Palavra do presidente

Lewandowski repudia judicialização da política

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22 de abril de 2010, 20h32

Nelson Jr./ASICS/TSE
Lewandowski e lula na posse no TSE - Nelson Jr./ASICS/TSE

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, disse em seu discurso de posse na presidência do Tribunal Superior Eleitoral, que a Justiça Eleitoral “não hesitará fazer uso, com o máximo rigor, do arsenal de medidas legais para fazer prevalecer a livre manifestação da vontade dos eleitores". Lewandowski terá a missão de conduzir as eleições presidenciais de 2010. Em seu discurso, disse que a Justiça Eleitoral “não estimulará a esterilizante judicialização da política, deixando que seus atores resolvam as respectivas disputas na arena que lhes é própria”.

“Não cabe a esta Justiça especializada protagonizar o processo eleitoral, cumprindo-lhe, ao revés, criar condições para que ele transcorra em um clima de festa cívica, de congraçamento popular, no qual prevaleça, antes de tudo, o debate em torno de idéias, programas e projetos, assim como velar para que se sagrem vencedores no pleito vindouro, os mais aptos a servir o Estado”, disse o novo presidente do TSE.

[Foto: Nelson Jr., do TSE]

Leia o discurso de posse do novo presidente do TSE:

“O esforço para definir e implantar um governo democrático remonta à civilização que se desenvolveu na antiga Grécia, por volta do século V antes da era cristã. Um dos mais antigos registros existentes sobre o tema é a célebre Oração Fúnebre de Péricles, por ele proferida no ano de 431, em homenagem àqueles que tombaram na Guerra do Peloponeso, que opôs as cidades-Estado de Atenas e Esparta.

 Nesse discurso, legado aos pósteros por Tucídides, um dos mais eminentes historiadores da Antiguidade, o grande estadista Péricles, consolando os parentes e amigos dos mortos, lembrou que eles deram suas vidas para preservar o modo especial de convivência dos cidadãos de Atenas. À beira das tumbas recém-escavadas, lembrou aos presentes que

“A nossa Constituição não imita as leis dos Estados vizinhos. Ao invés disso, somos um modelo para os outros. O governo favorece a maioria em vez de poucos – por isso é chamado de democracia. Se consultarmos a lei, veremos que ela garante justiça igual para todos em suas diferenças; quanto à condição social, o avanço na vida pública depende da reputação de capacidade. As questões de classe não têm permissão de interferir no mérito, tampouco a pobreza constitui um empecilho: se um homem está apto a servir ao Estado, não será tolhido pela obscuridade de sua condição.”

O ideal democrático de igualdade de todos perante a lei e de ampla participação dos cidadãos na gestão da coisa pública, desenvolvido pelos antigos gregos, permaneceu imutável em sua essência até os dias atuais. Mas a esses valores, depois de uma longa evolução histórica, agregaram-se outros, com destaque para aqueles revelados nas múltiplas dimensões dos direitos fundamentais.

Em uma verdadeira democracia, é escusado dizer, os governantes, escolhidos pelo povo, são responsáveis diante dele pela boa gestão dos negócios públicos. Não exercem o poder por direito próprio, constituindo meros mandatários dos cidadãos.

Nessa forma de governo, impera a soberania popular, que encontra expressão por meio de representantes eleitos. Distingue-se dos regimes despóticos, nos quais o povo não tem qualquer ação sobre os governantes, ao mesmo tempo em que se aparta das formas diretas de participação popular, em que os cidadãos governam por si mesmos.

A legitimidade dos representantes do povo radica em eleições, cuja base é o sufrágio geral, igual, direto e secreto, que não pode sofrer qualquer restrição em termos de sexo, raça, rendimento, instrução ou ideologia.

O voto há ter também imediatidade, isto é, deve defluir diretamente da vontade do eleitor, sem intermediação de quem quer que seja, e mostrar-se livre de pressões de qualquer espécie. Pressupõe ainda não apenas a pessoalidade de seu exercício, como também a ausência de qualquer possibilidade de identificação do eleitor. Precisa, ademais, ser renovado periodicamente, de modo a assegurar a alternância dos representantes no poder.

A missão fundamental que a nossa Constituição comete à Justiça Eleitoral é a de garantir que a vontade popular possa expressar-se da forma mais livre possível. Para isso ela conta com sofisticados mecanismos de coleta e apuração dos votos, a exemplo da urna eletrônica e da identificação biométrica dos eleitores, que dentro em breve será estendida a todos os votantes.

Constituem instrumentos modernos, publicamente testados quanto à sua segurança e confiabilidade, sendo objeto de permanente fiscalização por parte de juízes e membros do Ministério Público e também de representantes da Ordem dos Advogados do Brasil e dos partidos políticos.

Têm a vantagem, ademais, de permitir a apuração da vontade popular, poucas horas depois de encerada a votação, não obstante a dimensão continental do Brasil e os milhões de eleitores e milhares de candidatos que participam dos pleitos, sem dar margem a contestações quanto ao resultado obtido. Trata-se de uma tecnologia pioneiramente desenvolvida em nosso País, e motivo de justo orgulho de todos os brasileiros.  

A Justiça Eleitoral conta também, para fazer prevalecer a livre manifestação da vontade dos eleitores, com um arsenal de medidas legais, das quais não hesitará fazer uso com o máximo rigor, em especial para coibir o financiamento ilegal de campanhas, a propaganda eleitoral indevida, o abuso do poder político ou econômico, a captação ilícita de sufrágio e as condutas vedadas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos. 

Mas, embora à semelhança da deusa Têmis, esteja a Justiça Eleitoral sempre pronta a brandir a espada, para reequilibrar os pratos da balança que sustenta em suas mãos, ela não estimulará a esterilizante judicialização da política, deixando que seus atores, conquanto não desbordem os lindes da legalidade, resolvam as respectivas disputas na arena que lhes é própria, de modo a permitir que a tenra planta da democracia, semeada pelos constituintes de 1988, possa encontrar forças em suas próprias raízes. 

Isso porque não cabe a esta Justiça especializada protagonizar o processo eleitoral, cumprindo-lhe, ao revés, criar condições para que ele transcorra em um clima de festa cívica, de congraçamento popular, no qual prevaleça, antes de tudo, o debate em torno de idéias, programas e projetos, assim como velar para que se sagrem vencedores no pleito vindouro – tal como preconizavam os antigos atenienses há cerca de dois mil e quinhentos anos atrás – os mais aptos a servir o Estado, ou seja, aqueles que se destaquem por sua reputação ilibada e pela capacidade de servir ao bem comum, independentemente da condição social que ostentem.”     

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