Verdade eterna

ConJur é condenada por manter notícia no site

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9 de novembro de 2009, 17h04

A revista Consultor Jurídico está obrigada a retirar do ar, no prazo de 15 dias, a notícia sobre a condenação por negligência do cirurgião plástico Alexandre Orlandi França, pelo Tribunal de Alçada de Minas Gerais, em 2002. Em caso de descumprimento, a multa diária pode chegar a R$ 6 mil. A decisão é da 2ª Turma Recursal de Belo Horizonte. A ConJur vai recorrer da decisão.

O médico foi condenado a indenizar uma paciente em R$ 25 mil por danos morais e patrimoniais. A paciente sofreu deformações estéticas depois de ter sido operada pelo médico. A ConJur reproduziu a notícia e, como outros 80 mil textos que publicou ao longo de 12 anos, a mantém no ar. A notícia ainda pode ser lida em pelo menos outros dois sites na internet.

No pedido, o médico não questiona a veracidade da notícia, o que foi confirmado tanto pelo Juizado Especial que examinou o caso quanto pela Turma Recursal. O cirurgião plástico alega apenas que o texto foi publicado de maneira resumida, o que não permitiria “ao leitor entender o alcance da condenação, visto que ela não decorreu de ‘erro médico’ e sim do entendimento firmado pelo Judiciário de que a paciente não teria sido informada dos riscos que correria ao se submeter à cirurgia”

O médico também sustenta que a ConJur já cumpriu a sua legítima função de informar a sociedade, não podendo “representar exposição eterna da intimidade e imagem de um indivíduo”.

Em primeira instância, o juiz Márcio Idalmo Santos Miranda diz que "o ponto essencial em debate nos autos consiste em verificar se a manutenção da mencionada notícia representa exercício legítimo da liberdade de imprensa, ou se está a ensejar a indevida violação às garantias de intimidade e imagem do requerente". Depois de constatar que a notícia foi publicada há sete anos, o juiz sustenta que "o direito à informação foi suficientemente atendido, na medida em que tal comunicado ali perdura há tanto tempo. Em outras palavras, quem queria se informar sobreo ocorrido, já o fez. O certo é que perdurando o informe, o prejuízo para o autor é enorme".  E conclui: "O direito à informação, não pode representar exposição eterna da intimidade e imagem de um indivíduo.

Para a Turma Recursal a sentença do Juizado Especial Cível de Belo Horizonte, "não merece qualquer reparo, por ter seu subscritor decidido a lide com acerto e precisão, consoante a melhor doutrina e jurisprudência aplicável ao caso". A turma entendeu que "a primazia conferida pela Constituição ao interesse coletivo, realiza-se pela proteção à necessidade dos indivíduos de receberem informações verdadeiras e capazes de bem expressar o pensamento de quem as produziu, o que não autoriza, contudo, qualquer violação à intimidade ou à privacidade, direitos da personalidade, considerados hierarquicamente superiores a outros direitos".

Matéria lícita
A defesa da revista, representada pelos advogados Alexandre Fidalgo, Rafael Kozma e Daniel Diniz Manucci, do escritório Lourival J. Santos, sustenta que se a notícia é lícita, não é o tempo de permanência da notícia à disposição da sociedade que a torna ilegal, passível de condenação. Ou seja, um texto jornalístico lícito não pode se tornar ilícito pelo tempo em que fica acessível aos leitores.

Os advogados destacam também que, ao contrário do que constou na inicial do médico, o texto noticiou fato verídico, sem máculas, lastreado no julgamento do Tribunal de Alçada de Minas Gerais, hoje TJ mineiro, que efetivamente condenou o cirurgião.

Observam que a sentença, da forma posta, ainda ofende princípios basilares do direito, como o do devido processo legal, da ampla defesa e da fundamentação das decisões judiciais (artigo 5º, inciso LIV e LV, e artigo 93, inciso IX, da Contituição Federal). Citam, ainda, o princípio da liberdade de expressão com base em voto do ministro Celso de Mello, decano do Supremo Tribunal Federal. 

Para o ministro, é preciso intenção de ofender para que um jornal seja condenado por texto publicado, por mais crítico e duro que seja. Não basta que o personagem da notícia se sinta ofendido. “Uma vez dela ausente o animus injuriandi vel diffamandi, a crítica que os meios de comunicação social dirigem às pessoas públicas, especialmente às autoridades e aos agentes do Estado, por mais acerba, dura e veemente que possa ser, deixa de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as limitações externas que ordinariamente resultam dos direitos da personalidade”, esclarece o decano.

Para a defesa, a ofensiva dos julgadores mineiros constitui entendimento censório. “A assim se pensar, seria constitucional também o recolhimento, de todos os sebos e bibliotecas tradicionais do Brasil, das publicações que contenham matérias jornalísticas que, anteriormente lícitas, hoje, por seu caráter ‘perpétuo’, são desonrosas (o que sequer é o caso dos autos). Como exemplo estão as matérias antecedentes ao impeachment do presidente Fernando Collor, que muitas vezes, por retratar a verdade, incomodam os protagonistas daqueles fatos, mas, como dito, são absolutamente lícitas”.

E acrescentam que as notícias do site, como a que se questiona, “foram e continuam sendo lícitas, de modo que constitui ilegalidade, verdadeira censura, a decisão que determina a retirada do site da Recorrente a matéria jornalística em questão, o que, dentro de um Estado Democrático de Direito, é inadmissível”, finalizam.

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