Diferençano discurso

Livro analisa mudanças da CLT nos governos Lula e FHC

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26 de maio de 2009, 17h48

“Os presidentes Lula e Fernando Henrique se adaptaram a um regime que prima pela desregulamentação da legislação do trabalho.” A avaliação, nada otimista, é do juiz Grijalbo Fernandes Coutinho, da 19ª Vara do Trabalho do Distrito Federal, um crítico severo de qualquer flexibilização da CLT. Para o juiz, tirar direitos do trabalhador pode levar, em último caso, a um “caos social”.

Depois de um ano comparando medidas dos dois dos governos, Grijalbo lança nesta terça-feira (26/5) o livro "O Direito do Trabalho Flexibilizado por FHC e Lula". O juiz faz análise das principais medidas que os presidentes fizeram para flexibilizar a CLT, além de avaliar o impacto disso na legislação trabalhista. A conclusão de Grijalbo é que a diferença entre o tucano e o petista fica somente no discurso. Lula flexibilizou de maneira “silenciosa”, enquanto Fernando Henrique foi “avassalador”. Na prática, segundo o juiz, FHC e Lula são “comandantes de projetos que se complementam”.

Grijalbo Fernandes Coutinho lança o livro "O Direito do Trabalho Flexibilizado por FHC e Lula", às 18h desta terça-feira, no edifício sede do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF e TO).

Veja abaixo a entrevista com o juiz:

ConJur — Por que os dois presidentes, teoricamente de lados opostos, trabalham de forma semelhante para flexibilizar a CLT?
Grijalbo Coutinho — Aparentemente, eles são diferentes. Mas a política de legislação do trabalho não depende exclusivamente da figura do presidente. Eles se adaptaram a um regime que prima pela desregulamentação da legislação do trabalho. FHC fazia essa deterioração de forma avassaladora, sem tentar escamotear. O Lula não faz o mesmo estardalhaço, com medidas silenciosas, mas tão graves quantos as de FHC. É isso que os diferencia, o estilo. Mas há um contexto mundial desfavorável ao trabalho. As forças dos trabalhadores e os sindicatos não têm a capacidade de reagir a esse movimento muito bem orquestrado pelos grandes grupos. O contrato de trabalho clássico, mesmo numa economia capitalista, deveria dar um mínimo de dignidade ao trabalhador.

ConJur —Que projeto é esse de Lula e FHC, que se complementam?
Grijalbo Coutinho — Um foi intenso, como era a exigência do mercado e do capital. O outro chegou para fazer reformas pontuais. Eles se complementam, mesmo com as diferenças, porque no final da linha os dois projetos desvalorizam o Direito do Trabalho estatal. Os dois projetos dizem que o Direito do Trabalho legislado não tem relevância. No meio disso tudo, os sindicatos reagem de maneira ineficiente, seja pela incapacidade de reagir ou por apatia e falta de vontade. No governo FHC, houve flexibilização em massa, com reação dos sindicatos. Lula flexibiliza de maneira silenciosa e os sindicatos sequer têm se pronunciado.

ConJur —Mas a CLT não está desatualizada?
Grijalbo Coutinho — Não considero que esteja do ponto de vista de proteção do empregado. Ela poderia até ser aperfeiçoada porque quando oi feita nos anos 40, a realidade era outra. Mas já naquela época havia um caráter protetor. Hoje, com esse movimento intenso do capital, a CLT poderia até ser alterada. Mas não para retirar proteção e sim ampliar, considerando o gigantismo das empresas. As relações do trabalho viraram relação comercial.

ConJur —A classe patronal argumenta que é muito caro manter um trabalhador…
Grijalbo Coutinho — Os capitalistas sabem perfeitamente que o custo da mão-de-obra vai influenciar no custo da produção final. Então, eles vão sempre usar esse discurso. Mas se você comparar o Brasil com outros países, mesmo com todos os benefícios, o preço da mão-de-obra daqui é muito baixo. O discurso de que temos direitos demais não é verdadeiro. Os direitos são para garantir um mínimo de dignidade. Ademais, se você não tiver uma renda razoável, vai resultar num caos social. E ter bons salários é bom para o capitalista porque aumenta o mercado consumidor.

ConJur — Quais exemplos são emblemáticos da flexibilização nos dois governos?
Grijalbo Coutinho — São muitos exemplos. FHC criou o banco de horas, algo desejado pelo capital, o contrato a tempo parcial e o fim do prazo de distinção para a prescrição dos direitos do trabalhador rural. Tudo isso diminuiu direitos. Isso sem contar que ele tentou, mas não conseguiu fazer que a negociação coletiva prevalecesse em relação à legislação. No governo Lula, são medidas pontuais, mas que não deixam de ter gravidade. Um exemplo é a nova Lei de Falência. Primeiro, o crédito do trabalhador com caráter privilegiado foi limitado. Além disso, não há sucessão trabalhista para quem adquire a parte boa da massa falida. O governo Lula também fez medida provisória para dispensar a assinatura da carteira de trabalho do trabalhador rural para serviços de até três meses. Isso cria um campo fértil para fraudes. Os dois governos trabalharam para diminuir a proteção do estado.

ConJur — Essas intervenções do Poder Executivo não são resultado da inércia do legislador?
Grijalbo Coutinho — O Congresso se transformou numa caixa de ressonância. Há uma tentativa de mudar o curso desse processo, mas na prática ele vota o que o Poder Executivo decidir que é prioridade. De modo predominante, a agenda do trabalho é feita pelo Executivo, e não pelos legisladores.

Serviço:
"O Direito do Trabalho Flexibilizado por FHC e Lula"
Autor:
Grijalbo Fernandes Coutinho
Editora: LTr
Edição: 2009
Número de páginas: 184

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