Garantias constitucionais

Processo eletrônico merece avaliações sobre seus aspectos

Autor

21 de setembro de 2009, 12h04

Com a edição da Lei 11.419/06 que regulamenta a informatização do processo judicial, o Poder Judiciário brasileiro vem implantado diversos recursos tecnológicos, a fim de permitir o exercício de sua função de julgar, de forma célere e efetiva. Dentre eles, destaca-se a criação de sistemas operados pela internet capazes de promoverem a tramitação eletrônica dos processos desde a petição inicial até a decisão final do juiz. A exemplo, citem-se os sistemas CNJ-Projudi utilizado no Tribunal de Justiça de MG e outros tribunais estaduais, o Suape na Justiça do Trabalho e o E-proc na Justiça Federal. Neles é possível que advogados e partes previamente cadastrados, acessem todos os processos (exceto aqueles em segredo de justiça) visualizando todas as petições, documentos e decisões.

Embora represente o ideal de celeridade e economia na atividade judicial, a utilização do processo judicial merece avaliações a respeito dos aspectos controvertidos, pois há o iminente risco de se conflitarem as garantias constitucionais da intimidade/privacidade (artigo 5º, X, Constituição) e da publicidade processual (artigo 5º, LX, da Constituição).

Isso porque, o direito à intimidade/privacidade é um direito conexo ao da vida, presente na Constituição no rol de direitos e garantias fundamentais. A publicidade, por sua vez, assume características diferenciadas de acordo com o regime de governo vigente sendo que no atual é condição para sua existência e validade. Portanto importante mecanismo de fiscalização da atividade estatal, já que desempenha importante papel com base na estrutura de governo, sendo inadmissível uma sociedade justa e igualitária sem este recurso.

Contudo, a inserção da informática no processo judicial demonstra a necessidade da estrita observância dos demais princípios constitucionais, justamente pela preservação da intimidade/privacidade dos litigantes. Nesse passo, torna-se necessária a harmonização destas garantais em relação à publicidade no processo informatizado, principalmente por ter como base de tramitação a Internet, capaz de potencializar os efeitos da divulgação de informações processuais.

Quando reproduzidas por este meio há uma exposição de fatos documentos e informações não abrangidos pelo sigilo processual previsto de forma restritiva na legislação vigente, que rege sua aplicação principalmente nos litígios que tramitam nas varas de família. Aplica-se o sigilo, quando o interesse público exigir e em prol da proteção da intimidade, desde que o direito público à informação não seja prejudicado. Contudo, a norma vigente é omissa em relação a diversas espécies de litígios, não sendo possível aplicá-la no processo eletrônico.

Uma vez que as barreiras territoriais e burocráticas do processo convencional inexistem neste novo modelo, devem ser adotados mecanismos para desestimular a curiosidade fútil sobre a situação processual das partes, pois doravante, todo acervo informativo relacionado a sua atividade judicial é acessível a qualquer interessado no mundo inteiro pela Internet, inviabilizando o direito ao esquecimento daquele que litigou no processo.

Como é sabido demandar em juízo pressupõe a exposição de informações sensíveis relativas aos envolvidos, as quais, dependendo do seu conteúdo, se divulgadas indevidamente, podem trazer prejuízos de ordem familiar, profissional e social. Nesse contexto, necessário que se adote, no processo informatizado, recursos capazes de relativizar a publicidade, assegurando o acesso à justiça e evitando prejuízos reflexos com a exposição de informações no processo.

Para tanto, propõe-se a inserção nesses sistemas de mecanismos de anomimização, tornando indisponíveis informações que possam identificar as partes do processo, substituindo-as no caso dos nomes, por uma sequência formada pelas iniciais do seu nome ou por apelidos substitutivos à sua real identificação.

No entanto, os dados a serem anonimizados devem fazer parte de um conjunto de informações capazes de identificar os envolvidos nos processos judiciais e não somente seus nomes. A existência de informações particularizadas, como endereço, profissão, local de trabalho e demais informações que deram base para a propositura da demanda, são informações personalíssimas suficientes a promoverem a identificação das partes e que por esta razão, também devem ser ocultadas.

Desse modo, sendo o processo informatizado realidade no Brasil, é necessário garantir ao cidadão a possibilidade de estar em juízo sem que hajam prejuízos decorrentes da exposição de informações intimas e privadas, o que encontra amparo no avanço tecnológico com a adoção dos mecanismos propostos, ideais para promoção da publicidade processual de forma relativizada, preservando as demais garantias apontadas neste estudo.

Importante destacar que, na atividade jurisdicional, deve-se fiscalizar a atuação do Poder Judiciário e não a vida das partes. Não importa conhecer quem está sendo julgado e sim como é julgado. Por fim, vale salientar que anonimizar não equivale a ocultar. Ao contrário. Com a inserção desse recurso no processo judicial informatizado haverá uma expressão otimizada da publicidade, numa elevada demonstração de transparência.


Autores

  • Brave

    é advogado formado pela PUC-MG, membro do Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico, Coordenador de TI do Grupo de Pesquisa da Escola Judicial do TRT-MG 'Justiça e Direito Eletrônicos', Programador de Computadores e autor do Livro Publicidade no Processo Judicial Eletrônico.

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!