Randomização virtual

Distribuição aleatória do processo judicial garante lisura

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1 de agosto de 2010, 8h00

Na história da humanidade mudam-se governos, opiniões e filosofias. Mudam-se, também, as interpretações dadas às normas jurídicas. No entanto, o direito continua o mesmo. Nunca foi tão fácil se comunicar com as pessoas, realizar negociações antes quase impossíveis pela geografia. De fato, esse cenário mudou devido à rede mundial de computadores. A internet revolucionou não só as relações pessoais, mas acima de tudo conectou o mundo e criou um grande espaço virtual propício a gerar negócios independentemente das barreiras geográficas.

Seguindo o caminho da inovação, o Judiciário começou a implantar o sistema de processo virtual, um importante passo para o acesso às garantias e direitos regulados pelo ordenamento jurídico. Em um futuro breve, teremos todo um sistema processual brasileiro virtualizado. A tendência é que os processos físicos, que se empilhavam nas prateleiras das varas e dificultavam a eficácia no atendimento judicial, entrem em extinção.

Porém, acredito que devemos ir além. Podemos dar agora um importante passo para a democratização processual e ainda ajudar a combater a corrupção e o patrimonialismo que persistem no Judiciário brasileiro, através da implantação do processo judicial virtual randômico.

O processo virtual randômico consiste na certeza de que, ao ingressar com um processo virtual na Justiça, a parte autora terá a ação distribuída aleatoriamente a qualquer juiz de direito brasileiro, independentemente da sua comarca. A única reserva da competência territorial se daria nas ações que envolvem o interesse do Estado e dos Municípios, que devem ser distribuídas aos magistrados residentes naquelas localidades, além das causas que envolvam competências das cortes superiores brasileiras (STF e STJ).

Regras de territorialidade desapareciam e o sistema judiciário brasileiro seria encarado de forma harmônica, inexistindo barreiras geográficas. Ora, todos os juízes brasileiros têm (ou deveriam ter) a mesma formação acadêmica e, portanto, igual capacidade para decidir lides com a mesma técnica jurídica, independentemente do domicílio das partes envolvidas no processo.

O processo virtual randômico garantiria a distribuição igualitária do número de processos aos magistrados, não havendo, em qualquer localidade do país, juízos com inúmeros processos e outros com números inferiores, permitindo se estabelecer critérios objetivos e nacionais para ascensão na carreira por merecimento. Ainda, em muito se dificultaria a corrupção processual movimentada pela advocacia de prestígio, uma vez que seria provavelmente impossível o causídico manter relações extraprocessuais com magistrados por todo o território brasileiro.

Com certeza, argumentos contra essa forma de distribuição processual serão levantados, principalmente com relação à importância da ambientação do magistrado que possui “conhecimento local” sobre as necessidades do “povo da sua terra”; ou sobre a produção pericial e testemunhal de provas; e até mesmo sobre o fato de o Brasil ser um país com uma enorme extensão geográfica e uma cultura plural.

Porém, nenhum dos argumentos consegue vencer a virtude (e adequação) do processo randômico. Será mesmo relevante, no processo civil, o magistrado residir no território onde a ação é discutida, para, por exemplo, decidir pela separação litigiosa de um casal? Com a internet e a facilitação dos meios de informação, não poderiam as peculiaridades do “povo local” ser conhecidas pelo juiz?

Há algum tempo os tribunais superiores já utilizam o sistema de videoconferência para coletar provas, como, por exemplo, o depoimento dos presidiários. Por que não aplicar a mesma tecnologia para a colheita da prova processual? Com relação a esse tema, temos muito a evoluir. O debate está apenas começando.

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    é advogado, sócio do escritório Furtado, Pragmácio Filho e Advogados Associados, responsável pela área de Direito Empresarial e Contratual, e professor do curso de Direito da Faculdade Farias Brito.

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