Herança bendita

TJ-SP faz planos para próximo presidente executar

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1 de novembro de 2009, 9h22

Pela primeira vez na história do Judiciário paulista, os dois próximos presidente do Tribunal de Justiça vão receber das mãos de seu sucessor um plano de gestão para implementar em seus mandatos. A regra é decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que, no início do ano, impôs uma política de metas de gestão a ser seguidas pelas cortes do país. Tudo de acordo com o novo modelo de administração pública elaborado ainda no governo Itamar Franco, sob a batuta de um grupo liderado por Bresser Pereira.

O chamado planejamento estratégico vai buscar um novo modelo administrativo que seja capaz de acelerar a tramitação dos mais de 19 milhões de processos existentes hoje na Justiça estadual, tirar da quase indolência a maior e mais importante corte do país responsável por 49% dos processos que tramitam no Judiciário, dar um upgrade na implantação dos programas de informatização e democratizar o acesso da sociedade ao Judiciário.

O sucessor de Vallim Bellocchi não receberá a casa arrumada, mas pode-se dizer que receberá a faca e o queixo. Nunca um presidente daquela corte pode contar desde antes de assumir o cargo com uma espécie de PPA (Plano Plurianual), regra de finanças e de administração púbica prevista na Constituição de 1988. Esse modelo de gestão já está a pleno vapor no orçamento da União desde 2001, com a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal. O Plano Estratégico do Tribunal de Justiça vai funcionar como um guia, uma ferramenta para as próximas gestões concentrar seus esforços administrativos na prestação de uma Justiça mais célere.

Além disso, os futuros presidentes não terão que passar pelos mesmos vexames de seus antecessores. No chamado período de transição, entre a vitória e a posse, os antigos ocupantes da chefia do maior Tribunal do país não sabia como fazer seu programa de gestão, pois faltavam dados confiáveis. Nem sequer tinham uma sala apropriada para receber e discutir com seus futuros auxiliares. Eram obrigados a se valor da boa vontade amigos que emprestados seus gabinetes à equipe de transição, como aconteceu com o atual presidente que passou a despachar no gabinete do presidente da Seção de direito Público. Num quando tão mesquinho mal havia condições para montar a equipe de “governo”.

Agora, o Conselho Nacional de Justiça baixou outra regra, por meio de resolução, que define como se dará o processo de transição no comando dos tribunais do país. A norma será regulamentada por resolução do Conselho Nacional de Justiça. A regra pretende garantir aos novos dirigentes eleitos informações necessárias à elaboração e implantação dos seus programas de gestão, com o objetivo de contribuir para a continuidade administrativa nos tribunais 

De acordo com o CNJ, a resolução do CNJ prevê ainda que caberá aos atuais presidentes entregar aos eleitos relatório com informações sobre o planejamento estratégico, a estatística processual, o resumo do trabalho das comissões permanentes e de projetos. O documento também deve relatar o orçamento especificando as ações e programas em andamento, incluindo pedidos de créditos suplementares.

No caso do Tribunal de Justiça de São Paulo, o presidente Vallim Bellocchi pretende apresentado o Planejamento Estratégico 2010-2014 logo depois do resultado das urnas. Para isso pretende aprova-lo até o final de novembro. O cumprimento do prazo vai depender da agilidade do Órgão Especial.

O avanço no modelo de gestão vai exigir desenvoltura dos futuros dirigentes do Tribunal paulista e obrigar a alta e média burocracia a se familiarizar com novos termos e práticas como planejamento, alocação de recursos, ações transparentes, prevenção de riscos, correção de desvios e administração gerencial. 

É um choque de proporções próximas ao que aconteceu há 20 anos, quando a União conheceu o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Pelas novas regras, o Tribunal terá de jogar na lata do lixo o tradicional orçamento – documento que se preocupava apenas com previsão de receitas e autorização de despesas – para colocar no lugar um orçamento programa, de ações bem definidas e vinculadas a um planejamento público, com objetivos e metas a alcançar no exercício de sua execução.

Além disso, o novo modelo terá de estar em sintonia com o plano estratégico elaborado para servir de orientação para um período de médio prazo de gestão. Será o cartão de entrada do centenário tribunal na era da justiça gerencial. Uma revolução medonha para uma instituição corporativa, avessa ao planejamento, a lidar com estatísticas, a compartilhar informações com a sociedade e a trabalhar com foco no resultado de sua atividade fim: a prestação de uma justiça de excelência e que posse ser, em futuro próximo, referência no Brasil. Será a Justiça administrada com modernas técnicas de gestão gerencial. 

O relatório incluirá o detalhamento da estrutura organizacional do tribunal, com dados sobre pessoal, cargos ocupados e vagos, servidores inativos, pensionistas e contratados temporariamente. O documento deverá ter, também, a relação dos contratos em vigor e prazos de vigência, as sindicâncias e processos administrativos disciplinares internos e a situação atual das contas do Tribunal junto ao Tribunal de Contas do Estado. 

Esse relatório terá de ser entregue em até 10 dias depois da eleição. A minuta do plano estratégico para o período de 2010 a 2014 já está pronto para ser aprovado pelo Órgão Especial. Será a primeira vez que a próxima direção do Tribunal de Justiça, que assume a partir de janeiro, terá em mãos os rumos traçados por uma equipe de técnicos e desembargadores dizendo o rumo geral a seguir e as áreas prioritárias para investimentos. 

Pelo plano, o Judiciário paulista quer aumentar a prestação de justiça em 20% na primeira instância e de 30% no segundo grau nos próximos cinco anos. A meta está traçada na minuta do plano estratégico, elaborado por técnicos e desembargadores que integram o Núcleo de Planejamento e Gestão do Tribunal de Justiça de São Paulo. O plano montado com 21 intervenções tem previsão de ser concluído até o final de 2014. 

Entre as metas se destacam a instalação de pelo menos duas câmaras digitais, o remanejamento de servidores, controle dos processos nas mãos dos desembargadores, contratação de mais assessores para o segundo grau, criação da escola paulista de servidores da magistratura e a instalação do portal de custas do tribunal que vai divulgar atos e processos em tempo real. 

O plano de metas reconhece a precariedade do sistema que controla os precatórios. Para solucionar o problema, o Tribunal quer, no prazo de dois anos, ter instalada uma ferramenta informatizada de controle das decisões e pagamentos das dívidas judiciais. 

“O Tribunal de São Paulo conta com sistema extremamente precário de controle dos precatórios”, diz a minuta do plano. “Assim, para garantir a efetividade de suas decisões, é necessário que invista em tal setor, dotando-o de instrumentos adequados para que possa controlas todas as dívidas de Estado e Municípios, como, aliás, exige a Carta Magna”, completa o documento. 

O plano também traz como meta acabar com a falta de comunicação processual entre as comarcas do estado. A previsão é de até 2014 interligar, num sistema único de gerenciamento de processos, todas as varas da justiça estadual. 

O Tribunal pretende aplicar o conjunto de propostas anunciadas no plano com uma distribuição inteligente de recursos financeiros, humanos e tecnológicos. Com a estratégia, espera aumentar a produtividade e melhorar a qualidade dos serviços prestados à população. O TJ paulista quer, ainda, criar indicadores capazes de medir o desempenho da instituição, principalmente de servidores, juízes e desembargadores, principais responsáveis pela distribuição da Justiça. A tarefa não será fácil. 

O plano reconhece a dificuldade. Tanto que mapeou os problemas que poderão ser encontrados pelo caminho. A principal ameaça seria, de acordo com o diagnóstico, a falta de recursos e os seguidos cortes no orçamento. O Tribunal reconhece, ainda, que sua falta de habilidade para se comunicar com a sociedade é outro gargalo para o bom desempenho do que está sendo planejado para os próximos cinco anos. 

Os outros obstáculos apontados pelo plano estratégico são: o agravamento dos problemas sociais, a superpopulação carcerária e falência do sistema prisional, legislação processual desatualizada e o aumento em disparada dos litígios. 

O planejamento estratégico elaborado pela direção do Tribunal paulista obedece a Resolução 70, do Conselho Nacional de Justiça. A norma do CNJ definiu um roteiro de gestão administrativa que deve ser seguido pelos tribunais brasileiros. O conteúdo da resolução foi confirmado, em fevereiro, durante o II Encontro Nacional do Judiciário, que reuniu os presidentes das cortes do país. 

A Resoluçã 70 reúne dez metas estipuladas para os tribunais em 2009. Os temas — como garantir agilidade aos processos, acesso à Justiça e informatização — não são novidade, mas alinham as cortes em um único propósito na prestação dos serviços jurisdicionais. De acordo com a norma, os planos estratégicos dos tribunais devem ser aprovados até 31 de dezembro. 

A norma ainda determina que o planejamento deverá ter, pelo menos, um indicador de resultado para cada objetivo estratégico, metas de curto, médio e longo prazos, associadas aos indicadores de resultado e projetos e ações necessários para atingir cada plano traçado. Os tribunais que já tiverem suas metas deverão adequá-las ao chamado Plano Estratégico Nacional. 

Diante das metas e prazos estabelecidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do planejamento estratégico elaborado pelo Núcleo de Planejamento e Gestão do Tribunal de Justiça de São Paulo e, agora, por uma resolução disciplinando como acontecerá a transição de uma gestão para outra, uma questão salta aos olhos: como foi possível, depois de nove anos da Lei nº 101/2000 – a chamada Lei de Responsabilidade Fiscal – o Judiciário paulista existir e funcionar de improviso, sem planejamento estratégico?  

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