SEGUNDA LEITURA

Cinema pode ser opção para ensinar Direito

Autor

  • Vladimir Passos de Freitas

    é professor de Direito no PPGD (mestrado/doutorado) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná pós-doutor pela FSP/USP mestre e doutor em Direito pela UFPR desembargador federal aposentado ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Foi secretário Nacional de Justiça promotor de Justiça em SP e PR e presidente da International Association for Courts Administration (Iaca) da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibrajus).

15 de novembro de 2009, 11h15

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A tradição no ensino do Direito é um professor sentado em um cadeira, braços apoiados em uma mesa, a explicar a matéria do dia. Docentes mais jovens movimentam-se pela sala, escrevem no quadro (outrora negro) e tentam envolver os estudantes. Às vezes, exploram recursos tecnológicos, como o “power-point”. Nos cursos preparatórios para exame da OAB ou concursos, os professores são mais ágeis, exploram a expressão corporal, falam alto e fazem graça.

Em tudo isso, uma coisa é certa: não há mais lugar para aulas expositivas, na forma tradicional. As novas gerações, criadas olhando um computador, habituadas ao visual e não à escrita, trocaram os jornais pelos sites e não se acomodam mais nas cadeiras ouvindo um professor a “deitar falação” (expressão tão antiga quanto este tipo de aula). Pois bem, como forma de despertar o interesse do estudante, ou mesmo de ampliar a cultura, é possível recorrer-se a outros métodos. Vejamos.

A música pode ajudar o acadêmico a compreender a evolução da matéria. Por exemplo, “Saudosa maloca”, de Adoniram Barbosa, poderá auxiliar na explicação do início dos problemas de moradia nos centros urbanos. “Canudo de papel”, de Martinho da Vila, indicará o início da proliferação dos advogados e o conseqüente problema do mercado de trabalho.

Na literatura há muito que aprender. Desde Graciliano Ramos, em “Memórias do cárcere” até os livros de John Grisham, que dão uma ampla visão do sistema judiciário norte-americano. Sua obra “O Recurso” mostra como grupos econômicos interferem na eleição de membros de Tribunais Estaduais.

Mas é o cinema que permite, com mais facilidade, difundir o estudo do Direito. De forma agradável e útil. Obviamente, é preciso que a Faculdade forneça a tecnologia necessária. É preciso tela grande, bom som e depois uma mesa onde 1 professor, 1 aluno e 1 convidado possam debater o que foi visto. Vejamos alguns filmes interessantes.

A questão dos Direitos Humanos poderá ser avaliada no excelente filme argentino, “A história oficial”, do diretor Luis Puenzo, com os atores Héctor Alterio e Norma Alejandro. Baseado em fatos verídicos, trata dos bebês que foram retirados dos pais que se opunham ao regime militar, nos anos 1970, e entregues a outras pessoas.

O Direito Constitucional e os Direitos Humanos podem ser avaliados no filme de Costa Gravas, “Sessão Especial de Justiça”. Durante a Segunda Guerra Mundial, na ocupação da França pelos nazistas, criou-se um Tribunal especial para julgar os que se opunham ao novo regime. Os julgamentos eram direcionados e as condenações se sucediam. Inclusive à pena de morte.

O crime organizado pode ser avaliado com o magnífico filme “Excellent cadavers”, do Diretor Ricky Tognazzi, que conta a história real do juiz Giovanni Falcone, da Itália, que se propôs a combater a Máfia e foi, por ela, assassinado na cidade de Palermo, na Sicília. O filme tem que ser adquirido pela internet e é falado em espanhol.

Os contratos no Direito Civil podem ser analisados através da obra de Shakespeare, “O Mercador de Veneza”, do diretor Michael Radford com Al Pacino. Nela é feito um empréstimo em dinheiro, cujo pagamento o devedor fará com a  carne de seu corpo.

Jornalismo e Direito, como duas estradas paralelas, são vias próximas que não se comunicam. O filme “O povo contra Larry Flynt“, dos Estados Unidos da América, Diretor Milos Forman, ator Woody Harrelson, trata de história real do famoso editor da revista Hustler  acusado de publicações pornográficas.

O Direito Penal tem centenas de bons filmes. Para ficarmos no Brasil, “Meu nome não é Johnny”, do diretor Mauro Lima, com o ator Selton Mello, retrata caso real em que um jovem de classe média envolve-se com o uso de entorpecentes, passa ao tráfico, acaba sendo preso e cumprindo pena em um presídio no Rio de Janeiro. O filme permite a abordagem, também, do Direito de Família, ou seja, até que ponto a desagregação familiar contribuiu para o trágico desfecho.

“Salve Geral, o dia em que São Paulo parou”, do diretor Sérgio Resende, conta a história do dia em que o crime organizado parou a cidade de São Paulo, através de ataques contra postos policiais, bancos e o comércio, motivados por insatisfações com o sistema prisional. O filme obriga a discutir as péssimas condições dos nossos presídios e a fraqueza do Estado diante da criminalidade organizada.

O Direito Ambiental e o sistema judicial norte-americano podem ser discutidos com a película “A qualquer preço “, Diretor Steven Zaillian, com John Travolta. Cuida-se de caso verídico em que um advogado assume a causa de vítimas de câncer por envenenamento das águas e do solo em uma pequena comunidade no Estado de Massachusetts.

Como estes, há outros tantos filmes excelentes, como “Erin Broncovitch”, com Júlia Roberts, “Class Action” com Gene Hackman, “Amistad”, “Gomorra”, “Mar adentro”, “Tribunal de Nuremberg”, “O longo caminho para casa”, Adeus Lenin”, “Malcom X”, “O triunfo da vontade”, “A lenda das formigas verdes”, “O caso dos irmãos Naves”, “Danton, o processo da Revolução”, “Onze homens e um destino”, “A Marselhesa”, e por aí vai em uma lista sem fim.

Disto se conclui que o formal e intrincado mundo do Direito pode ser explicado, prazerosamente, através do cinema. Aí está um campo que somente agora começa a ser explorado. Aos que se interessarem, o livro do professor Gabriel Lacerda, “Direito no Cinema”, Ed. FGV, é de consulta obrigatória. Bom proveito. E não se esqueçam das pipocas.  

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