Teoria impraticável

Multa em execução mais atrapalha que ajuda

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  • Domingos Fernando Refinetti

    é advogado sócio do escritório WZ Advogados e membro da OAB da International Bar Association da Turnaround Management Association do Brasil e do IBR (Instituto Brasileiro de Estudos de Recuperação de Empresas).

18 de março de 2009, 14h00

Sucintamente, a letra da lei exige, para a não incidência da multa de 10% prevista no artigo 475-J do Código de Processo Civil, que o devedor “condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação” efetue o pagamento no prazo de 15 dias.

Na realidade, tão sucinta quanto lacônica, vem essa determinação legal causando embaraço a advogados, credores, devedores e magistrados.

No que tange à exigibilidade da quantia, tal deveria derivar do trânsito em julgado da sentença condenatória ou seria cabível em execução provisória — sentença ainda não transitada em julgado, em fase de recurso desprovido de efeito suspensivo? Se cabível em execução provisória, como interpretar o vocábulo “pagamento” que, nesse caso, não se poderia dar — ou, pelo menos, o levantamento da quantia pelo credor — sem a devida e respectiva caução?

Em ambos os casos, não se devem esquecer os demais requisitos a permitir o “pagamento” e, portanto, afastar a multa: existência de quantia líquida e certa. Se assim é, talvez nem mesmo o simples trânsito em julgado permitiria o início do prazo de 15 dias para o pagamento exoneratório da multa.

No mais das vezes, do trânsito em julgado não advém uma situação fática em que haja quantia certa a autorizar o pagamento em benefício do credor. De todo o modo, cumprir, espontaneamente, uma sentença que ordena pagar quantia incerta, por ilíquida, não aproveita ao credor, à celeridade processual ou à Justiça.

Ficaria, nesse caso, o devedor liberado para proceder ao seu próprio cálculo (liquidação) e, portanto, para proceder ao pagamento da quantia que dele resultasse, liberando-se do pagamento da multa de 10%, qualquer que fosse o resultado dessa conta — desde que feita com um mínimo de critério, tanto quanto possível a partir dos dados em seu poder?

Ou, justamente porque essa providência pode não encaminhar, adequada e finalmente, a solução da pendenga judicial, seria possível ter-se a aplicação da sanção contida no artigo 475-J por justificada?

Vê-se, portanto, que a polêmica apenas seria transferida para outro pólo: houve o cumprimento, ou não, do determinado naquele artigo, à luz das informações detidas pelo devedor?

Ou seja, por puro apego à pressa processual sacrifica-se a efetividade dos atos processuais, em detrimento, justamente, de quem se pretendeu beneficiar.

Melhor, mais seguro e coerente seria proceder de forma concatenada. Baixa-se o processo à vara de origem — mesmo porque o eventual cumprimento do artigo 475-J deveria ocorrer lá, com os autos presentes.

Despacha, o juiz, eventualmente por meio do “cumpra-se o venerando acórdão”, com a determinação de que o credor, em prazo curto, apresente memória de cálculo da quantia que entende devida — se é que não se extraiu, antes, carta de sentença, embora o procedimento que aqui se apregoa, mutatis mutandis, permaneceria o mesmo —, encampando, desde logo, sempre em benefício da celeridade e da economia processuais, o disposto no artigo 475-B, do CPC — que, aliás, faz expressa referência ao artigo 475-J.

O maior interessado no cumprimento célebre desse acórdão, o credor, apresenta sua planilha, liquidando e determinando, inclusive com juros, correção monetária e adição de eventuais encargos, em seu próprio benefício, o valor a ser pago pelo devedor.

Intima-se o devedor para pagar, por meio de publicação oficial — tal qual se o intimava antes, no decorrer de todo o processo, até mesmo em obediência às regras dos artigos 200, 236 e 237, do CPC —, para que o faça em 15 dias, sob pena de multa de 10% e, se for o caso, sob risco de expedição de mandado de penhora e avaliação.

Evidentemente, o exagero do credor, no seu cálculo, poderá fazer com que o procedimento perca a celeridade que a lei pretendeu conferir e, portanto, todo o bom senso será necessário, até mesmo para impedir defesas alicerçadas em excesso de execução.

Toda a reforma processual, para que surta, na prática, os efeitos pretendidos, deveria basear-se em raciocínios de efetividade, para que sua inserção, no ordenamento jurídico, seja a menos frankensteiniana possível e, portanto, de rápida e tranquila aplicação.

Lamentavelmente, a emenda tem sido bem pior do que o soneto.

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