Exportação de serviços

TRF-4 proíbe tributação sobre remessas ao exterior

Autor

  • André Ricardo Passos de Souza

    é advogado e sócio fundador do escritório Buranello e Passos Advogados MBA em Finanças e Mercado de Capitais – MP/FGV/BANCOBBM e LLM em Direito do Mercado Financeiro e de Capitais – IBMEC/SP

6 de outubro de 2009, 6h02

Em recente decisão proferida nos autos da Apelação Cível 2002.71.00.006530-5/RS o Tribunal Regional Federal da 4ª Região derrubou entendimento que há muito vinha sendo aplicado pelas autoridades fiscais federais no trato das questões em torno da tributação pelo Imposto de Renda na Fonte das remessas feitas por pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil a prestadores de serviços sediados no exterior.

A determinação para a tributação destas remessas decorria de entendimento consolidado pelo fisco brasileiro por meio do Ato Declaratório (Normativo) COSIT 1, de 5 de janeiro de 2000, no sentido de que os contratos de assistência técnica e de serviços técnicos sem transferência de tecnologia e não sujeitos à averbação no Instituto Nacional da Propriedade Industrial estariam sujeitos à tributação na fonte pelo Imposto de Renda na forma do disposto no artigo 685, inciso II, do Regulamento do Imposto de Renda (RIR/99).

Ocorre que há algum tempo as empresas tomadoras de serviços no exterior vêm questionando a legitimidade desta cobrança no caso das remessas feitas a empresas estrangeiras prestadoras destes serviços que se encontram sediadas nos países com os quais o Brasil mantém tratado para evitar a dupla tributação da renda.

Na doutrina há certo consenso acerca do tema, na medida em que os especialistas no assunto há muito vêm afirmando que o modelo de tratado escolhido pelo Brasil para reger as relações econômicas transnacionais entre indivíduos das nações signatárias, não contempla a tributação pelo país remetente das rendas decorrentes de prestação de serviços em determinado país quando o estrangeiro prestador do serviço não possui no Brasil estabelecimento permanente a justificar a cobrança de imposto sobre a renda incidente nessas remessas.

Em outras palavras, a convenção modelo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, que foi aquela adotada pelo Brasil e firmada com mais de 27 países, em sua maioria, nações desenvolvidas tecnologicamente, não permitiria a tributação pelo país de remessa dos recursos sobre o valor pago por serviços prestados por estrangeiros não sediados e nem estabelecidos naquele país remetente dos recursos.

Isto porque, ao tratar destes rendimentos, a convenção modelo da OCDE os situa em seu artigo sétimo que trata de “business profits” que, na tradução livre, pode ser entendido como “resultados do negócio” e que, por ser a regra considerada como “coração” da convenção modelo da OCDE, protege o país sede da empresa geradora dos “resultados do negócio” de qualquer interferência em sua ordem jurídica interna do país de remessa ou recebimento destes “resultados do negócio”.

Os demais rendimentos tratados na convenção modelo da OCDE tais como aqueles decorrentes de juros, royalties ou dividendos, que a doutrina classifica como rendimentos de “renda passiva” (passive income) a rigor, podem ser tributados pelo país de residência do recebedor dos rendimentos ou pelo país remetente dos recursos, diferentemente dos rendimentos decorrentes de negócios (business profits) que o modelo convencional da OCDE buscou proteger para evitar interferências indevidas nos negócios praticados em bases mundiais pelas empresas transnacionais de seus países membros.

Desta forma, ao buscar a tributação de parcela dos “resultados dos negócios” dos prestadores de serviços internacionais não situados no Brasil como se fossem “renda passiva” destes estrangeiros, o fisco brasileiro acabava por incorrer em flagrante ilegalidade ao determinar a tributação de tais valores no caso das remessas para pagamentos de serviços feitas por empresas brasileiras a seus prestadores de serviços sediados em um dos 28 países com os quais o Brasil mantém tratado para evitar a dupla tributação da renda, fator que levou algumas empresas brasileiras, na qualidade de responsáveis pela retenção e pagamento do imposto e, em última instância quem arcava com o ônus da cobrança destes impostos, a buscar nos tribunais a proteção ao seu direito de não reter na fonte imposto no caso destes pagamentos.

Em matéria de Direito Internacional Tributário tais convenções são entendidas como normas especiais em relação às normas genéricas de direito interno, razão pela qual suas disposições, conforme farta jurisprudência já consagrada pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal, se aplicam em detrimento das normas de direito interno nos casos por elas regulados.

Destarte, a decisão em comento representou um marco no âmbito da tributação mundial da renda das empresas transnacionais que prestam serviços a pessoas jurídicas no Brasil, pois sinalizou que o Poder Judiciário está disposto a fazer valer as normas de Direito Internacional consagradas e ratificadas pelo nosso ordenamento local, tudo em homenagem à legalidade e a soberania que devem pautar as relações internacionais firmadas e mantidas pela República Federativa do Brasil.

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