Carta de Fortaleza

Em Carta, delegados pedem combate ao crime

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6 de novembro de 2009, 19h18

O combate efetivo a crimes de colarinho branco só vai acontecer quando a polícia tiver o poder de requerer dados e informações às autoridades, quando o processo penal tiver menos brechas para recursos protelatórios, se o Ministério Público atuar em parceria com os policiais e não de forma paralela e o princípio da presunção de inocência não for usado de forma exagerada. Essas foram as conclusões, depois de quatro dias de discussões, dos delegados da Polícia Federal que participaram do IV Congresso Nacional dos Delegados da Polícia Federal, que terminou nesta sexta-feira (6/11), em Fortaleza.

Para disseminar essas ideias, a Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal (ADPF) consolidou a “Carta de Fortaleza”, com todas as mudanças que entende necessária para acabar com a “cultura jurídica de tolerância com o crime do colarinho branco, que gera um abismo social entre os criminosos que são alcançados pela Justiça e os que não são”.

Para ressaltar iniciativas que consideram importantes no combate ao crime, os delegados homenagearam nesta sexta-feira o presidente do Superior Tribunal de Justiça, Cesar Asfor Rocha, e o novo ministro do Supremo Tribunal Federal, José Antonio Dias Toffoli.

Asfor Rocha foi condecorado pela sua iniciativa de digitalizar todos os processos da corte. Para Sandro Avelar, presidente da ADPF, trata-se de uma medida que vai dar celeridade aos processos, porque economiza tempo de transporte e dá, ao mesmo tempo, vistas dos autos para todas as partes do processo.

O presidente do STJ afirma que todo o trabalho deve acabar em fevereiro. Para isso, não gastou mais de R$ 3 milhões. Por ano, se gasta R$ 20 milhões só em Correio. Além dessa economia, o processo que leva oito meses para sair dos estados e chegar ao gabinete dos ministros, vai passar a chegar em cinco minutos. O ministro reconhece que esse trabalho, sozinho, não é suficiente para acabar com a morosidade. Mas é um passo.

Dias Toffoli foi homenageado por aproximar as carreiras que atuam no Judiciário, enquanto foi advogado-geral de União. O delegado Sandro Avelar diz que essa iniciativa foi fundamental para fomentar discussões entre as classes e permitir que cada uma pudesse enxergar o lado do outro. Durante o seu discurso, o ministro afirmou que a cada dia os juízes entendem mais o papel da polícia e que o Judiciário é uma linha de produção e para funcionar bem precisa de diálogo. “A PF é uma parte do todo do Judiciário, coloca a vida em risco e é quem está nas ruas”, disse recebendo aplausos efusivos da plateia de delegados que acompanhava a cerimônia.

Leia a Carta de Fortaleza
CARTA DE FORTALEZA-CE 2009
Os Delegados de Polícia Federal com o objetivo de promover o fortalecimento do Estado Democrático de Direito e a defesa da dignidade da pessoa humana, após o IV Congresso Nacional da categoria, cujo tema central foi Polícia Federal e os instrumentos de combate à impunidade, manifestam as seguintes conclusões:

1. É preciso mudar a cultura jurídica de tolerância com o crime do colarinho branco, que gera um abismo social entre os criminosos que são alcançados pela Justiça e os que não são.

2. Não se pode aceitar a violência social provocada pela corrupção e pela ação de poderosos grupos políticos e econômicos, que se constituem em organizações criminosas altamente lesivas ao interesse público, como algo menos reprovável do que a violência física cometida nos grandes centros urbanos deste país por facções do crime organizado e delinquentes comuns.
 

3. O sistema de persecução penal requer uma reforma legislativa que prestigie o poder de requisição de dados e informações da Autoridade policial e a celeridade da investigação criminal e do processo penal com uma redução significativa de procedimentos e recursos processuais meramente protelatórios e com regras mais rígidas contra a prescrição penal.

4. A realização de investigações de forma isolada e fora do inquérito policial não acrescenta qualquer melhoria ao atual sistema de persecução criminal e causa insegurança jurídica. Pelo contrário, gera indesejável conflito entre instituições que deveriam trabalhar irmanadas. Além disso, não se pode escolher o que investigar, pois não se trata de uma decisão pessoal ou institucional, devendo-se promover a aprovação constitucional da criação do Conselho Nacional de Polícia como o instrumento para a regulação do controle externo da atividade policial.

5. É preciso fortalecer o sistema penitenciário nacional e o seu emprego como mecanismo de combate ao crime organizado, bem como o papel da Polícia Judiciária e dos demais operadores na primeira e na segunda instâncias. Como, por exemplo, diminuindo as hipóteses de foro privilegiado.

6. Não se deve interpretar o legítimo princípio da presunção da inocência de modo exagerado, tomando-o como justificativa para casos de impunidade e injustiça social.

7. A construção de uma Polícia Republicana, que atua a serviço do Estado e não de governos, só será possível com o mandato para o cargo de Diretor-Geral escolhido entre os Delegados de Polícia Federal, o respeito aos princípios basilares da hierarquia e disciplina e mediante autonomia institucional, gerencial, administrativa, orçamentária e financeira da Polícia Federal.

8. A preservação de uma investigação criminal justa, independente e isenta, pressupõe necessariamente a aprovação de uma lei orgânica com um regime de prerrogativas legais garantidoras da autonomia funcional das Autoridades de Polícia Judiciária e o seu resgate constitucional como carreira jurídica.

9. A reestruturação das carreiras da Polícia Federal com uma solução imediata para os policiais federais da terceira classe e a adoção de um plano de cargos e salários que estimule o ingresso nas carreiras policial e administrativa, bem como a permanência no cargo de seus dirigentes, criando a ambiência interna necessária ao exercício das funções de Polícia Judiciária da União. 

10. Uma investigação criminal moderna implica no emprego contínuo de novas técnicas e tecnologias, na coleta de provas, bem como considerável investimento público na tramitação eletrônica, rápida, segura e compartilhada do inquérito e dos procedimentos de inteligência policial.

10. Por fim, disseminar a seletividade conforme o grau de lesividade dos ilícitos penais e a responsabilidade compartilhada entre as autoridades e instituições oficiais encarregadas de investigar e combater os ilícitos administrativos com repercussão na seara criminal, no Brasil e no exterior.

Fortaleza-CE, 6 de novembro de 2009.
ADPF – ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS DELEGADOS DE POLÍCIA FEDERAL
 

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