Ofensas em ligações

Gravação telefônica pode ser utilizada como prova

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7 de abril de 2010, 16h10

A gravação da própria conversa telefônica pode ser considerada como prova mesmo quando o interlocutor não estava ciente do registro. Com esse entendimento, a 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul manteve indenização a uma professora por ofensas feitas durante telefonema. Com a decisão, o Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul — Sindicato dos Trabalhadores em Educação junto com Jucele Bernadete Azzolin Comis e Regina Demamam devem pagar R$ 20 mil à autora da ação. Cabe recurso. A informação é do site Espaço Vital.

A advogada Ana Lúcia trabalhou como advogada do Sindicato de 1983 a 1991, até ser demitida por justa causa. Na Justiça do Trabalho, Ana conseguiu reverter a situação. Na ação por danos morais, ela contou que muitos professores buscaram explicações sobre as “chamadas extras” impostas pelo sindicato, com descontos na folha de pagamento e mensagens com “manifestações difamatórias que denegriram sua imagem e atividade profissional”. Para comprovar as ofensas, outra pessoa telefonou para o sindicato e gravou o diálogo, que também foi ouvido pela secretária da advogada, por meio de extensão.

Em resposta, o Sindicato negou as ofensas à advogada. Sobre as chamadas extras, seus representantes ainda argumentaram que o assunto foi levado ao conhecimento da categoria na assembleia geral, pois havia necessidade de equilibrar o orçamento do sindicato por meio dessa prática.

A 2ª Vara Cível da Comarca de Lajeado condenou o sindicato a indenizar o dano moral. Em apelação, os réus sustentaram que a gravação telefônica não poderia ser usada como prova por ser ilegal, uma vez que foi feita sem o consentimento de uma das partes. A 9ª Câmara, que confirmou a sentença, entendeu que "a gravação de conversa é ilícita quando é feita por meio de intercepção telefônica clandestina ou sem autorização judicial". Mas, no caso julgado, o diálogo foi gravado por uma das interlocutoras, o que é legal.

Pelo voto do relator, "mesmo se considerada ilegal a gravação, as mesmas informações poderiam ser obtidas pelo depoimento da interlocutora, que não é parte na ação". A respeito da ocorrência do dano moral, o relator referiu-se à sentença, que avaliou que "a conduta profissional da autora foi exposta e denegrida por insinuações e suspeitas, algo que abala qualquer um que preserve seu nome e sua atividade".

Leia a íntegra da decisão:

Apelação cível. Responsabilidade civil. Ofensas à atuação profissional. Gravação de conversa telefônica. Um dos meios de convicção.

Prova lícita. Dano moral configurado. Quantum indenizatório. Critérios.
A gravação de conversa feita por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro não constitui prova ilícita.Palavras dirigidas à autora que, de per si, são suficientes para causar danos morais. Danos in re ipsa.

Valor da condenação fixado de acordo com as peculiaridades do caso concreto, bem como observados os princípios da proporcionalidade e razoabilidade.  Quantum arbitrado na origem mantido.

Negado provimento ao apelo.
Apelação Cível –  Nona Câmara Cível
nº 70033031840 –  Comarca de Lajeado

CENTRO DOS PROFESSORES DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL – E OUTROS – APELANTE ANA LUCIA LOPES –  APELADO

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao apelo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, as eminentes Senhoras Des.ª Iris Helena Medeiros

Nogueira (Presidente e Revisora) e Des.ª Marilene Bonzanini Bernardi.

Porto Alegre, 10 de março de 2010.

DES. TASSO CAUBI SOARES DELABARY,
Relator.
RELATÓRIO
Des. Tasso Caubi Soares Delabary (RELATOR)

ANA LÚCIA LOPES ajuizou a presente ação indenizatória em desfavor de JUCELE COMIS, REGINA DEMAMAM e do CENTRO DOS PROFESSORES DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL – CEPERS – SINDICADO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO alegando, em síntese, que trabalhou como advogada do CEPERS entre outubro de 1983 e novembro de 1991, quando foi demitida por justa causa. Argumentou também que a alegada justa causa foi afastada na Justiça do Trabalho, em decisão já transitada em julgado.

A título de indenização, segue a inicial, já recebeu parte dos valores assegurados pela Justiça Trabalhista, permanecendo um saldo de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais) que seria levantado mediante “chamadas extras” dos sindicalizados.

Depois da inclusão das “chamadas extras” em seus contracheques, refere que muitos professores buscaram contato com o Sindicato e foram informados da origem do débito, informação esta que vinha acompanhada de manifestações difamatórias e que denegriam a imagem da autora e sua atividade profissional.

Destacou que o Sindicato e suas dirigentes utilizaram contra autora e o processo trabalhista expressões como “máfia dos advogados”, “cobranças por fora” e “horas extras sem nunca ter feito”, o que lhe causou danos extrapatrimoniais cuja recomposição pretende com a presente demanda.

Como resposta, em peça única de contestação, O CENTRO DOS PROFESSORES DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL – CEPERS – SINDICATO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO; JUCELE BERNADETE AZZOLIN COMIS e REGINA DEMAMAM suscitaram preliminar de inépcia da inicial.

No mérito, rebaterem os termos da inicial, especialmente as alegadas ofensas à demandante. Argumentaram, outrossim, que o assunto foi levado ao conhecimento da categoria na Assembléia Geral pois havia necessidade de equilibrar o orçamento do Sindicato através de chamadas extras, o que dependia de aprovação em assembléia. Requereram a improcedência.

Houve réplica e tréplica.

Em audiência para fins do artigo 331 do CPC foram rejeitadas as preliminares de inépcia da inicial e de intempestividade da contestação, bem como designada audiência de instrução e julgamento.

Na instrução foram ouvidas as partes e testemunhas. Como encerramento os litigantes apresentaram memoriais.

Sobreveio sentença de procedência que condenou os réus ao pagamento de indenização no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), corrigido pelo IGP-M desde a sentença e acrescido de juros legais de mora desde novembro de 2004.

Em razão da sucumbência, os demandados foram condenados ao pagamento das custas do processo e honorários advocatícios de 15% sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 20, § 3º, do CPC.

O CENTRO DOS PROFESSORES DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL – CEPERS – SINDICATO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO; JUCELE BERNADETE AZZOLIN COMIS e REGINA DEMAMAM interpuseram recurso de apelação.

Nas razões recursais sustentaram que a fita magnética com a gravação da ligação telefônica não pode prevalecer, pois obtida de forma ilícita, já que sem o consentimento.

Rebateram, outrossim, a força probatória das testemunhas ouvidas em juízo, não havendo prova a respeito dos fatos constitutivos da pretensão inicial.

Sucessivamente, rebateram o quantum indenizatório, com o que pugnaram pelo provimento do recurso com a consequente reforma da sentença.

Apresentadas contrarrazões, vieram os autos a esta Corte e a mim distribuídos por sorteio.

É o relatório.
VOTOS
Des. Tasso Caubi Soares Delabary (RELATOR)
Ilustres Colegas.

Conheço do recurso, porquanto preenchidos os pressupostos de admissibilidade.

Quanto ao objeto, a matéria devolvida diz respeito aos alegados danos que teriam sido praticados pelos réus em detrimento da autora, danos estes flagrados na gravação telefônica acostada aos autos e durante a assembléia geral da categoria.

Antes, no entanto, do exame da matéria de fundo controvertida, consigno que não se revela ilícita a gravação da conversa telefônica juntada aos autos.

Isto porque não se está diante de interceptação telefônica clandestina ou feita sem autorização judicial. Trata-se, em verdade, de gravação produzida por uma das interlocutoras com o intuito de comprovar as palavras que eram dirigidas em relação à demandante.

A este respeito da licitide de tais gravações manifesta-se a jurisprudência da Corte:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA. GRAVAÇÃO DE CONVERSA. INICIATIVA DE UM DOS INTERLOCUTORES. ILICITUDE. INOCORRÊNCOA. CERCEAMENTO DE DEFESA. COAÇÃO NÃO COMPROVADA. A gravação de conversa feita por um dos interlocutores sem o conhecimento

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