ao jornalista Ucho Haddad que publicasse na sua página eletrônica um placar mostrando o número de dias que Daniel estava fora do Brasil. O objetivo, dizia Demarco, era fazer com que a Polícia Federal antecipasse a prisão preventiva de Daniel. Logo depois, nos últimos dias de março de 2005, o delegado Élzio solicitou a prisão preventiva de Daniel, mas o pedido foi negado pelo juiz.

O processo de Milão foi dividido em duas partes. A primeira, relativa à espionagem, concluiu-se em 7 de julho de 2008, um dia antes de a Operação Satiagraha ser deflagrada. A segunda parte, referente a suborno e tráfico de influência, continua sob investigação. As provas italianas mostram que a Operação Chacal (2004) derivou de uma armação da Telecom Italia.

A Justiça de Milão reconheceu Daniel Dantas e o Opportunity como vítimas da Telecom Italia, habilitando-os a pedir reparação pelos danos sofridos. Daniel também testemunhou aos procuradores de Milão e teve acesso aos documentos que constam dos autos italianos.

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