Porta da liberdade

Condenação vira motivo para STJ libertar réu

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7 de novembro de 2009, 5h23

O fato de o acusado ter sido preso em flagrante e ficado na cadeia durante toda a instrução do processo não serve de motivo para se negar seu pedido de liberdade na apelação. É o que entendeu o Superior Tribunal de Justiça, que concedeu Habeas Corpus a um condenado por tráfico de drogas logo depois da sentença condenatória, pelo fato de o juiz não ter fundamentado a manutenção da prisão como manda o figurino.

Mesmo com a repetição do Supremo Tribunal Federal de que a execução da pena deve ocorrer só depois do trânsito em julgado do processo, o juiz José Roberto Cabral Longaretti, da 13ª Vara Criminal de São Paulo, afirmou que não poderia soltar o condenado. A explicação é que seria contraditório ter mantido o réu preso preventivamente durante toda a fase de instrução criminal, e soltá-lo justamente quando a sentença confirmava o crime, e dava a pena. “Uma vez que o réu permaneceu preso durante a instrução do feito, não se justifica sua libertação, agora que condenado, e no regime inicial fechado, o que seria verdadeiramente paradoxal”, disse Longaretti na sentença.

Só que a falta de argumentação convincente causou justamente o que o juiz não queria: a liberdade do réu. A 6ª Turma do STJ ordenou a soltura, com base no voto do ministro Og Fernandes, relator do processo. “Ao menos na sentença, deveria o Juiz ter apontado, para a negativa do apelo em liberdade, a presença de algum dos requisitos do art. 312 do CPP, não bastando a menção de que o paciente permanecera preso durante o processo”, diz o acórdão. A votação unânime aconteceu em 13 de outubro, e a decisão foi publicada na última terça-feira (3/11).

Segundo o ministro Og Fernandes, mesmo para manter a prisão do condenado, o juiz precisa dar explicações. “A liberdade, antes de sentença penal condenatória definitiva, é a regra, e o enclausuramento provisório, a exceção”, disse. “As instâncias ordinárias consignaram que o fato de o paciente ter respondido ao processo preso é fundamento bastante para lhe negar o direito de recorrer solto”, o que, segundo o ministro, não é suficiente. Para ele, era preciso que ficasse “demonstrada de que forma a liberdade do paciente colocaria em risco a ordem pública, a conveniência da instrução criminal ou a aplicação da lei penal, constrangimento que se avulta em se cuidando de réu primário”.

Rota do processo
O estudante J.P.J.R.  foi preso em flagrante, em julho do ano passado, com 124 embrulhos de cocaína, crack e maconha. Por tráfico, ele foi condenado a sete anos de prisão em regime fechado. A sentença foi publicada em 15 de setembro de 2008. O recurso de apelação ainda não foi julgado pelo TJ-SP.

Em outro recurso — um pedido de Habeas Corpus —, a defesa alegou que a fundamentação usada pelo juiz não seguiu o que prevê o parágrafo único do artigo 387 do Código de Processo Penal, incluído no ano passado pela Lei 11.719/08. “O juiz decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento da apelação que vier a ser interposta”, diz o dispositivo. “A sentença é nula”, resume, lacônico, o advogado do estudante, Carlos Alberto Pires Mendes, do escritório Maronna, Stein e Mendes.

Não foi assim que entendeu o Tribunal de Justiça de São Paulo, que julgou o recurso. Apesar de literalmente considerarem “fraco” o argumento do juiz de primeiro grau, os desembargadores acharam o raciocínio aceitável. “Não obstante a parca fundamentação contida na respeitável sentença condenatória (…), faz sentido que agora, que consta com condenação a ser cumprida inicialmente em regime fechado, continue recolhido”, diz o acórdão da 16ª Câmara Criminal, relatado pelo desembargador Pedro Menin.

Para a sorte do estudante, nem todos os julgadores perdoam a economia de palavras dos juízes nas decisões, principalmente das que envolvem liberdade. Nem mesmo membros da própria corte do TJ-SP, como o desembargador Celso Limongi, convocado para atuar no STJ, e que fez parte da turma que votou pela liberdade do acusado.

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HC 125.849-SP

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