Reserva legal

As posições da CNA sobre meio ambiente e a lei

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20 de novembro de 2009, 6h04

A ilustre senadora Kátia Abreu (DEM-TO), que preside a prestigiosa Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), escreveu, há pouco, em O Estado de S. Paulo, que não temos políticas internas adequadas no que se refere às questões da defesa do meio ambiente, porque maculadas por frivolidades, como a traduzida na intenção brasileira de se comprometer, em copenhague, a reduzir 40% das emissões de CO2 na atmosfera, num determinado período.

No lugar de convenções internacionais, nas quais disse não enxergar efetividade futura para a solução de problemas, pregou certeza de advento de resultados positivos somente quando decorrentes de consenso interno baseado em adequadas políticas, em cada país. E foi no sentido de "políticas internas adequadas" que disse estar a propor mudança no Código Florestal, "para dispensar os produtores da obrigação de recompor as áreas que exploram", mantido, porém, seu dever, no que tange à chamada “área de preservação permanente”, aquela que fica geralmente às margens de curso d’água e outras áreas sensíveis.

Não é de se entender que a senadora Kátia Abreu ignora todo o amplo alcance contido na expressão “meio ambiente”, do ponto de vista natural, urbano ou cultural, mas – e isto é diferente – pareceu pretender limitar tudo o que está em causa numa tal matéria à defesa de suposto direito de agricultores e pecuaristas a não terem de cumprir aquilo que disposto na lei sobre “área de reserva legal”. Limitação equivalente, mutatis mutandis, àquela que imprimiu aos acordos internacionais, esquecida do papel desempenhado por eles, no passado e no presente, no combate à poluição e nos esforços para a preservação da natureza. 

À guisa de exemplo, poderia lhe ser lembrado o já agora velho tratado concluído no distante ano de 1754 entre a Áustria e a então República de Veneza para proibição de qualquer equipamento de pesca suscetível de obstruir a livre circulação de água, como mencionado por Fromageau e por Guttinger, quando versaram sobre o direito internacional do meio ambiente. Tratado seguido de tantos outros, que concretos resultados têm produzido, como o de proteção dos mares, o de proteção das aves úteis à agricultura (convenção de paris de 19 de março de 1902), a convenção dos mamíferos marinhos.

Certamente, na sua não feliz colocação, Kátia Abreu também preferiu se olvidar do extraordinário trabalho que, nas últimas décadas, desempenha a Oorganização das Nações Unidas, pela obtenção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, com relevância para as Convenções de Viena e de Montreal sobre a camada de Ozõnio, em 1985 e em 1987, e mais amplamente com o acordo de Estocolmo, no ano de 1972, o do Rio de Janeiro, no ano de 1992, o subsequente, em Kyoto, e o vindouro, no final deste ano de 2009, na Dinamarca. 

O que está no código florestal, basicamente, é apenas o que se teria buscado alcançar, ao longo dos vários governos em que passou por algumas modificações, até chegar à redação que hoje apresenta, a saber, a implementação daquilo que resultou dos tratados internacionais e das indicações da ciência para combater a poluição e preservar a natureza, em regime de compatibilização com o desenvolvimento sustentável e de respeito para com o princípio da livre iniciativa, nos termos, aliás, do que também disposto na Constituição da República e na Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a política nacional do meio ambiente.

Quando se fala em meio ambiente se há de pensar no meio em que situados os seres animados e inanimados e se tem de reconhecer que suas condições dependem fundamentalmente, embora não exclusivamente, da iniciativa dos primeiros. Entre essas iniciativas se situam aquelas que operam no sentido da preservação e as contrárias a isso.

Querer abolir a obrigação legal da ‘reserva legal’, de que se ocupa o código florestal, Lei 4.771/65, no artigo 16, com as múltiplas facilidades que para isso concede, significa ir de encontro à tentativa de obtenção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Vale dizer, o mesmo que ir contra o objetivo de se conseguir melhores condições para a vida na terra, pelo qual estão a se bater, em conjunto, todos os povos e países, em maior ou menor grau, para proteção das presentes e futuras gerações. 

A produção pela terra tem que ser louvada, sem ela não se vive, mas é preciso se ressaltar, como consta no artigo 1º. do Código Florestal, que a reserva legal é a “área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas”, sem o que se torna impossível a própria atividade humana.

Botar-se de lado, singularmente ou em condomínio, uma determinada percentagem do imóvel para se constituir a “reserva legal”, cuja vegetação não pode ser suprimida, mas pode ser utilizada sob regime de manejo florestal sustentável, constitui medida que, longe de ferir direitos de dignos produtores agropecuários, que continuam proprietários ou possuidores da coisa, opera no caminho da realização da defesa da vida de todos, mostrando-se em pleno entendimento com as aspirações gerais. 

Cabe assinalar que, na Europa, como também nos Estados Unidos, na Austrália, Nova Zelândia, Japão, China, preservação de bosques e reflorestamento andam de mãos dadas há tempos e que o que se deve concluir, em se tratando de “reserva legal”, é que nisto se tem, verdadeiramente, no Brasil, mais um país voltado para a realidade do que pode ser feito para o bem de seus filhos e da humanidade.

Quanto a eventuais frivolidades de autoridades governamentais de momento. não devem afetar o essencial e razoável, a tentativa de se chegar a resultados comuns no que tange aos interesses também comuns, não obstante a necessidade de imposição de sacrifícios e restrições, cujo endereço vem a consistir na subsistência da humanidade.

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