Casos de famiglia

MP denuncia fraude em falência de coligadas da TIM

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15 de maio de 2009, 15h08

A falência de empresas ligadas à Telecom Itália durante a instalação da rede GSM da TIM no Brasil acabou em denúncia criminal do Ministério Público. Sócios e diretores das dez empresas satélites da multinacional italiana que tiveram a quebra decretada pela 42ª Vara Cível de São Paulo no fim de 2003 foram denunciados nesta semana pela promotora de falências do Ministério Público paulista, Maria Cristina Viegas. As acusações são de fraude, falsidade ideológica, formação de quadrilha, omissão de escrituração fiscal, extravio de documentos e desvio de bens.

Os denunciados são Gianni Grisendi, Edna Rodrigues da Silva Abud, Atílio Ortolani, Claudio Raffaelli, Michele Panati, Rubens Ronaldo Pedroso e Nilton Martins de Lara. “Os denunciados praticaram ato fraudulento consistente na impetração de moratória que, sabiam, não tinha chance de ser cumprida nos termos propostos, causando, dessa forma, inequívoco prejuízo aos credores pois, aproveitaram-se do prazo concedido pela Justiça para retardar a decretação da quebra e, desfizeram-se de vultoso patrimônio que a empresa possuía”, diz a denúncia em relação a uma das acusações — clique aqui para ler. A promotoria acusa os diretores de usar de má-fé ao pedir a concordata, já que o capital com o qual afirmavam contar — o das empresas matrizes na Itália — já estava comprometido por causa da moratória pedida na própria metrópole estangeira.

Faziam parte do sistema as empresas Tecnosistemi, Eudósia, Metalpark, Acquasparta, Servsite, Cral, Denwabras, Palas Athena, Technosson, SAI Brasil, Tecnolux, Net Systems e Sisargas. Segundo o MP, as empresas foram criadas com a privatização da telefonia estatal italiana e gravitavam em torno da Telecom Itália, apoiando o esforço empresarial da multinacional dentro e fora de suas fronteiras. Algumas delas, pelo que apurou o Ministério Público Federal, foram criadas no Brasil especificamente para serem fornecedoras da TIM.

A acusação lista também o sumiço de livros fiscais e contábeis que poderiam esclarecer onde foi parar parte do patrimônio das falidas Techonosson Brasil Ltda, Palas Athena Engenharia e Construções Ltda e Denwabras Com. e Engenharia de Telecomunicações Ltda. Uma das empresas falidas, a Eudósia Brasil Ltda, mesmo prestes a entrar em situação de insolvência, chegou a emprestar dinheiro a sociedades com envolvimento dos diretores “como se fosse uma instituição financeira”, diz a promotora. Em fevereiro de 2002, a Palas Athena teria recebido R$ 400 mil, e a Denwabras outros R$ 450 mil, um mês depois, sem qualquer apresentação de garantia em caso de inadimplência.

O esvaziamento do patrimônio das empresas em falência também é evidente, segundo a promotoria. Só a Eudósia tinha, em bens e valores a receber, R$ 80 milhões. “Confirmada a quebra pela superior instância, foram arrecadados apenas os bens descritos no auto de arrecadação, avaliados em R$ 129.594 e vendidos em leilão por R$ 105.500”, diz o documento apresentado à Justiça. “Ao final de 2004, na vigência do efeito ativo conferido ao recurso interposto contra a decretação da quebra, o caminhão placa DBJ 2592/SP deixou as dependências da falida, carregado de bens da massa, sem que houvesse comunicação a este juízo, estando, então, caracterizado o desvio”, conclui o MP.

Embora a quebra tenha sido decretada em novembro de 2003 pela Justiça, os registros contábeis pararam de ser feitos em janeiro do mesmo ano. Segundo o MP levantou em demonstrativos avulsos, entre abril e setembro, as receitas com vendas de mercadorias chegaram a R$ 2,82 milhões, e o lucro do período teria sido de R$ 1,49 milhão. Também não foram registrados valores recebidos a título de empréstimo de empresas como a Parmalat Participações do Brasil — cuja ligação com as empresas do grupo seria somente o fato de haver um diretor conhecido por todas, Gianni Grisendi.

O juiz que decretou a falência das empresas, em 2003, Carlos Henrique Abrão, já havia afirmado que a abertura e o fechamento meteóricos das sociedades tiveram a finalidade de lavar dinheiro. O rodízio de diretores e sócios — inclusive à frente de outras empresas italianas — também indicaria a tentativa de fugir da responsabilização pelo esvaziamento do patrimônio e pela fraude aos credores. O número de títulos protestados em cartório chega a quase 700, além de pedidos de falência. Há até postos de gasolina cobrando valores “pendurados”.

Gianni Grisendi seria um dos exemplos. Superintendente da Bombril, empresa investigada por suspeita de receber e enviar ao exterior grandes somas em dinheiro de origem duvidosa, Grisendi foi presidente da TIM Brasil, da Italtel  — coligada da Telecom Itália —, Parmalat  e Bombril. A falida que ele dirigia era a Acquasparta. Grisendi, em depoimento dado em 2003, revelou que abriu a empresa em São Paulo a pedido do fundador da Parmalat, Calisto Tanzi, o empresário que foi preso na Itália e confessou ter desviado € 500 milhões de sua empresa para contas particulares.

O carro chefe das transações é a Tecnosistemi, empresa fornecedora da Telecom Itália em doze países do mundo — entre eles Suíça, Grécia, Luxemburgo, Espanha, Portugal e México, além do Brasil. Seu faturamento de estreia no Brasil, em 2001, foi de R$ 206 milhões. Ela veio para o país em função dos contratos da empresa-mãe. A TIM informou, em 2003, que não mantinha relações comerciais com a Tecnosistemi desde o segundo semestre de 2002. A fornecedora, segundo a TIM, vendeu os equipamentos para a implantação do GSM. O calote da Tecnosistemi e das coligadas teria chegado a R$ 100 milhões.

O imbróglio foi assunto na Itália. A revista semanal L’Espresso, em uma série de reportagens sobre esse incesto empresarial, publicou trechos do diário de Stefano Tanzi, filho do fundador da Parmalat, onde aparecem as ligações entre as empresas Eudósia, Tecnosistemi, Parmalat e TIM. No diário descobriu-se até mesmo um projeto da Parmalat para entrar junto com a TIM na telefonia móvel brasileira. As ligações societárias entre a Pirelli/Telecom Itália com a Tecnosistemi e, eventualmente, com a própria Parmalat, estão sendo investigadas na Itália e no Brasil. Na denúncia do MP entregue nesta semana à Justiça, a promotora Maria Cristina Viegas afirma haver empréstimos da Parmalat à Eudósia, uma das empresas do conglomerado, no valor de R$ 289 mil, não escriturados nos registros desta. “O elo de ligação entre as empresas é a presença de Gianni Grisendi no comando de ambas e na situação econômica em que se encontram: falidas”, diz a promotora.

No início de 2003, com os indícios da promiscuidade empresarial, o Grupo Telecom Itália insistiu em contestar o elo societário. Decretada a falência da Tecnosistemi Brasil, o grupo fez publicar um “Esclarecimento Público” veiculado nos principais jornais do país, em janeiro, renegando “qualquer vínculo societário com a Tecnosistemi e suas coligadas”.

Inquérito Judicial 583.00.2003.053309-7/000031-000

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