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A natureza jurídica das gueltas

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8 de outubro de 2009, 6h55

Gueltas são prêmios pagos por fornecedores a empregados de terceiros a título de incentivo de vendas. Tal prática nasceu no mercado farmacêutico, na década de 60, quando os balconistas recebiam comissão diretamente do laboratório farmacêutico por quantidade de medicamentos vendidos. E, hoje, tornou-se comum e usual em diversos ramos do comércio.

As gueltas assemelham-se às gorjetas pelo fato de ambas englobarem valores pagos por terceiros alheios à relação laboral (naquelas pelos fornecedores, nessas pelos clientes) diretamente ao empregado ou repassados pelo empregador. E, devido a tal similitude, aliada à habitualidade e constância no meio mercantil, eclodiu a polêmica quanto à natureza jurídica daquela.

Para muitos, as gueltas são vistas apenas como um plus na composição da remuneração do trabalhador, não possuindo qualquer natureza salarial, pelo simples fato de ser quitada por terceiro alheio à relação empregatícia — tendo, inclusive, já se posicionado os nossos tribunais em tal sentido: “A parcela denominada guelta não tem natureza salarial quando a prova dos autos sinaliza que era quitada pelos fornecedores no intuito de fomentar as vendas de seus produtos comercializados no estabelecimento comercial da reclamada através do incentivo pecuniário aos vendedores que privilegiam determinada marca em detrimento das demais, quando da oferta aos clientes. Destarte, na forma do disposto no artigo 457 da CLT, não se compreende na remuneração o pagamento de prêmios e vantagens, mesmo que habituais, que não eram quitados diretamente pelo empregador” (RO/16159/02 – TRT 3ª R – 7ª Turma — relator juiz Manoel Barbosa da Silva — DJMG 18-02-03).

Em contrapartida, muitos entendem que, sendo as gorjetas parte integrante do salário, nos termos esculpidos na norma do artigo 457, da CLT, por analogia a mesma sorte deveria ser aplicada às gueltas. Ocorre que, muito embora haja a aludida semelhança entre os dois institutos, cabe esclarecer que, em regra, as gueltas não devem ser enquadradas como parcela de natureza salarial, sendo de fato apenas espécie de brinde pecuniário ofertado pelos fornecedores aos empregados das lojas que fomentam vendas de seus produtos.

Da análise dos precedentes acima citados, extrai-se que as gueltas são consideradas parte integrante da remuneração do obreiro somente quando a empresa empregadora tem alguma forma de ingerência sobre o processo de premiação, tal como: além de consentir com a prática, intermediar o repasse da bonificação do fornecedor para o obreiro, negociar, encaminhar listas e controles de vendas ao fabricante, entre outras interferências.

Por conseguinte, entende-se que não havendo intervenção do empregador no processo de bonificação, ou seja, na relação mercantil existente entre o fornecedor e o empregado do estabelecimento comercial, não há que se atribuir natureza salarial às gueltas. Portanto, nota-se que a sorte atribuída as gueltas tem relação direta com a contribuição ou não do empregador na instituição, desenvolvimento e aplicação delas. Assim, é imprescindível que o empregador, sabendo da existência da aludida prática dos fornecedores para com os funcionários de sua empresa, permaneça o mais afastado possível dessa relação firmada entre ambos, não participando do pacto sob qualquer forma. Do contrário, o que surgiu apenas como um plus auxiliar para remuneração restará caracterizado como parcela integrante do salário.

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