Segunda Leitura

Boa aplicação do processo civil pode reduzir lentidão da Justiça

Autor

  • Vladimir Passos de Freitas

    é professor de Direito no PPGD (mestrado/doutorado) da Pontifícia Universidade Católica do Paraná pós-doutor pela FSP/USP mestre e doutor em Direito pela UFPR desembargador federal aposentado ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Foi secretário Nacional de Justiça promotor de Justiça em SP e PR e presidente da International Association for Courts Administration (Iaca) da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e do Instituto Brasileiro de Administração do Sistema Judiciário (Ibrajus).

22 de março de 2009, 8h40

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A boa administração da Justiça depende de uma gestão administrativa moderna, acompanhada de regras processuais eficientes. Neste breve estudo o foco será apenas a boa aplicação do processo civil, a fim de que o julgamento seja dado em tempo razoável (Constituição Federal, artigo 5º, inc. LXXVIII). A primeira observação que se faz é a de que o juiz é a figura central na busca da efetividade. Mas, como ele não age sem provocação, o advogado é um ator essencial.

O primeiro passo é que o pedido inicial seja objetivo, fundamentado e específico quanto ao que se deseja (Código de Processo Civil, artigo 282). Lembre-se que o juiz a ele ficará vinculado e não pode julgar fora ou além do pedido. Da inicial deve se excluir tudo que é inútil. Por exemplo, se a ação é contra a União, não tem o menor cabimento tecer considerações afirmando que a competência é da Justiça Federal.

O requerimento de citação deve estar atrelado à lei (CPC, artigo 221) e ser explícito quanto a uma de suas modalidades (correio). O valor da causa não é aleatório (CPC, artigo 258) e, se for impugnado, retardará o andamento do processo.

Se foi requerida e negada a tutela antecipada (CPC artigo 273), a parte poderá interpor agravo (CPC, artigo 522). Ele poderá ser de instrumento, se a decisão causar lesão grave e de difícil reparação. Caso contrário, será retido nos autos. O recurso deve ser conciso e direto (CPC, artigo 524). Nele só interessa a decisão agravada e o inconformismo da parte. Não se ataca a pessoa do juiz, mas sim a decisão. Agravos com mais de 10 folhas, só em casos excepcionais.

O juiz deve examinar a inicial e não simplesmente colocar o “Cite-se”. Mandará emendá-la, se inepta (CPC, artigo 284), sendo explícito sobre o que deve ser emendado, facilitando a vida do advogado e colaborando para encaminhar o processo. Depois de citado o réu, não cabe mais emenda alguma e o resultado será a extinção do processo (CPC, artigo 294). Se indeferida a inicial, cabe apelação (CPC, artigo 296). O juiz pode e deve reconsiderar o ato se foi fruto de engano. Isto não o diminui, ao contrário, engrandece-o.

Citado regularmente, o réu pode contestar. As preliminares ou prejudiciais serão alegadas antes do mérito (CPC, artigo 301). Jamais repetidas no meio da contestação. Na resposta todos os aspectos devem ser impugnados, sob pena de serem considerados verdadeiros (CPC, artigo 302). Não contestada a ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor (CPC, artigo 319), salvo exceções legais (CPC, artigo 320). Mas o revel poderá intervir depois no processo e produzir provas, apenas não sendo seu advogado intimado dos atos (CPC, artigo 322).

Tanto no processo sumário como no ordinário, o juiz tentará a conciliação se não houver vedação legal (CPC, artigos 273, 331 e 448). O profissional do Direito é preparado para o litígio e tem dificuldades em negociar um acordo. É um erro. Transação significa ceder para por fim ao litígio. Por isso, não há razão para palavras ríspidas e cara feia. Por sua vez o juiz deve procurar, por todas as formas, a conciliação. Ela pacifica o meio social. A sentença, nem sempre.

O juiz deve preocupar-se com o essencial, o relevante. Não deve perder tempo com atos que não são seus (por exemplo, controlar o fornecimento de certidões). Nesta linha, o funcionário pode praticar atos ordinatórios (CPC, artigo 162, § 4º). É bom. Mas exige servidor bem capacitado, pois, senão, só servirá para tumultuar mais. Um roteiro de modelos ajuda bastante.

Se o processo depender de provas, estas devem ser requeridas pela parte de maneira fundamentada. Nada daquela inútil referência “… protesta por todos os meios de prova em Direito permitidas”. E o juiz deve analisar detidamente o requerimento e indeferir as inúteis. Sempre que possível, deve fazer inspeção judicial (CPC, artigo 440). Nada como ver para compreender. Se for o caso de perícia, deverá evitar que o processo tumultue. Uma boa forma é, ao nomear o Perito, já fixar prazo para os quesitos, para a retirada dos autos e entrega do laudo, para a manifestação sobre a prova e marcar a data da audiência de instrução e julgamento. Tudo em um só despacho.

O advogado deve ir preparado para a audiência. CPC comentado nas mãos, doutrina e jurisprudência pertinentes ao caso anotadas. Se possível, o computador conectado à internet. Na defesa dos direitos de seu cliente será firme e respeitoso. O advogado da parte contrária não é seu inimigo. Não deve ser arrogante, agressivo, nem destratar ninguém. Ironias ou ofensas só prejudicam.

O juiz, por sua vez, deve conhecer o processo. Ler no dia anterior é uma boa prática. Se inviável o acordo, colhida a prova, deve passar à manifestação oral no ato. Nada de prazos e memoriais, estes só cabíveis se o caso for de maior complexidade (CPC, artigo 454, § 3º). Feitas as alegações, sentença. Ditada no termo. Não precisa mostrar erudição. A parte quer saber apenas se e quanto ganhou ou perdeu.

A sentença deve, sempre que possível, ser explícita e certa, evitando-se a todo custo a liquidação (CPC, artigo 475-A). Esta pode significar 2, 4 ou mais anos de demora. Salários do Perito, juros, custas, penalidades, tudo deve ficar bem claro quanto ao valor e a partir de que dia. Os honorários advocatícios não devem simplesmente corresponder ao valor da causa, já que este pode ser elevadíssimo ou inestimável. Cabe aí a apreciação equitativa do juiz (CPC, artigo 20, § 4º). Tudo isto facilitará a execução futura.

O descumprimento da decisão judicial em 15 dias sujeita o devedor a multa de 10%. A medida segue na linha de dar-se efetividade à ordem judicial, tal qual outras tantas introduzidas na legislação processual civil (CPC, artigos 287, 461 e 461-A). No entanto, o que a realidade judiciária mostra é o aumento da desobediência às ordens judiciais, originando insegurança jurídica.

Não havendo no Brasil a possibilidade de prender-se o desobediente (contempt of Court), sendo comum o Estado não fornecer força policial para o cumprimento das decisões judiciais, sendo difícil a penhora de bens em razão de múltiplas situações, não sendo mais possível a prisão do depositário infiel (STF, HC 87585/TO, relator ministro Marco Aurélio, j. 3.12.2008), a situação do credor é cada vez mais complexa. Aqui o papel do advogado é da máxima relevância, investigando na busca de bens e direcionando a execução para um alvo certo.

Em suma, a eficiência da Justiça passa por um processo civil bem conduzido. Evitar atos inúteis, a perda da direção, o tumulto no processo, é essencial. É tarefa importante do bom profissional do Direito, em especial do juiz.

 

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