Consultor Jurídico

Sem caráter empresarial, fundos de pensão não recolhem PIS e Cofins

13 de outubro de 2009, 6h21

Por Rafael Fiuza Casses

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Muito se tem comentado sobre a “recente” posição do Supremo Tribunal Federal, nas tintas do seu ilustre ministro Cezar Peluso, quanto à conceituação da base para incidência das contribuições sociais do PIS e da Cofins. O recente posicionamento na realidade já havia sido manifestado quando dos julgamentos pelo Supremo dos recursos interpostos pelos contribuintes e que culminaram com o reconhecimento da inconstitucionalidade do artigo 3º da Lei 9.718 e na definição de que faturamento deve ser entendido apenas como a receita de venda de mercadoria, de serviços ou da combinação de ambos.

Na oportunidade, porém, o ministro Cezar Peluso já se manifestara no sentido de que modernamente não se pode restringir o conceito de faturamento aos rendimentos decorrentes de operações que resultem na emissão de faturas, posto que se trataria de um conceito mercantil demasiadamente ultrapassado e não seria capaz de apreender muitas operações com igual significado presuntivo de riqueza.

Os astutos e incansáveis representantes da Fazenda Nacional vêm há muito tentando reabrir o debate acerca da base de cálculo do PIS e da Cofins, o que se tinha até então por encerrado com o bater do martelo da Corte quando do julgamento do RE 346.084/PR. Assim é que o entendimento aqui comentado vem sendo cada vez mais defendido, na esteira de ideias de que o conceito de faturamento para incidência do PIS e da Cofins são todos os rendimentos decorrentes da atividade empresarial típica, o que acabaria retornando a algo muito próximo ao conceito de faturamento trazido originalmente pela própria Lei 9.718 tida por inconstitucional.

Aliás, ainda a esse respeito, é importante notar que o próprio ministro, quando do julgamento do leading case já apontado aqui, em seus esclarecimentos, deixa transparente que não pretende equiparar faturamento a qualquer entrada, mas sim incluir no seu conceito as remunerações de serviços que sejam entendidas como receitas financeiras.

Passando-se ao largo da discussão sobre o acerto ou não desse entendimento, uma vez revelados os interesses em jogo, parece importantíssimo delimitar-se o seu preciso alcance para que não se volte a cometer ilegalidades neste campo, a pretexto da famigerada necessidade arrecadatória.

De plano, nota-se no entendimento emanado pelo ministro a existência de conceitos que contêm importante carga semântica a ser considerada quando de sua interpretação e aplicação, qual seja: atividade empresarial típica. Pode surgir alguma confusão em razão da equiparação que a legislação tributária e a própria Lei 9.718 fazem entre as instituições financeiras e os fundos de pensão, porém tal equiparação não se presta para fins de classificação da natureza de suas atividades. É dizer, a previsão legal que visa facilitar a cobrança, arrecadação e fiscalização de tributos não é autorizada a alterar a natureza jurídica da atividade.

Firme nesse ponto, é de se perceber que os fundos de pensão não exercem atividade empresarial, muito diferentemente das entidades abertas de previdência e as seguradoras, estas sim instituições tipicamente financeiras que assumem inclusive a forma de sociedades anônimas. Os fundos de pensão possuem definição e são regidos por normas rígidas encontradas na Lei Complementar 109. É nesta legislação que se deve buscar fundamento para definição das atividades dessas entidades suis generis.

A Lei Complementar 109 estabelece com clareza que os fundos de pensão “organizar-se-ão sob a forma de fundação ou sociedade civil, sem fins lucrativos”. Ou seja, já aí fica evidente a inexistência de natureza empresarial dos fundos de pensão, que nas lições da doutrina mais abalizada é a atividade econômica organizada, com caráter de continuidade, para a produção ou circulação de bens ou serviços e tendo como elemento essencial, ou até mesmo razão de ser, a busca pelo lucro.

Aliás, ainda que não se levasse em conta a inexistência de atividade empresarial típica por parte dos fundos de pensão, a própria legislação já reconhece a não incidência do PIS e da Cofins sobre essas entidades. É o que se conclui da combinação do inciso III, parágrafo 6º do art. 3º da Lei 9.718, que determina a exclusão da base de cálculo do PIS e da Cofins os resultados de aplicações financeiras vertidos aos planos de previdência sob sua administração, com o parágrafo 1º do art. 69 da Lei Complementar 109, que veda a incidência de tributos e contribuições de qualquer natureza sobre as contribuições destinadas ao custeio dos mesmos planos; as duas únicas fontes de receita dos fundos de pensão.

Por essas conclusões fica o alerta aos aplicadores do Direito no sentido de que o conceito de atividade empresarial contido nas recentes manifestações do Supremo Tribunal Federal nas questões que envolvem o PIS, a Cofins e suas bases de cálculo, não pode ser alterado ao alvedrio do intérprete, menos ainda desconsiderado, sob pena de desrespeito, em última análise, às próprias bases do Estado Democrático de Direito.