Estranho no ninho

Anamatra critica assento permanente da OAB no CNJ

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25 de maio de 2009, 20h07

Parcela significativa da própria advocacia e do Ministério Público também defende a extinção do quinto constitucional e nem por isso pode ser taxada de reacionários ou corporativos. A afirmação é do presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Cláudio José Montesso.

Em mensagem enviada à revista Consultor Jurídico nesta segunda-feira (25/5), Montesso rebateu algumas das afirmações feitas pelo advogado Técio Lins e Silva, integrante do Conselho Nacional de Justiça, em entrevista à ConJur — clique aqui para ler a entrevista.

De acordo com Montesso, “ao contrário do que afirma o ilustre conselheiro, ser contra o quinto não guarda qualquer aproximação com ser contra ou a favor da criação do CNJ. A Anamatra, em que pese defender o fim do quinto desde 2002, foi a primeira entidade de classe da magistratura a apoiar a criação do CNJ antes mesmo de assim decidido no âmbito da Reforma do Judiciário”.

Para o presidente da Anamatra, contudo, a presença de representantes da advocacia e do Ministério Público, “salvo se indicados por entidades da sociedade civil que não representassem seus interesses corporativos”, não é correta. Montesso criticou também o assento permanente destinado à OAB no CNJ.

“Pior do que termos a presença de representantes eleitos pela OAB é a presença permanente do representante da OAB nas sessões. Trata-se da única representação de classe com assento permanente e voz em todas as decisões ali tomadas e isso decorre de interpretação deturpada da Constituição”, afirmou.

Leia a mensagem da Anamatra

Brasília, 25 de maio de 2009

Caro Rodrigo Haidar,

Lendo a entrevista do Conselheiro Técio Lins e Silva, não pude evitar tecer os seguintes comentários:

A Anamatra foi a primeira entidade de classe da magistratura a deliberar em favor da extinção do quinto constitucional como forma de acesso à carreira da magistratura. Temos argumentos de sobra para nos contrapor a posição externada pelo ilustre conselheiro, mas certamente nenhuma delas corresponde às citadas na entrevista. Esse é um debate que deve ser feito sem argumentos emocionais e sem leviandade. Mas para isso exige-se comportamento republicano e um espaço maior do que essa singela missiva. Ficarei apenas no rebate a fatos trazidos na entrevista e que não são corretos.

Não é a magistratura que organiza seminários e debates hegemônicos sobre o tema, é a representação dos advogados. Recente Seminário sobre o assunto, promovido pela OAB Federal não contou com qualquer debatedor contrário ao instituto. Os eventos da magistratura, em regra, permitem a pluralidade das idéias. Louve-se, aqui, porém, a iniciativa da OAB do Rio de Janeiro que, em um dos seus informativos, permitiu a este que subscreve a presente, dar a visão dos juízes do trabalho sobre o tema.

Visão, por sinal, que não é exclusiva da magistratura, pois parcela significativa da própria advocacia e do Ministério Público também assim entende. Nem por isso podem ser taxados de reacionários ou corporativos.

Ao contrário do que afirma o ilustre conselheiro ser contra o quinto não guarda qualquer aproximação com ser contra ou a favor da criação do CNJ. A Anamatra, em que pese defender o fim do quinto desde 2002, foi a primeira entidade de classe da magistratura a apoiar a criação do CNJ antes mesmo de assim decidido no âmbito da Reforma do Judiciário.

Nossa opinião, porém, era que não seria correta a presença de representantes de advogados e membros do Ministério Público, salvo se indicados por entidades da sociedade civil que não representassem seus interesses corporativos, mas sim a visão dos cidadãos brasileiros. A fórmula encontrada pelo legislador constituinte derivado foi a pior possível, pois advogados escolhidos pelas suas entidades de classe tendem a ali defenderem exclusivamente os interesses de sua classe, ainda que procurando disfarçá-los sob o argumento de interesse da cidadania.

Outra contrariedade nossa com seu atual modelo deriva da forma de escolha dos representantes da magistratura. Os magistrados ali presentes, com exceção dos ministros dos tribunais superiores, não representam a classe a que pertencem, pois aos juízes de primeiro e segundo graus não é permitido participar dessa escolha. Diferentemente do que ocorre, por exemplo, no Conselho Nacional do Ministério Público, onde os membros são escolhidos pelos seus pares. A escolha dos magistrados está concentrada nas cúpulas dos tribunais superiores. Assim, salvo o STF que não se submete ao CNJ, os demais tribunais escolhem três dos seus possíveis julgadores, o que é, no mínimo, peculiar, ainda mais quando se pode reconduzir o indicado.

Mas pior do que termos a presença de representantes eleitos pela OAB é a presença permanente do representante da OAB nas sessões. Trata-se da única representação de classe com assento permanente e voz em todas as decisões ali tomadas e isso decorre de interpretação deturpada da Constituição. O texto constitucional fala que o presidente do Conselho Federal da OAB “oficiará junto” ao CNJ, o que certamente seria feito na defesa dos interesses de sua categoria e não em todo e qualquer processo, já que no Aurélio, o único significado para o verbo oficiar que guarda alguma correspondência com a hipótese em comento é o de dirigir ofício a alguém. Tradução livre: peticionar em seu favor ou da classe que representa. Só isso. Não é dar palpite e opinião em tudo e qualquer coisa que ali se debate.

Não se argumente que está ali atuando como fiscal da lei, fiscal da sociedade, fiscal da cidadania, etc, pois esse argumento não prospera em face da própria heterogeneidade da composição do CNJ e é atribuição do Ministério Público. Seria o caso de perguntar por que as associações de classe da magistratura também não têm assento permanente e voz em todas as deliberações?

Mas essa indagação poderia levar a outras: porque a magistratura não participa dos exames da Ordem dos Advogados do Brasil ou pelo menos não os fiscaliza? Porque a magistratura não é chamada a opinar sobre a qualidade do ensino jurídico do país? Porque a magistratura não tem assento permanente no Conselho Federal da Ordem? Porque a magistratura não atua nas análises de processos contra advogados nas comissões de ética da Ordem? Se advogados podem julgar o comportamento ético e disciplinar de juízes, porque não o oposto?

Certamente as respostas que viriam poderiam para justificar a negativa a todas elas, poderiam servir também de justificativa para o fim do quinto constitucional, para por fim a existência de membros do CNJ escolhidos pela OAB e ainda para ampliar os argumentos contrários à absurda presença permanente do presidente da OAB ou de seu representante nas sessões do próprio CNJ. Basta só ter a coragem e a humildade de conseguir enxergar o tema com o olhar do outro e com a visão do real interesse da sociedade, não aquele que é usado para esconder os interesses próprios.

Por fim, gostaria que o ilustre jornalista concedesse a essa missiva o necessário espaço para o contraponto das idéias.

Saudações,

Cláudio José Montesso
Presidente da Anamatra

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