Previdência dos advogados

OAB e Aasp agora contestam lei resultado de acordo

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10 de novembro de 2009, 18h35

O silêncio das entidades de advocacia diante da insistência do governo paulista em incluir um artigo questionável na lei que manteve funcionando a Carteira de Previdência dos Advogados de São Paulo foi uma estratégia política, com o intuito de que a lei fosse aprovada. Essa é a explicação para a recente proposta de Ação Direta de Inconstitucionalidade de autoria da Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp) e da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil contra a norma que, há poucos meses, foi tão comemorada e serviu de bandeira para as próprias entidades.

A Lei 13.549/09, sancionada em maio, evitou a extinção sumária da carteira no primeiro semestre, graças a um acordo entre o governo do estado, lideranças na Assembleia Legislativa e entidades de advocacia. A Lei Complementar 1.010/07 extinguiria ao mesmo tempo a carteira e o Instituto de Previdência do Estado de São Paulo (Ipesp), que a administrava. Entre as exigências do governo para voltar atrás e manter a carteira sob sua tutela estava a garantia de que o estado não responderia pelos benefícios pagos ou por qualquer demanda dos segurados.

Na iminência da solução, as entidades de advocacia prefereriram fazer vistas grossas ao artigo 2º, parágrafo 2º, do projeto da Lei 13.549. “Em nenhuma hipótese o Estado, incluindo as entidades da administração indireta, responde, direta ou indiretamente, pelo pagamento dos benefícios já concedidos ou que venham a ser concedidos no âmbito da Carteira dos Advogados, nem tampouco por qualquer indenização a seus participantes ou insuficiência patrimonial passada, presente ou futura”, diz o dispositivo.

A proposta de ADI apresentada ao Conselho Federal da OAB pelas entidades paulistas, no entanto, mostrou que o dispositivo passou longe de ser esquecido. “A inconstitucionalidade era tão gritante que aceitamos no momento da negociação. O mais importante era reverter a decretação da extinção da carteira”, explica o presidente do Conselho da Carteira, o advogado Márcio Kayatt. Segundo ele, os advogados tentaram dissuadir a liderança do governo da ideia, mas não conseguiram.

Agora, o artigo pode ser anulado na Justiça, caso a ADI seja realmente proposta e julgada procedente pelo Supremo Tribunal Federal. O primeiro passo já foi dado. A Comissão de Assuntos Constitucionais do Conselho Federal da OAB aceitou, nessa segunda-feira (9/11), o pedido para que o pleno da Ordem analise o parecer que propõe a ADI. A votação no pleno pode acontecer na próxima reunião dos conselheiros federais, em dezembro.

“O governo pretende é limitar condenações ao patrimônio da carteira. O que queremos é que o contribuinte tenha as portas abertas para pleitear qualquer direito”, diz Kayatt. O advogado afirmou não temer possíveis retaliações do governo à medida, como uma nova proposta para o fim imediato da carteira. “Esse é um argumento terrorista. Não existe esse risco”, afirma. A revista Consultor Jurídico procurou, na tarde desta terça-feira, a assessoria do líder do governo na Assembleia Legislativa de São Paulo, deputado Vaz de Lima (PSDB), mas não conseguiu contato com o parlamentar até o fechamento da reportagem.

Morte e vida
Hoje numa função próxima à de previdência complementar, a Carteira de Previdência dos advogados foi criada em 1959 pelo governo estadual para ser sustentada pelas contribuições dos segurados e por parte das taxas judiciais recolhidas nos processos. O drama que culminou com o fim da carteira começou em 2003, quando a Lei Estadual 11.608 acabou com o repasse de 17,5% das taxas da Justiça — equivalentes a 85% das fontes de custeio — e a colocou a caminho do défict. A Emenda Constitucional 45/04, a Reforma do Judiciário, deu o golpe de misericórdia ao cravar que a Justiça é a única destinatária legítima das custas judiciais recolhidas.

Como se não bastassem os problemas de liquidez, em 2007, a carteira perdeu ainda seu administrador, o Ipesp. A Lei Complementar 1.010/07 determinou a extinção do instituto e sua substituição pela São Paulo Previdência (SPPrev). Porém, a norma não atribuiu à sucessora a gerência da carteira, colocando os três mil aposentados e pensionistas e os 34 mil advogados que ainda contribuíam numa contagem regressiva para a perda dos benefícios a que tinham direito. A data marcada para o fim do Ipesp foi o dia 1º de junho, quando venceu o prazo de dois anos para que a SPPrev fosse implantada.

O trabalho das entidades representativas da Advocacia para salvar a carteira terminou com a construção de um acordo envolvendo governo do estado, Ministério da Previdência Social, Ipesp e a Assembleia Legislativa, que aprovou, por 75 votos a dois, a Emenda Aglutinativa Substitutiva 60 ao Projeto de Lei 236/09 do Executivo, que propunha a extinção.

Dessa forma, encontrou-se um caminho legal para a continuidade da carteira em regime de extinção, até atender ao último advogado inscrito, numa estimativa de 80 anos. A receita da carteira é constituída pela contribuição dos segurados, taxa de juntada de procuração recolhida pelos advogados, doações, legados recebidos e rendimentos patrimoniais e financeiros.

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