Securitização fiscal

São Paulo pode emitir títulos com base em débitos

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30 de setembro de 2009, 21h51

O governo paulista já pode emitir títulos públicos baseados em créditos estaduais para obter recursos no mercado financeiro. É o que autoriza a Lei 13.723, publicada nesta quarta-feira (30/9) no Diário Oficial do Estado, depois de sancionada pelo governador José Serra. A norma autoriza o Poder Executivo a ceder direitos creditórios originados por créditos tributários e não-tributários que já foram parcelados. Na conta, entram tributos cobrados tanto administrativa quanto judicialmente.

Os títulos serão emitidos com base em parcelamentos de dívidas de ICMS, IPVA e ITCMD e repassados a uma sociedade de propósito específico, sob a forma de sociedade por ações, controlada pelo estado e vinculada à Secretaria da Fazenda. Também podem receber os créditos a Companhia Paulista de Parcerias ou um fundo de investimento em direitos creditórios a ser criado pelo governo estadual, com base nas regras da Comissão de Valores Mobiliários.

O fundo deve servir para driblar a regra constitucional que exige aprovação do Senado Federal para a emissão de títulos, permitida apenas à União. Ao criar um fundo de investimentos de direitos créditórios, o governo paulista poderá vender suas cotas no mercado financeiro. As cotas, por definição, não são títulos e, por isso, não precisam da aprovação do Senado. O capital do fundo será constituído apenas pelo valor das negociações com contribuintes devedores.

A iniciativa, que provocou debates na Assembleia Legislativa, pode enfrentar questionamentos na Justiça. Uma delas, segundo Pedro Serrano, professor de Direito Administrativo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, é a cessão de créditos fiscais a terceiros, o que é vedado pela Constituição e pelo Código Tributário Brasileiro. “Apesar de não admitir, a lei trata de disponibilidade de crédito tributário.” Além disso, como lembra o professor, as operações de crédito com recursos públicos precisam passar por trâmites específicos, como a aprovação da Secretaria do Tesouro Nacional, prevista na Lei de Responsabilidade Fiscal.

Para o fisco estadual, no entanto, os créditos de que trata a norma são ativos pertencentes ao estado e são um direito à parte dos créditos tributários. “Com a cessão do direito ao recebimento do produto do adimplemento, permanecem íntegros todos os privilégios próprios do crédito tributário, bem como a prerrogativa exclusiva do estado, por intermédio da Procuradoria-Geral do Estado, para sua cobrança”, afirmou o secretário da Fazenda, Mauro Ricardo Machado Costa.

A explicação pode ter fundamento, segundo o advogado Eduardo Diamantino, mas deveria valer também para os contribuintes. "Há restrições para cessão e compensação de precatórios justamente por serem créditos tributários. Por que não é possível negociá-los também?", questiona. Para Diamantino, as fontes suplementares de receita obtidas com a venda dos títulos deveriam ser usadas para quitar precatórios atrasados e não para investimentos. Com informações da Assessoria de Imprensa da Assembleia Legislativa do estado de São Paulo.

Leia a norma publicada

LEI Nº 13.723, DE 29 DE SETEMBRO DE 2009

Autoriza o Poder Executivo a ceder, a título oneroso, os direitos creditórios originários de créditos tributários e não tributários, objeto de parcelamentos administrativos ou judiciais, na forma que especifica O GOVERNADOR DO ESTADO DE SÃO PAULO:

Faço saber que a Assembléia Legislativa decreta e eu promulgo a seguinte lei:

Artigo 1º – Fica o Poder Executivo autorizado a ceder, a título oneroso, à sociedade de propósito específico a que se refere o artigo 8º desta lei, ou à Companhia Paulista de Parcerias – CPP, ou, ainda, a fundo de investimento em direitos creditórios, constituído de acordo com as normas da Comissão de Valores Mobiliários, os direitos creditórios originários de créditos tributários e não tributários, objeto de parcelamentos administrativos ou judiciais, relativos ao Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS, ao Imposto de Transmissão “Causa Mortis” e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCMD, ao Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA, às taxas de qualquer espécie e origem, às multas administrativas de natureza não tributária, às multas contratuais, aos ressarcimentos e às restituições e indenizações.

§1º – A cessão compreende apenas o direito autônomo ao recebimento do crédito e somente poderá recair sobre o produto de créditos tributários cujo fato gerador já tenha ocorrido e de créditos não tributários vencidos, efetivamente constituídos e inscritos na divida ativa do Estado ou reconhecidos pelo contribuinte ou devedor mediante a formalização de parcelamento.

§ 2º – Na hipótese de cessão a fundo de investimento em direitos creditórios, este deverá ser instituído e administrado pelo agente financeiro do Tesouro.

Artigo 2º – A cessão de que trata o artigo 1º não modifica a natureza do crédito que originou o direito creditório objeto da cessão, o qual mantém suas garantias e privilégios, não altera as condições de pagamento, critérios de atualização e data de vencimento, não transfere a prerrogativa de cobrança judicial e extrajudicial dos créditos originadores, que permanece com a Procuradoria Geral do Estado, e não compreende a parcela de que trata o artigo 55 da Lei Complementar nº 93, de 28 de maio de 1974, com alterações posteriores.

Artigo 3º – Para os fins desta lei, o valor mínimo da cessão não poderá ser inferior ao do saldo atualizado do parcelamento, excluídos juros e demais acréscimos financeiros incidentes sobre as parcelas vincendas.

Artigo 4º – O cessionário não poderá efetuar nova cessão dos direitos creditórios cedidos na forma desta lei, salvo anuência expressa do Estado.

Artigo 5º – A cessão dos direitos creditórios originados de créditos tributários será sempre parcial, ficando excluída a parcela pertencente aos Municípios, nos termos do disposto nos incisos III e IV do artigo 158 e no artigo 159 da Constituição Federal.

Parágrafo único – Os Municípios continuarão a receber os recursos que trata o “caput” deste artigo nos prazos e percentuais previstos na legislação de regência, no momento da concretização dos respectivos pagamentos pelos contribuintes, o mesmo ocorrendo em relação às demais receitas vinculadas, em conformidade com as disposições da Constituição Federal e da Constituição do Estado.

Artigo 6º – A cessão deverá ser disciplinada em instrumento

específico, com individualização dos direitos creditórios cedidos, aplicando-se, no que couber, os dispositivos pertinentes do Código Civil, instituído pela Lei federal no 10.406, de 10 de janeiro de 2002.

Parágrafo único – A cessão far-se-á em caráter definitivo, sem assunção, pelo Estado, perante o cessionário, de responsabilidade pelo efetivo pagamento a cargo do contribuinte ou de qualquer outra espécie de compromisso financeiro que possa, nos termos da Lei Complementar federal no 101, de 4 de maio de 2000, caracterizar operação de crédito.

Artigo 7º – Nos procedimentos necessários à formalização da cessão prevista no artigo 1º desta lei, o Estado preservará o sigilo relativamente a qualquer informação sobre a situação econômica ou financeira do contribuinte, do devedor ou de terceiros e sobre a natureza e o estado dos respectivos negócios ou atividades.

Artigo 8º – Fica o Poder Executivo autorizado a constituir sociedade de propósito específico, sob a forma de sociedade por ações com a maioria absoluta do capital votante detida pelo Estado, vinculada à Secretaria da Fazenda, tendo por objeto social a estruturação e implementação de operações que envolvam a emissão e distribuição de valores mobiliários ou outra forma de obtenção de recursos junto ao mercado de capitais, lastreadas nos direitos creditórios a que se refere o artigo 1º desta lei.

Parágrafo único – A sociedade de propósito específico a que se refere o “caput” deste artigo não poderá receber, do Estado, recursos financeiros para pagamento de despesas de pessoal ou de custeio em geral, a fim de não se caracterizar como empresa dependente do Tesouro, nos termos da Lei Complementar federal no 101, de 4 de maio de 2000.

Artigo 9º – Fica o Poder Executivo autorizado a proceder à abertura do capital social da sociedade de propósito específico mencionada no artigo 8º desta lei, de acordo com as normas estabelecidas pela Comissão de Valores Mobiliários, desde que mantida, em caráter incondicional, a maioria absoluta do respectivo capital votante.

Artigo 10 – Não serão considerados rompidos os acordos de parcelamento firmados no âmbito do Programa de Parcelamento Incentivado – PPI ICM/ICMS no Estado de São Paulo, para a liquidação de débitos fiscais relacionados com o Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias – ICM e com o ICMS, desde que as parcelas vencidas e não pagas até 30 de setembro de 2009 sejam repactuadas até 31 de março de 2010, nos termos e condições previstos em regulamento.

Artigo 11 – Para atender às despesas decorrentes da execução desta lei, fica o Poder Executivo autorizado a abrir crédito especial, até o limite de R$ 100.000,00 (cem mil reais), destinados à integralização do capital social da sociedade por ações mencionada no artigo 8º.

Parágrafo único – O valor do crédito especial a que se refere este artigo será coberto na forma prevista no § 1º do artigo 43 da Lei federal nº 4.320, de 17 de março de 1964.

Artigo 12 – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Palácio dos Bandeirantes, 29 de setembro de 2009

JOSÉ SERRA

Mauro Ricardo Machado Costa
Secretário da Fazenda

Francisco Vidal Luna
Secretário de Economia e Planejamento

Aloysio Nunes Ferreira Filho
Secretário-Chefe da Casa Civil

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