“A obrigação do Poder Judiciário, em caso de erro grave, como uma condenação que contrarie manifestamente as provas dos autos, é reparar de imediato esse erro. Se isso não foi feito, cabe a esta corte Superior fazê-lo, sob pena de perpetuação do erro”. A consideração foi feita pelo desembargador convocado Celso Limongi, da 6ª Turma, ao votar pela soltura imediata do policial militar Rosenvaldo Honório Costa, do Rio de Janeiro.
O policial foi condenado a 15 anos por homicídio, mesmo tendo agido em legítima defesa, com base em depoimento de apenas uma testemunha com indícios de suspeição e sem direito ao contraditório. O crime ocorreu quando o policial foi, a pedido da dona de um imóvel, conversar com o comprador, que não estava pagando as prestações de compra do imóvel como combinado.
Ao chegar ao local, acompanhado do irmão, antes mesmo de conseguir falar com o comprador, a vítima do policial saiu do bar, afirmando que "aquela área era dele" e nada havia a acertar com o comprador. Houve discussão, o homem sacou uma arma, disparando um tiro na nádega do policial, que reagiu, atirou três vezes e acabou acertando a vítima.
Essa foi a versão apresentada pelo policial, que foi confirmada na polícia e em juízo. O policial foi, no entanto, condenado pelo Tribunal do Júri como incurso no artigo 121, parágrafo 2°, II, do Código Penal. Uma revisão criminal foi ajuizada pela defesa. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro negou. No Habeas Corpus dirigido ao STJ, o advogado alegou que a condenação teve o respaldo de uma única testemunha, o comprador, cujo depoimento foi tomado apenas na fase policial, sem contraditório.
Após o voto do relator, desembargador convocado Haroldo Rodrigues, no sentido de anular o julgamento para outro ser feito, o desembargador convocado Celso Limongi pediu vista do caso. “Como facilmente se percebe, o depoimento do comprador merecia desde logo sérias reservas, porque foi ele o responsável por deflagrar conflito de ordem civil”, considerou, ao observar, que além de tudo, a vítima era compadre da irmã do comprador.
Em seu voto, Celso Limongi afirmou que não era caso de oferecimento da denúncia. Se recebida, como foi, não caberia a decisão de pronúncia, porque a prova se baseava em único depoimento, tomado na fase inquisitória, sem o necessário e indispensável contraditório. Pronunciado o réu, foi levado a julgamento pelo Tribunal do Júri. Era evidente caso de absolvição. Foi, porém, condenado.
Para o desembargador Limongi, não havia nenhuma dúvida de que era caso de se acolher a apelação para anular o julgamento, enviando o réu a novo julgamento do Júri. Não houve acolhimento do recurso, tendo sido ajuizada a revisão criminal. Na ocasião, apenas um voto acolheu o pedido da defesa pela absolvição, a fim de reparar manifesto erro judiciário.
A decisão do TJ-RJ, por maioria, no entanto, negou a revisão criminal sob o argumento de que a condenação se baseara em prova produzida em juízo. “Uma ‘Comédia dos Erros’, a lembrar Shakespeare, com todo o respeito que merecem aqueles que pensaram diferentemente”, assinalou o desembargador. Ao votar pela soltura do policial, o desembargador Limongi destacou que houve, inequivocamente, erro judiciário que precisa ser reparado em definitivo.
Em seu voto, ele afirmou que a anulação do julgamento para levar o réu a novo julgamento dará oportunidade à perpetuidade daquele erro. Ao votar pela liberdade imediata do policial, observou, ainda, que há documento no processo comprovando que o policial não registrava antecedentes criminais. “Apesar de ser policial militar, com exercício no estado do Rio de Janeiro, sempre às voltas com criminalidade mais violenta, como é de todos sabido”, concluiu Celso Limongi. A decisão foi por 3 a 2. Com informações da Assessoria de Imprensa do Superior Tribunal de Justiça.
HC 63.290