Castelo de Areia

Empreiteira é acusada de desfalcar União em R$ 71 mi

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26 de março de 2009, 16h31

As investigações da Polícia Federal contra a empreiteira Camargo Corrêa identificaram doações ilegais a pelo menos sete partidos políticos, além de crimes como remessas ilegais de dólares ao exterior e superfaturamento de obras públicas. A Operação Castelo de Areia, deflagrada pela Polícia Federal, nesta quarta-feira (25/3), encontrou ligações tidas como suspeitas da empresa com o PSDB, PMDB, DEM, PPS, PSB, PDT e PP. Foram presos, em São Paulo e no Rio de Janeiro, quatro diretores e duas secretárias da empresa, além de três supostos doleiros e o suiço Kurt  Paul Pickel acusado de ser um dos articuladores do esquema.

O juiz Fausto Martin De Sanctis, da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, que concedeu os mandados de prisão, também ordenou a quebra do sigilio bancário e fiscal e o bloqueio de contas bancárias dos acusados, além da apreensão de documentos e computadores. A empreiteira é acusada de superfaturar obras públicas em R$ 71 milhões, e de enviar dólares ilegalmente ao exterior em valores que podem chegar a R$ 30 milhões.

Escutas telefônicas gravadas pela PF identificam também conversas entre o vice-presidente da empreiteira, Fernando Botelho, com um dos diretores presos, Pietro Bianchi. Nelas, o vice-presidente avisa que o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, estaria reclamando da demora do envio de dinheiro pela empresa. Skaf, apontado como possível candidato ao governo paulista em 2010, era, segundo a Polícia, o intermediário entre a empreiteira e os partidos. O diretor de Assuntos Institucionais da companhia, João Auler, é quem fazia o intercâmbio entre a empresa e a entidade, segundo a PF.

A Fiesp, em nota, negou qualquer intermediação com partidos políticos. "A Fiesp não se envolve, de maneira alguma, em eventuais relações entre empresas do setor que representa e partidos políticos ou os candidatos deles”, diz a nota.

Em outra conversa, Bianchi avisa outro diretor, Dárcio Brunato, de que o pagamento havia sido feito. "Foram R$ 300 mil para Agripino e partido" e "outros 200 para Flexa Ribeiro”. Agripino seria o senador José Agripino Maia (DEM-RN). Flexa Ribeiro é senador do PSDB no Pará. Os tucanos paraenses teriam recebido outros R$ 300 mil, segundo as escutas. Os dois senadores confirmaram o recebimento dos valores, mas disseram que tudo foi registrado de acordo com a lei eleitoral.

A polícia também encontrou, na casa de um diretor da divisão de Controladoria, Dárcio Brunato, listas com nomes de políticos e funcionários públicos que teriam sido beneficiados. A lista inclui também membros do Tribunal de Contas da União. Os demais diretores presos foram Fernando Dias Gomes, diretor regimental da Diretoria de Auditoria e Controles, Raggi Badra Neto e o ex-diretor e hoje consultor, Pietro Francesco Giavina Bianchi. As secretárias foram Darcy Flores Alvarenga e Marisa Berti Iaquinto. Todos terão Habeas Corpus pedidos pelo advogado Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, que afirmou não entender qual a necessidade das prisões preventivas.

“Essas prisões se mostraram necessárias em face do elevado grau de articulação que essas pessoas demonstraram, inclusive com a utilização de apelidos, com nomes de animais, telefones criptografados e outros sistemas que realmente evidenciam que a finalidade é evitar que essas conversas sejam, de alguma forma, captadas pelas autoridades policiais”, justificou a procuradora da República Karen Kahn aos jornalistas.

O juiz Fausto De Sanctis também entendeu dessa forma. “Os alvos estariam se protegendo de uma eventual ação penal”, disse na decisão, devido ao fato de falarem em códigos como “gato”, “coelho”, “onça” e “canguru”, para ocultar os verdadeiros nomes dos envolvidos. Entre as justificativas da prisão também estão o uso de aparelhos telefônicos criptografados e comunicações via skype e intranet — clique aqui para ler a primeira parte da decisão, e aqui para a segunda.

Segundo a Polícia, a construtora superfaturou o preço das obras da Refinaria Abreu de Lima, conhecida como Refinaria do Nordeste, no porto de Suape, em Pernambuco. A obra está atrasada e pode custar mais do que o dobro do previsto. O orçamento incial foi de R$ 429,2 milhões. Em 2008, o TCU identificou excedente de R$ 71 milhões na obra contratada pela Petrobrás a um consórcio formado também pela Camargo Corrêa. Seguindo orientações do tribunal, dadas na auditoria 008.472/2008-3, a Petrobrás suspendeu os pagamentos ao consórcio. Na mesma época, a PF gravava escutas sobre remessas de dólares da empresa supostamente ilegais, o que pode fazer a conexão entre os dois fatos.

A investigação começou em janeiro do ano passado, depois de uma denúncia anônima que apontou o suíço naturalizado brasileiro Kurt Paul Pickel como doleiro e intermediário da empresa. As remessas seriam feitas por empresas brasileiras fantasmas, passando por “off shores” no Uruguai, nas Ilhas Cayman e na Suíça. Segundo o Ministério Público Federal, as remessas feitas em um ano estão entre R$ 20 milhões e R$ 30 milhões.

Leia abaixo a nota divulgada pela empresa.

“A Camargo Corrêa vem a público manifestar sua perplexidade diante dos fatos ocorridos hoje pela manhã, quando a sua sede em São Paulo foi invadida e isolada pela Polícia Federal, cumprindo mandado da Justiça. Até o momento, a empresa não teve acesso ao teor do processo que autoriza essa ação.
A Camargo Corrêa ressalta que cumpre rigorosamente com todas as suas obrigações legais, gerando mais de 60 mil empregos no Brasil e em 20 países em que atua. Em 2008, o grupo faturou cerca de R$ 16 bilhões, gerando riqueza ao país e às comunidades em que suas empresas estão inseridas.
O grupo reafirma que confia em seus diretores e funcionários e que repudia a forma como foi constituída a ação, atingindo e constrangendo a comunidade Camargo Corrêa e trazendo incalculáveis prejuízos à imagem de suas empresas."

Processo 2008.81.81.000237-1

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